Nota de editor:
Devido à
existência de erros tipográficos neste texto,
foram tomadas várias decisões quanto à
versão final. Em caso de dúvida, a grafia foi
mantida de acordo com o original. No final deste livro
encontrará a lista de erros corrigidos.
Rita
Farinha (Julho 2010)
SOCIEDADE DE GEOGRAPHIA DE LISBOA
OS
DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS
NA
AFRICA, ASIA E AMERICA
POR
F. ADOLPHO COELHO
Professor do Curso Superior de Lettras e socio effectivo da
Sociedade
de Geographia
de Lisboa
LISBOA
CASA DA SOCIEDADE DE GEOGRAPHIA
89, RUA DO ALECRIM, 89
1881
IMPRENSA NACIONAL
Extrahido do Boletim da
Sociedade de Geographia de Lisboa
OS
DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS
NA
AFRICA, ASIA E AMERICA
N'uma conferencia feita ante a Sociedade de Geographia em 16 de
fevereiro de 1878 chamámos a attenção
dos nossos consocios e do publico
para as fórmas dialectaes particulares que algumas linguas
europêas
e particularmente o francez, o hespanhol e o portuguez, tinham
tomado nas colonias e conquistas da Africa, Asia e America. Esses
dialectos têem até hoje attrahido muito pouco a
attenção dos linguistas,
não existindo ainda nenhum trabalho geral sobre elles.
Era nosso desejo reunir os materiaes para um trabalho especial sobre
os dialectos portuguezes, e um trabalho geral comparativo em que
tentassemos determinar as leis de formação
d'esses dialectos, formação
que se póde por assim dizer estudar
no
vivo, porque um similhante
estudo não poderia deixar de nos ministrar dados importantes
sob os
pontos de vista glottologico, ethnologico e psychologico.
Pedimos n'essa conferencia esclarecimentos, como já o
tinhamos
feito por outros meios, e os nossos pedidos não foram de
todo inuteis.
Um mancebo intelligente da ilha de Santo Antão, o sr. Cesar
Augusto
de Sá Nogueira, que assistíra á
conferencia, deu-nos todos os materiaes
para o estudo que publicâmos do dialecto creolo d'aquella
ilha.
O nosso amigo rev. R. H. Moreton continuou nos seus dedicados
esforços
para nos obter publicações no dialecto portuguez
de Ceylão, e a
elle devemos em grande parte poder dar hoje uma bibliographia
já
assás consideravel d'essas publicações
e, o que é mais, possuil-as, estando
assim habilitados para publicar em breve um estudo bastante
completo sobre a
Grammatica e vocabulario do
indo-portuguez. No meio
de outros trabalhos mais consideraveis nunca perdemos de vista os
dialectos
creolos, que havia muito nos interessavam, e fomos assim reunindo
[4]
uma serie de noticias, em parte simplesmente bibliographicas,
cujo conjuncto nos parece offerecer já doutrina sufficiente
para constituir
materia de um artigo de ensaio. Por mais incompleto que fique o
nosso trabalho estamos certos que vem preencher uma lacuna no quadro
da glottologia. Fr. Pott no quadro systematico-bibliographico da
glottologia que serve de prefacio ao tomo II, 4 das suas
Etymologische
Forschungen (1870) nem sequer menciona os
dialetos creolos; nos
livros geraes de Whitney, Max Müller e outros sobre a
glottologia em
vão se busca uma noticia d'esses tão
interessantes productos; as opiniões
expressas por alguns linguistas sobre o caracter d'esses dialectos,
são, como veremos, indecisas ou erroneas, ou não
apontam os lados por
que esses dialectos são mais importantes para o observador.
Comprehende-se
este facto singular da historia da nossa sciencia quando se
sabe que uma parte dos glottologos gastam o seu tempo á
busca da solução
de problemas ou insoluveis ou cuja chave não está
ainda descoberta
(etrusco, basco, acadiano, etc.), e outra anda absorvida pelos seus
estudos especiaes, sem duvida interessantes e muitas vezes importantes,
mas que fazem desviar a attenção de
questões de muito maior
momento, sendo poucos os que fazem progredir a sciencia de uma maneira
sensivel.
O nosso ensaio seria muito mais completo se tivessemos maior numero
de informações dos dialectos das nossas colonias
e conquistas, e
se tivessemos visto diversas publicações sobre os
dialectos similhantes
das outras linguas europêas, que por diversas causas
não podémos examinar.
Entre essas causas predominam a raridade de algumas d'essas
publicações e miseravel
dotação das nossas bibliothecas, que
não lhes
permitte comprar senão poucos livros que interessem a um
pequeno
numero de estudiosos.
I. DIALECTOS PORTUGUEZES
1. Creolo da ilha de Santo Antão
(archipelago de Cabo Verde)
Este dialecto é fallado principalmente pela
população de côr e
pelas creanças que o aprendem com as creadas e amas negras.
Distinguem-se
duas fórmas: o creolo
rachado, creolo
fundo, creolo
vejo,
fallado principalmente no interior da ilha e de que as noticias e
documentos
que publicâmos dão conhecimento, e o creolo em que
a grammatica
portugueza é menos ignorada, distinguindo-se quasi
unicamente
pela pronuncia de algumas palavras ou sons e pelo accento geral.
As cartas seguintes foram escriptas por pessoas instruidas que fallam
bem o portuguez, mas conhecem bem o creolo rachado. O unico
documento verdadeiramente genuino do dialecto de Santo
Antão
acha-se
na serie de adivinhações que o nosso amigo o sr.
Sá Nogueira nos
ministrou.
[5]
Carta 1.ª
Nha
amigo.—Cu préssa en scrêbê ês
dôs fója di papel, qui dentro d'ês carta
en tâ manda nhô. |
Meu
amigo.—Com
pressa escrevi estas duas
folhas de papel que dentro d'esta
carta lhe envio. |
Talvêz
algun cúsa, palabra, ou móde nhù
crê, stâ êrrado. Cuza qn'en câ
tâ dubída; pamóde pâ
más criôlo qui nós di Cabo Berde
nú sabê, sénpre nu tâ ncontra
dificuldade ou enbaráço, quel'ora qui
nú pêga na péna pâ nu
scrêbê na nós lingua. |
Talvez
alguma cousa, palavra ou como quizer, esteja errada. O que
não duvido, porque por mais creolo que nós de
Cabo Verde saibâmos, sempre encontrâmos
difficuldade ou embaraço logo que pegâmos na penna
para escrevermos na nossa lingua. |
Ês
culpa ê câ di nós, ê di
gobérno, qui si al bê animaba nós na
calquér cuza, ê tâ oprimíno
cú má scoja di sês empregado,
qu'ê tâ manda pâ Cabo Berde. |
A
culpa não é nossa, é do governo que
longe de animar-nos em qualquer cousa, opprime-nos com a má
escolha dos seus empregados, que elle manda para Cabo Verde. |
Ê
tâ fazê bên mal, pamóde assi
ê tâ pêrdê tudo amor, tudo
stima
qu'ê pôdê tên na pôbo
di Cabo Berde. Ês cuza ê câ só
na Cabo Berde, ê pâ tudo cábo, unde
ê tên un palmo di chôn. En podê
flába nhô cuzás chéo a
ruspêto di nós gobérno na Cabo Berde,
¿mas paquê? Ês carta ê
câ, sima português tâ flâ, di
politica, e pamóde ês en tâ bira
pâ principio di nós conbersa. Ê sima en
staba tâ flâ nhô, en câ
sabê si algun cuza stâ tórto ou
mál screbêdo nês dôs
fójas di papel; mas câ m'inporta cú
ês, e nhu ôubi cuss'ê qu'ent â
flâ nhô: Na fója un e na linha binte eu
binte un, nhu tâ lé na banda di criôlo
«nha Dóna di nha Lucía» e na
banda di português nhú câ tâ
acha nada qui, sima português tâ flâ,
tâ corrêspondêl. |
Faz
bem mal, porque assim perde todo o amor e toda a estima que
póde ter no povo de Cabo Verde. Isto não
é só em Cabo Verde é por toda a parte,
onde elle tem um palmo de terra. Eu podia dizer-lhe muitas cousas a
respeito do nosso governo em Cabo Verde, mas para que? Esta carta
não é, como dizem os portuguezes, de politica, e
por isso volto ao principio da nossa conversação.
É como lhe estava dizendo, não sei se alguma
cousa está errada ou mal escripta n'essas duas folhas de
papel; mas não nos importemos com isso, e ouça o
que lhe digo: Na folha 1 v. e linhas vinte e vinte um, na columna
creola
«nha Dona nha Luzia», e no portuguez não
encontro nada que, como dizem os portuguezes, lhe corresponda. |
Nhú
sabê ê pamóde? Ê
pamóde ês Dóna
ê un
nóme qui na criôlo tâ chomádo
«nome di cassa», e ê tâ custuma
pôdo n'algun minino fémea. Ê
pâ ês nóme que ês minino
tâ chomado tioqu'ê grande, ou tioqu'ê
mórré. Ês uso ê câ
só di Cabo Berde, na Brazil tanbê ê
tâ usado, e assi mi conchê ghentes chéo
cú nome di Nené, Nhanhina, Nhánha,
Sinhârínha, Nhásinhára,
Júca, Jóca, sin sér sês nome
di batismo, ou sês nome di greja. |
Sabe
a rasão? É porque Dona n'aquelle logar
é um nome que em creolo se chama «nome de
casa», e usa-se nas meninas (creanças).
É por esse nome que ellas são chamadas
até á maioridade ou até á
morte. Este uso não é só de Cabo
Verde, no Brazil tambem se usa, e assim conhecemos muita gentecom os
nomes de Néné
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . e
Joca sem serem os seus nomes de baptismo. |
[6]
Agora
si nhú crê sabê cuss'ê
quí Dóna crê flâ, en
tâ flâ nhô, no portugués
ê avó e Dóno
ê avô. |
Agora
se quizer saber o que quer dizer Dona, eu lhe digo, em portuguez
é avó e Dono avô. |
A
ruspêto di berbo, criôlo câ tên
tudo tudo qui português tâ choma ténpo. |
Emquanto
a verbos, o creolo não tem tudo quanto o portuguez chama
tempo. |
Prónóme
ê sima ja'n esplicá nhô na
fója dôs. Na criôlo di Cabo Berde
câ tên bós ou abós
pâ vós di
português, e ês
tâ flâ nhô, o
qu'ês
tâ papiâ cú alguên
só, e nhôs, o
qu'ês tâ
papiâ cú más d'un. |
O
pronome é como já lhe expliquei na folha 2. No
creolo de Cabo Verde só ha bós
ou abós para o vós
portuguez, e usam de nhô quando fallam
a uma pessoa
só, e de nhôs quando fallam
a mais de uma. |
Agora
En, min, amin
ê quasi tudo ô
mésmo, cú algun différença,
cónfórme conbersa tâ corrê.
Tanbê criôlo tên mi.
Ex.: |
Agora
emquanto a En, min, amin
é quasi tudo o mesmo, com
alguma differença conforme o seguimento da
conversação. Tambem o creolo tem mi.
Ex.: |
En
crê ês cuza. |
Eu
quero esta cousa. |
Quênhê
qui fazê ês cuza? Ê mi. |
Quem
fez isto? Fui eu. |
Amin
en sâ tâ bá enghênho, ou Amin
sâ tâ bá enghênho, ou En
sâ tâ bá enghenho. |
Eu
vou ao engenho . . . . .
. . . . . . . . . .
. . .
. . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . |
Jâ
bástâ. Nhú al stâ enfadado.
Agóra tioque nu encontra na
biblióthéca. |
Basta.
Deve de estar enfadado. Agora até quando nos encontrarmos na
bibliotheca. |
Nhú
acreditan, cum'amigo (ou sima'amigo) qui
tâ
respêta nhô chéo. |
Acredite-me,
como amigo, que muito o respeita. |
Carta 2.ª
Césa.—Pan
fartá-bo bontade en tâ
scrêbê-bo
na nós lingua, na criôlo rachado, qu'en
câ sabê si bô tâ
entendê-le. |
Cesar.—Para
vos fazer a vontade eu escrevo-vos na nossa lingua, em creolo fundo,
que eu não sei se vós o entendeis. |
Flan:
pâ que bô mestê pâ nû
scrêbêbo nês lingua? Bô
tenê gána di estudâ si orige,
fazê algun gramatica ou dicionare? S'ê pâ
algun dês cussa Deus juda-bos; mas dexam fla-bo mê
al fazê-bo suâ tioque bu câ
podê más, tioque bi seinti... |
Dizei-me:
para que precisaes de que vos escrevamos n'esta lingua? Tendes desejo
de estudar a sua origem, de fazer alguma grammatica ou diccionario? Se
é para alguma d'estas cousas, Deus vos ajude, mas sempre vos
direi que isso vos fará suar até não
poderdes mais, até que o sintaes . . . . . . . . . . . . . . |
[7]
N'ês
ija quasi tudo alguên tenê médo di Duco.
Duco bu conchê-le? Estan mâ náu. Duco
era un préso que staba na calabôs; ê
entendê mê câ stába
lâ sábe, ê fugi êle
cû dôs companheros; ê stâ riba
cháda; tâ mátâ
cábra, tâ forçâ
mujéres, tâ fazê tudo casta di pouca
borgonha. Flado mâ Duco manda flâ Henrique
d'Olibéra, Puchim, Maia, Bencesláu pâ
ês tomâ seintido cú sês bida,
pâ ês câ bá fóra,
pamóde se encontra cu êles mê
tâ matalos. Fazê idéa mó
ês al tênê mêdo! |
N'esta
ilha quasi toda a gente tem medo de Duco: Duco vós
conheceil-o? Estou que não. Duco era um preso que estava no
calabouço; e entendeu que não estava
lá bem; e fugiu com dois companheiros; está em
cima da achada; mata cabras, força mulheres, faz toda a
casta
de pouca vergonha. Diz-se (fallado) que Duco manda dizer a Henrique de
Oliveira, Puchim, Maia, Wenceslau para que estes tomem sentido com a
sua vida, para estes não irem fóra, poisque se se
encontra com elles que os mata. Fazei idéa, como estes
terão medo! |
P.
si bida ê dentro cartore; ê stâ magro
sima alguên tisgo; ê flâ mâ
só bo que sâ tâ fazê-le falta;
ê mandá-bo mantenha chéo. |
Paulo
a sua vida é dentro do cartorio, elle está magro
assim como um tisico; diz que sois vós que lhe tendes feito
falta; elle manda-vos muitas recommendações. |
Ti
outr'ora; en câ ten mâs tempo. Bo armun, etc. |
Até
outra occasião; eu não tenho mais tempo. Vosso
irmão, etc. |
Carta 3.ª
Nha
estimado armun. En rêcêbê carta di
nhô, qu'in fica munto contente con êl, e pan
fazê nhô bontade en tâ
cumçâ screbê nhô na
criôlo. Primêro nobidade qu'in tâ
dâ nhô ê cumâ C. mâ
tâ recitâ quês berços di
dôda de Albano na criôlo e ê ta
cunçal sin: |
Meu
estimado irmão. Eu recebi carta do senhor, que eu fico muito
contente com ella, e para fazer ao senhor vontade eu começo
a escrever ao senhor em creolo. Primeira novidade que eu dou ao senhor
é que C. recita aquelles versos da doida de Albano em
creolo, e começa assim: |
Benca
li nha fijo sucuta: |
Vem
cá meu filho escuta: |
Bê
ê amigo di bu mái? |
És
amigo de tua mãe? |
Bé!
nha mái, e que pergunta ê ês? |
Bem,
minha mãe, e que pergunta é essa? |
Pôs
bên, sima bu ojá ês carnuja carnugado,
ferucho feruchado ê sangue di bu pai; i bu tâ juran
cumâ bu ta bingal? |
Pois
bem, assim como tu vês este ferro enferrujado é
sangue de teu pae, e tu juras-me como o vingas? |
Ampôz
ê Ricardo pai di Maria, qui matâ bu pai! |
Pois
é Ricardo, pae de Maria, que matou teu pae! |
Bé!
mamái! Pai di Maria en câ podê matal,
pamóde Maria stan dente nha côraçon. |
Bé!
mamã! Pae de Maria eu não posso matal-o, porque
Maria está dentro de meu coração. |
[8]
E
assim cú munto cuza, mas qu'in câ sabê,
e por isso en câ tâ pon. Quen qui
costumá tanbê recital ê Brito e mas
Quinquim. |
E
assim com muita cousa, mas que eu não sei, e por isso eu
não ponho. Quem aqui tambem costuma recital-os é
Brito e mais Joaquim. |
En
pidi nhô di fabôr pá nhú
mandan quêl dicionare; en pedi té na
português, gora en tâ biral na criôlo.
Quê pâ fabur câ nhú
desquecê. En tâ, cába ês carta
pan porgunta nhô s'ê pêrciso
escrêbê nhô en criôlo na tudo
bapor, ou náo. |
Eu
pedi ao senhor o favor de mandar-me aquelle diccionario; eu pedi em
portuguez, agora eu traduzo (viro) em creolo. Queira por favor
não se esquecer. Eu acabo esta carta por perguntar ao senhor
se é preciso escrever ao senhor emcreolo por todos os
vapores ou não. |
Nhu
adés, nhú dán tudo alguen
mantênha chéo. Tudo ghentes di
casa tâ mandâ nhô mantenha
chéo. |
|
Phrases diversas
Mâ
nhu stâ? ou Mâ nhu
pássâ? |
Como
está? ou como passa? |
Cômmôdádo,
nhô mâ nhu sa ta pássâ? |
Bom,
e o sr. como tem passado? |
Mâ
ba ghentes tudo dinhô? ou
Móde ghentes tudo di nhô stâ? |
Como
estão todos os seus? |
Tudo
stâ bon, graças a Déus. |
Todos
estão bons, graças a Deus. |
Jâ
dura qui en ca ôjâ nhô; Unde nhu staba? ou
Unde nhu tên stado? |
Ha
muito tempo que o não vejo, onde tem estado? |
Mi
en stába la na Orgôn, ou En
tên stâdo la na Orgôn. |
Eu
estava nos Orgãos, ou eu tenho estado nos Orgãos. |
Cuz'é
ou Cuss'ê nhu bá
fazêba lâ? |
O
que foi lá fazer? |
En
bába oja (ou en bá
ojába) un nhâ parente, qui stába doente. |
Fui
ver uma parenta minha que estava doente. |
¿Quênhê,
tia di nhô, nhâ Maria? ¿Cuss'ê
qu'ê tênba? |
Quem?
a sua tia, a sr.a Maria?
O que tinha ella? |
E
tênba dór na péto, ou,
ê ta quexaba di dór na péto. |
Tinha
dores no peito, ou queixava-se de dores no peito. |
Ê
jâ stâ milhor? |
Já
está melhor? |
En
dêxal um pouco milhor, ou,
En dêxal más
cômôdádo un pouco. |
Deixei-a
um pouco melhor. |
Púndo
nhu sâ tâ bai? (gossi-n). |
Para
onde vae agora? |
En
sâ tâ bai Praia. |
Vou
á Praia. |
I
mi en sâ tâ bai (ou
bá) Tarrafal ou Tarfal. |
E
eu vou para o Tarrafal. |
Anton
nhu tên qui anda chêo inda. |
Então
tem de andar ainda muito. |
Qui
horas ê gossin? ou Canto hora
jâ dâ? |
Quantas
horas são? |
Já
stâ pâ dôs hora. |
Devem
ser duas horas. |
Dêxam
bai, tioque nu torna ojá. |
Deixe-me
ir, até quando nos tornarmos a ver. |
[9]
F.
En tâ pidi bo pâ bo escrêbên um
carta na criôlo, mas num criôlo
bêrdadêro.
Bu al acha galante ês pidido; mas oc bu sabê
ê pâ cuzé, bu al ficá
conténte. Gossin en câ podê
flábo ê pâ que fin, pamóde en
câ tên ténpo. |
F.
Peço-te que me escrevas uma carta em creolo, mas em um
creolo
verdadeiro (puro). Has de achar exquisito (extravagante) este pedido,
mas quando souberes para que é, ficarás
satisfeito. Agora (n'esta occasião) não posso
dizer-te para que fim é, porque não tenho tempo. |
Câ
bu squêcê, ¿já bu
oubí? |
Não
te esqueças, ouviste? |
Bo
armun amigo. |
Teu
irmão, amigo. |
Jâ
bu râcêbê nha carta qui en
scrêbê-bo na criôlo? Respondên
e e mandâ flan mode ghentes tudo stâ. |
Já
recebeste a minha carta que te escrevi em crioulo? Responde-me e manda
dizer-me como estão todos. |
Titia
jâ stâ mijór di si dismaios? Nha
Dóna di nha Lucía inda câ
cômôda? |
A
tia já está melhor dos seus desmaios? A nha Dona
da Luzia ainda não está boa? |
Logo
qui[1] bu
rêcêbê ês carta, bu
ta manda chôma Roque, e bu ta flal cumâ en
rêcêbê si carta, e su xinti
chêo di más, di máo tratos, qui
scribons sâ tâ dal. |
Logo
que receberes esta carta mandarás chamar o Roque, e lhe
dirás que recebi a carta d'elle, e senti bastante dos maus
tratos, que os escrivães lhe têem dado. |
Comâ
gossin en câ podê fazel náda, e
pâ ê spêra tioque en boltâ C.
Berde; e anton en tâ oja, si algun cuza en tâ
podê alcança na si fabôr. |
Que
agora nada lhe posso fazer, e que espere até (quando) eu
voltar a Cabo Verde, e verei então se alguma cousa posso
alcançar em seu favor. |
Adivinhações
«Os creolos em Cabo Verde, diz-nos o sr. Nogueira, pelo menos
em Sant'Iago, têem por costume contarem historias, isto
é, lendas ou
contos.
«Quasi sempre essas historias são contadas
á noite, assentando-se as
pessoas que tomam parte n'esse passatempo de caracter verdadeiramente
familiar, á porta da rua ou então dentro de casa,
fazendo d'esse
passatempo um serão. Precedem a essas historias as
adivinhações, sendo
algumas d'estas bem obscenas.»
Eis uma pequena serie d'essas adivinhas que o nosso collaborador
nos ministrou:
1.
Xintido. |
Mi
li, mi lá. |
2.
Porco. |
Mungo
mungo tâ ba rúbera. |
3.
Chúba na
banána. |
Ráque-ráque
na pedragál. |
4.
Ê un home que mátâ un
buro, pamóde um pé de
coube. |
Curupíu
de
dâs pé mátâ
curúpíu de quato pé, sob curupiu de um
pé. |
5.
Ê
ôjo. |
In
tên nhâ dôs fijo na
janélla nium câ tâ
ôjâ
companhêro. |
[10]
6.
Falla. |
In
tên nhâ fijo in tâ mandal
dento chuba
ê câ tâ
môjâ. |
7.
Máma di cadêra. |
In
tên nhâ dôs fijo tâ
córê tudo córê,
nium
câ tâ pássâ
companhêro. |
8.
Oréja. |
In
tên nhâ figuêrinha na pónta di
rócha,
tâ queí, câ tâ queí. |
9.
Sónbra. |
In
córê ín câ pêga, in
xinta in pêga. |
10.
Bôca cú dente. |
In
tên nhâ pucarínha cheio d'ôsso. |
11.
Tripiche. |
Chôro
na cassa di riba, batuque na cassa di baxo. |
12.
Pánno. |
Nôte
di cumprido, di dia di trabêsado. |
13.
Caldêron. |
Ê
tên pé ê câ tâ
ánda ê tên aça
ê câ tâ buâ. |
14.
Arco d'abêja. |
Jôn
di Pico, Manél d'Orgôn, sê
câ súbi ê al trabêssa. |
15.
Pedra fôgôn. |
In
tên três préto; si ún
câ stâ, quêlouto dôs
câ tâ sirbi. |
16.
Óbo. |
Radondête
indête que não tem tapo nem
tôpête. |
17.
Anzol:—ê tâ lêba isca mórto,
ê tâ tarcê pexe |
Préto
côrcôbádo que tâ
lêba mórto, tâ trâzê
bibo. |
18.
Póte. |
Ê
bá dêtado, ê bên
sâquédo. |
19.
Estréla na Céo. |
In
tên nha cúrál di cábra,
nôte pâ manheê nium. |
20.
Máma de báca. |
Nha
quato bôli bóca pâ báxo
lête câ tâ
lánça. |
21.
Estrubado. |
Nhâ
boi tâ bônba lâ na Tarafál, in
tâ oubi li. |
22.
Mandioca. |
Ríquití
pé béjo fésta quê
câ chiga, ê câ sabe. |
23.
Morte. |
In
bai pân cá bên más. |
24.
Calbicêra. |
Albo
cú mâ albâiáda, verde
mâ vêrdête, tên côr
di rabu de sancho, mas ê câ êl. |
25.
Caminho. |
Un
hóme grande sin sónbra. |
26.
Fumo. |
Nha
cabállo dento cóma na rua. |
27.
Sino. |
Sin
câ pêga nha boi rábo ê
câ tâ bônba. |
28.
E côco cú si pája, cu cumida, cu
ágo. |
In
tên un caza di pája dento quêl caza di
pája in tên un caza branca, dento caza branca in
tên un fonte d'ágo. |
29.
Cruz na cháda. |
In
tên nha báca na cháda, in câ
tâ dâ pája, in câ tâ
dé ágo, tudo alghên qui
páçâ ta botan el um
mô
de pája. |
30.
Nabíu. |
In
tên un óme grande na mê di
mar,
s'ê câ bento ê câ tâ
anda. |
[11]
Observações phoneticas
Dos sons do portuguez faltam no creolo de Santo
Antão
lh, substituido
por
j
(
paja,
ija,
foja,
fijo,
scoja),
v substituido por
b
(
dubida,
dêbê,
oubi,
pobo,
conbersa,
biro,
fabur); os diphthongos nasaes
(
Jan==
João,
Orgon==
Orgãos,
coraçon==
coração,
armun==
irmãos,
náo==
não);
o diphthongo
ei, substituido por
é,
ê
(
proméro,
ruspêto,
figuêrinha).
Ha alguma tendencia para o iotacismo:
di==
de.
I desapparece em
pos==
pois,
mas==
mais.
Mudanças varias nas vogaes atonas:
armum==
irmão,
proméro==
primeiro,
borgonha==
vergonha,
ruspêto==
respeito.
Mudança nas vogaes accentuadas:
cuza==
cosa,
favur==
favor.
Apherese de vogal ou de syllaba:
sim==
assim,
nhô==
senhor,
nha==
minha[2];
tâ==
está.
Syncope de vogal:
cumçâ==
começar,
crê==
querer,
conchê==
conhecer.
Apocope de vogal ou de syllaba inteira:
calabôs==
calaboço,
mó
(como)==
modo,
mo==
molho,
ês==
este.
Apocope de
r: regular no infinito
(
ser é uma
excepção, se não ha
erro no paradigma que nos enviou o nosso informador);
nhô==
senhor,
pâ==
por.
Varia:
ago==
agua,
sucuta==
escuta.
Observações morphologicas
1.
Genero. Os adjectivos
não têem fórmas que indiquem o genero.
A fórma typica é em geral a fórma
masculina portugueza; mas ha
excepção, como
nha==
minha.
2.
Numero. O emprego das
fórmas do plural não se póde
estabelecer
com certeza dos textos que temos á nossa
disposição, nem das noticias
que nos ministraram.
Os casos seguintes parecem-nos representar as tendencias do dialecto
no emprego do
s do plural: a) os
adjectivos e pronomes empregados
como adjectivos não tomam o signal do plural (mas diz-se
quel,
quels); b) com os numeraes o
substantivo não toma o signal do plural
(mas na carta 2.ª ha
dôs
companheros); c) quando do contexto da phrase
resulta a idéa da pluralidade falta o
s do plural. Exemplos:
es
dos
foja.
tres
preto.
mujer,
mujeres. |
estas
duas folhas.
tres pretos.
mulher, mulheres. |
Com relação ao plural diz-nos o nosso informador:
«A tendencia
que ha hoje para empregar regularmente as fórmas do plural
torna-se
muito sensivel».
[12]
3.
Pronomes. Os pronomes
demonstrativos são:
ês (este, esse) e
quel (aquelle).
Ês
home.
Ês mujer.
Ês homes.
Ês mujeres. |
Este
homem.
Esta mulher.
Estes homens.
Estas mulheres. |
Quel
rapaz.
Quel rapariga.
Quels (ou quel) rapaz.
Quels (ou quel) raparigas. |
Aquelle
rapaz.
Aquella rapariga.
Aquelles rapazes.
Aquellas raparigas. |
O interrogativo é:
quen,
qui, ou
quê-nhê, quem.
Eis o quadro dos pronomes pessoaes.
Singular: |
En,
in, mi
-n
Bu
(abó)
Di
bó
-bo
Ê
-l
nhô
êl, -le |
eu
-me
tu
de ti
-te
elle
lhe
lhe (vos)
o |
Plural: |
Nós,
nu
-no
Nhô, nhôs
nhô
Ês
-ls |
nós
-nos
vós
vos
elles
lhes |
Quên
qui dan (dâ-n)
el.
Quên qui dá-bo
el.
Quên qui dá-nhô
el.
Quên qui dá-no
el.
Quên qui dá nhô
el.
Quên qui dals (da-ls)
el.
Bu tâ
entendêle.
En tâ
jural. |
Quem
m'a deu.
Quem t'a deu.
Quem lh'a deu.
Quem nol'a deu.
Quem vol'a deu.
Quem lh'a deu.
Tu entendel-o.
Eu o juro. |
Bu (vós) tendo usurpado o
logar de
tu, não ha
pronome da segunda
pessoa do plural; o
pronomen
reverentiae é substituido por
nhô==senhor,
nhâ==senhora.
Nhô tomou o signal do
plural:
ô nh'amigos, nhôs
al judan fazê ês cuza,
ó meus amigos, vós haveis de me ajudar a fazer
esta cousa.
O pronome da segunda pessoa do singular diz-se
bó quando é
precedido
de proposição:
di
bó, de ti.
Nas ilhas de Barlavento ha
bucê,
bucês,
bocê,
bocês em logar de
bó,
abó e
nhô.
Os seguintes exemplos mostram as fórmas dos possessivos ou
seus
equivalentes:
[13]
Nha
caballo.
Nha
caballos.
Nha
egua.
Nha
eguas.
Ês caballo ê di
men.
Ês caballos ê di
men.
Ês egua ê di
men.
Ês eguas é di
men. |
O
meu cavallo.
Os meus cavallos.
A minha egua.
As minhas eguas.
Este cavallo é meu.
Estes cavallos são meus.
Esta egua é minha.
Estas eguas são minhas. |
Bu
cavallo.
Bu
cavallos.
Bu
egua.
Bu
eguas.
Ês caballo ê di
bó.
Ês egua ê di
bó.
|
O
teu cavallo.
Os teus cavallos.
A tua egua.
As tuas eguas.
Este cavallo é teu.
Esta egua é tua.
|
Si
caballo, sês
caballo.
Caballo di nhô ou nhâ.
Ês caballo ê di
nhô.
|
O
seu cavallo, o cavallo d'elle.
O seu (vosso) cavallo.
Este cavallo é vosso, seu.
|
Nós
boi.
Nós
báca.
Ês boi ou ês báca
ê di
nós. |
O
nosso boi.
A nossa vaca.
Este boi ou esta vaca é vosso, vossa.
|
Si
caballo, sês
caballo.
Ês caballo ê di sês,
d'êls ou d'ês. |
O
seu cavallo (d'elles).
Este cavallo é seu (d'elles).
|
4.
Verbo. Esta parte da grammatica
do creolo de Santo Antão
apresenta uma riqueza muito maior que em geral os outros dialectos
similhantes. Não é difficil explicar este facto:
o contacto persistente entre
a população que falla o dialecto e os que fallam
o portuguez puro
tende naturalmente a fazer penetrar no creolo maior numero de
fórmas
portuguezas. Vimos já o que se dava com as fórmas
do plural. Damos
os paradigmas da conjugação e faremos depois
algumas observações
sobre elles.
Ser (sér)
Indicativo
Presente |
Perfeito composto |
Mi
ê
Bu, abo ou abo bu
ê
Êl
ê
Nós, nos nu
ê
Ês
ê |
Eu
sou
Tu és
Elle é
Nós somos
Elles são |
Eu
ten
sido
Bu ten
sido
Êl, ê ten
sido
Nos, nu, ten
sido
Ês tên
sido |
Eu
tenho sido
Tu tens sido
Elle tem sido
Nós temos sido
Elles têem sido |
[14]
Imperfeito e perfeito |
Futuro |
Mi
era
Bu etc.
era
Êl era
Nós era
Ês era |
Eu
era
Tu eras
Elle era
Nós eramos
Elles eram |
En
al
ser
Bu al
ser
Êl al
ser
Nu al
ser
Ês al
ser |
Eu
serei
Tu serás
Elle será
Nós seremos
Elles serão |
Condicional
En
tâ
sérba
Bu tâ
serba
Ê tâ
sérba
Nu tâ
sérba
Ês tên de
ser
|
Eu
seria
Tu serias
Elle seria
Nós seriamos
Elles seriam |
Subjunctivo
Presente |
Imperfeito |
En
ser
Bu
ser
Ê
ser
Nu
ser
Ês
ser |
Eu
seja
Tu sejas
Elle seja
Nós sejamos
Elles sejam |
Mi
era
Bu era
Êl, ê era
Nu era
Ês era |
Eu
fosse
Tu fosses
Elle fosse
Nós fossemos
Elles fossem |
Futuro composto
In
ten de
ser
Bu ten de
ser
El, ê ten de
ser
Nos, nu ten de
ser
Ês ten de
ser.
|
Eu
tiver de ser
Tu tiveres de ser
Elle tiver de ser
Nós tivermos de ser
Elles tiverem de ser |
Imperativo
Ser |
Sê
tu |
Nhu
ser |
Sede
vós |
Haver
Este verbo é quasi exclusivamente empregado para a
expressão do
futuro como auxiliar, portanto no presente do indicativo.
A fórma
al
provém de
ha-de, por
apocope e mudança de
d em
l.
O verbo
dêbê
é empregado como auxiliar, substituindo
al. Na cidade da
Praia diz-se
hôbe (oubi) tempo,
tên habido, mas essas fórmas
não se acham
ainda no creolo rachado.
Ten (ter)
No presente do indicativo
tên para todas as pessoas
no paradigma
escripto pelo nosso informador; mas nas cartas 2.ª e
3.ª ha
tênê como
fórma fundamental, servindo pois para o presente
só com os pronomes
e figurando nos tempos compostos, como
ser no paradigma acima.
O imperfeito e o perfeito do indicativo tem
tenba, tinha, para todas
as pessoas; o imperativo
tên. Emprega-se o
participio
tido.
[15]
Stá (estar)
No presente do indicativo
sta ou
star para todas as pessoas; no
imperfeito
staba, no perfeito
stêbe, ou no creolo
rachado
staba, como no
imperfeito. Os tempos periphrasticos conformam-se ao paradigma de
ser. Emprega-se o participio
stado.
Verbos não auxiliares
O presente em regra é expresso por
tâ (-stá) com o
infinito, para
todas as pessoas exemplos:
en tâ
jurâ, eu juro,
bô tâ
flâ, vós dizeis;
mas occorre tambem como presente a simples fórma do
infinito:
nhu
sabê, vós sabeis. Algumas
fórmas do presente portuguez, principalmente
da terceira pessoa, occorrem, sem variação, com o
auxiliar
tâ ou isoladas,
exprimindo o presente:
en tâ
bai, eu vou;
êl
tâ lêba, elle leva;
en péga, eu agarro;
en tâ biro, eu volto;
in xinto, eu me sento.
Ha fórmas do preterito como
fazeba, fazia,
baba, ia (sobre o presente
bai).
O perfeito parece ser expresso pelo infinito, como
recebê,
fugî (elle
fugiu),
xinti,
matá,
entendê, nas cartas acima.
O imperativo é expresso pelo infinito:
esquecê, esquece,
esquecei;
judá, ajuda, ajudae.
Occorrem algumas fórmas particulares como
ben,
vem, vinde.
Ha participios em
ado como
usado,
enfadado, em
edo como
screbedo,
escripto, em
ido (normal?).
Os tempos periphrasticos seguem o paradigma de
ser (auxiliar com
a fórma principal, infinito presente ou participio passado).
Algumas vezes o futuro é identico ao presente:
en tâ mandá,
mandarei;
bô tâ flal,
dir-lhe-has.
Observações lexiologicas
A etymologia dos vocabulos creolos é geralmente transparente
nos
specimens que publicâmos; notâmos apenas
particularmente os seguintes,
comquanto outros chamem tambem a attenção:
Câ, não; origem
incerta.
Mâ,
mê, que;
provirá da conjugação adversativa
mas?
Mantenha em
mantenha chéo,
significando muitas recommendações;
originou-se este emprego evidentemente da formula antiga de saudar:
Deus te mantenha.
Pamóde, porque;
provém da formula
por amor
de,
por mór
de,
muito usada em portuguez, significando por causa de. No dialecto de
Macau usa-se no mesmo sentido a variante phonetica
prómódi.
Papiá, fallar;
flâ toma o sentido de
dizer.
Sâ em
nhu
sâ tâ passado como tem passado, e
sâ tâ dal, lhe
tem
dado, etc., é obscuro para nós.
Sábe (de
saber) serve para exprimir que uma
cousa é agradavel;
[16]
câ sábe, que
é desagradavel;
ês cumida
ê sâbe, esta comida é
agradavel,
sabe bem;
quel home tên ar
sábe, aquelle homem ter ar agradavel;
algumas vezes póde traduzir-se por
bem.
Fede exprime o contrario:
chêrá
féde, cheirar mal;
fazêl féde,
offendel-o.
Tioque, até que;
oque
(
oc),
oqu'ês, quando.
Nomes hypocoristicos ou nomes de casa
Baca. |
Lourenço. |
Jéjé. |
José. |
Balanta. |
Valentim. |
Faia. |
Raphael. |
Banda. |
Domingos. |
Fan. |
Estephania. |
Barujo. |
Vicente. |
Fina. |
Josephina. |
Beba. |
Genoveva. |
Fita. |
Antonio. |
Bebé. |
Bernabé. |
Fonfon. |
Affonso. |
Beto. |
Alberto. |
Fronha. |
Luiza. |
Beto. |
Roberto. |
Gena. |
Eugenia. |
Bibina. |
Balbina. |
Gruida. |
Margarida. |
Bina. |
Etelvina. |
Ia. |
Maria. |
Bocha. |
Ambrosio. |
Lela. |
Magdalena. |
Bomba.
Bombina. |
Anna. |
Lelencha. |
Florencia. |
Caella. |
Michaela. |
Lelencho. |
Florencio. |
Caixa. |
Nicolau. |
Lena. |
Helena. |
Cote. |
Torquato. |
Lorma. |
Jeronymo. |
Chalino. |
Marcellino. |
Lota. |
Izabel. |
Chamara. |
Maximiana. |
Maja. |
Luiz. |
Chamaro. |
Maximiano. |
Mana. |
Germana. |
Chana. |
Sebastiana. |
Mano. |
Germano. |
Chana. |
Luciana. |
Maral. |
Pedro. |
Chanchane. |
Alexandre. |
Mongido. |
Hermenegildo. |
Chéché. |
José. |
Motas. |
Thimotheo. |
Chella. |
Marcella. |
Munda. |
Raymundo. |
Chello. |
Marcello. |
Nhaba. |
Filippe. |
Chencho. |
Innocencio. |
Nico. |
Manuel. |
Chicha. |
Narcisa. |
Oiro. |
Miguel. |
Chichi. |
Cecilia. |
Pelico. |
Polycarpo. |
Chica. |
Francisca. |
Penha. |
Gregorio. |
Chico. |
Francisco. |
Pomba. |
Ignez. |
Chimí. |
Cazimiro. |
Potâ. |
Hippolyto. |
China. |
Filippe. |
Queta. |
Henriqueta. |
Choga. |
Chrysostomo. |
Quinquina. |
Joaquina. |
Choncha. |
Sebastião. |
Ramal. |
Antonio. |
Chubanta. |
Martha. |
Roda. |
Andreza. |
Chumpa. |
Paula. |
Ronda. |
Agostinho. |
Cobra. |
Francisco. |
Supro. |
Cypriano. |
Coco. |
Simoa. |
Tancha.
Tantancha. |
Constança.
|
Coima. |
Paulo. |
Tantana. |
Victoriana. |
Colaça. |
Nicolaça. |
Tantano. |
Victoriano. |
Cuna. |
Joaquina. |
Tatacha. |
Anastacia. |
[17]
Dada. |
Felicidade. |
Tatacho. |
Anastacio. |
Damás. |
Damasio. |
Tetêa. |
Dorothea. |
Delba. |
Amaro. |
Têtês. |
Matheus. |
Dico. |
Frederico. |
Tilia. |
Mathilde. |
Didi. |
Claudina. |
Tinho. |
Martinho. |
Dindino. |
Bernardino. |
Tino. |
Faustino. |
Dique. |
Henrique. |
Tintim. |
Valentim. |
Doca. |
Theodora. |
Tintina. |
Catharina. |
Doco. |
Theodoro. |
Tólo. |
Bartholomeu. |
Doli. |
Isidoro. |
Touco. |
Victor. |
Doria. |
André. |
Tuda. |
Gertrudes. |
Dunda. |
Domingos. |
|
|
Ás formações hypocoristicas que
têem limitadissima extensão em
Portugal, abriu-se um campo novo nos dialectos fóra da
Europa; algumas
d'essas fórmas vieram de lá para a metropole,
como
Juca,
Nhónhô,
etc.
É difficil e em parte impossivel achar as
relações que existem entre
algumas d'essas fórmas hypocoristicas de Santo
Antão e as usuaes
correspondentes; para algumas não haverá
até talvez relação etymologica;
mas a difficuldade provém principalmente do pequeno numero
das fórmas que conhecemos, que não nos permittem
reconhecer todas as
variedades dos processos, a que devem a existencia. As
fórmas difficeis
de reduzir ou irreductiveis, em a nossa lista são:
Baca,
Banda,
Barujo,
Bomba (e
Bombina),
Caixa,
China,
Choga,
Choncha,
Chubanta,
Chumpa,
Cobra,
Coco,
Coima,
Delba,
Doria,
Dunda,
Faia,
Fita,
Fronha,
Lota,
Maja,
Maral,
Nhabo,
Oiro,
Pelico,
Pomba,
Potâ,
Ramal,
Roda,
Ronda,
Touco (32 fórmas). As
outras fórmas hypocoristicas de
Santo Antão provém das usuaes correspondentes por
processos de
formação em geral perfeitamente regulares. O
processo mais geral é
o da simples apherese de todos os elementos que precedem a syllaba
accentuada; essa alteração raramente é
a unica que se dá: quasi sempre
se complica com outras. Em poucos casos a apherese deixa de fazer
desapparecer todas as syllabas que precedem a accentuada (vid.
infra
Mongido e
Chamaro).
Formação por apherese
A. Simples apherese.
Caela |
de |
Michaela. |
Mano |
de |
Germano |
Colaça |
» |
Nicolaça. |
Queta |
» |
Henriqueta. |
Fina |
» |
Josephina. |
Tinho |
» |
Martinho. |
Lena |
» |
Helena. |
Tino |
» |
Faustino. |
Em:
a apherese estendeu-se á consoante inicial da syllaba
accentuada.
[18]
B. Apherese complicada com outros
phenomenos phoneticos.
1) Modificações nas vogaes finaes:
Cate |
de |
Tor-quato. |
Mota-s |
de |
Ti-motheo. |
Dada |
» |
Felici-dade. |
Munda |
» |
Raymundo. |
Gena |
» |
Eu-genia. |
|
|
|
2) Apocope:
3) Apocope com retracção do accento:
4) Alteração da vogal accentuada:
Cuna |
de |
*Quina |
de |
Joa-quina. |
5) Quéda de
r
da syllaba accentuada, com ou sem modificação das
vogaes finaes:
Beto |
de |
*Berto |
de |
Al-berto. |
Beto |
» |
*Berto |
» |
Ro-berto. |
Dico |
» |
*Drico |
» |
Fre-drico, Frederico. |
Guida |
» |
*Grida |
» |
Mar-grida, Margarida. |
Tuda |
» |
*Trudes |
» |
Ger-trudes. |
6) Modificações nas consoantes das syllabas
conservadas:
a)
v em
b.
Beba |
de |
*Veva |
de |
Genoveva. |
Bina |
» |
*Vina |
» |
Etel-vina. |
b)
s,
z
(
ç,
s) em
ch:
Chicha |
de |
*Cisa |
de |
Nar-cisa. |
Chello |
» |
*Cello |
» |
Mar-cello. |
Tancha |
» |
*Tança |
» |
Cons-tança. |
c)
ci,
si,
ti em
ch:
Bocha |
de |
*Brosio |
de |
Am-brosio. |
Chana |
» |
*Ciana |
» |
Lu-ciana. |
Chencho |
» |
*Cencio |
» |
Inno-cencio. |
Chana |
» |
*Tiana |
» |
Sebas-tiana. |
Em
Bocha houve quéda de
r como em
Beto,
Tuda, etc., mudança
de
o em
a como em
Munda.
[19]
d) Mudança de
ç em
ch com
alteração n'uma vogal protonica:
Chalino |
de |
*Cellino |
de |
Mar-cellino. |
e) Mudança de
ç em
ch e desapparecimento d'uma
consoante:
Chico |
de |
*Cisco |
de |
Francisco. |
Facico é a pronuncia
pathologica do nome
Francisco.
f) Alterações diversas regulares de consoantes
(complicadas n'alguns
casos com modificações vocalicas).
Assimilação de
ld em
ll
(
l):
Tilia |
de |
*Tilde |
de |
Ma-thilde. |
Assimilação de
ld em
d:
Mongido (Mengido) |
de |
*Menegildo |
de |
Hermenegildo. |
r em
l,
n em
r:
Lorma |
de |
*Ron(y)mo |
de |
Je-ronymo. |
r em
l:
Doli |
de |
*Doro |
de |
Isi-doro. |
r em
d:
Dique |
de |
*Rique |
de |
Henrique |
n em
r:
Chamáro |
de |
*Chimiano |
de |
Ma-ximiano. |
n em
l:
Lela |
de |
*Lena |
de |
Magda-lena. |
g) Alteração consonantal irregular:
Doca |
de |
*Dora |
de |
Theo-dora. |
h) Alteração da consoante da syllaba accentuada
com apocope de
syllaba:
Chimí |
de |
*Zimí |
de |
Ca-zimiro. |
[20]
C. Apherese e
reduplicação:
1) Sem apocope:
a) |
Bibina |
de |
*Bina |
de |
Bal-bina. |
|
Chanchane |
» |
*Chane
(Chandre) |
» |
Alexandre. |
|
Dindino |
» |
*Dino |
» |
Bernar-dino. |
|
Lelencho |
» |
*Lencho
(Rencho) |
» |
Flo-rencio. |
|
Tantancha |
» |
*Tancha |
» |
Constança. |
|
Tatacho |
» |
*Tacho |
» |
Anas-tacio. |
|
Tetea |
» |
*Tea |
» |
Doro-thea. |
|
Tetés |
» |
*Tés (Teus) |
» |
Ma-theus. |
|
|
|
|
|
|
b) |
Bebé |
» |
*Bé |
» |
Berna-bé. |
|
Chéché |
» |
*Ché |
» |
José. |
|
Jéjé |
» |
*Jé |
» |
José. |
|
Quimquim |
» |
*Quim |
» |
Joa-quim. |
|
Tintim |
» |
*Tim |
» |
Valen-tim. |
2) Com apocope:
Didi |
de |
*Di
(Dina) |
de |
Clau-dina. |
Fonfon |
» |
*Fon
(Fonso) |
» |
A-fonso. |
Chichi |
» |
*Chi
(Chilia) |
» |
Ce-cilia. |
Chichi póde explicar-se
tambem por apocope.
3) Com syncope:
Tantano |
de |
Tano
(Trano, Triano, Toriano) |
de |
Vic-toriano. |
Tintina |
» |
Tina
(Trina, Tarina) |
» |
Ca-tharina. |
Formação por apocope (sem apherese)
A. Sem
retracção do accento:
Balánta |
de |
Valentim. |
Pelíco |
» |
Policarpo. |
Supro |
» |
Cypriano. |
Algumas das fórmas difficeis de explicar resultam sem
duvida,
em parte, de uma complicação de processos;
Potâ, por exemplo,
provém,
de
Hypolito por apherese de
Hy, syncope de
l com
contracção de
vogaes e protracção do accento, mas esta
fórma permanece isolada.
A derivação póde tambem, como n'outras
linguas, ter representado
algum papel
(
Lota==
Izabelota).
[21]
Os processos de formação que acabâmos
de expor não têem nada
de especial: encontram-se com simples variantes n'um grande numero
de linguas antigas e modernas, falladas a distancias consideraveis,
pertencendo
a grupos radicalmente distinctos.
Mr. Robert Mowat consagrou ás fórmas
hypocoristicas um estudo
muito interessante,
De la déformation dans
les noms propres, publicado
primeiramente em
Mémoires de la
société de linguistique de
Paris, e depois
na brochura
Noms propres anciens et
modernes (Paris, 8.º, 1869),
p. 41-59. Um grande numero de fórmas hypocoristicas
germanicas
acha-se estudada na obra especial de Franz Stark,
Die
Kosenamen der
Germanen (Wien, 1868, 8.º), em August Fick,
Die Göttinger Familiennamen
(Programma do
Gymnasium and Realschule erster Ordnung
zu Göttingen. Göttingen, 1875,
4.º), em Ludwig Steub,
Die Oberdeutschen
Familienamen (München, 1870, 8.º peq.) Nos
Studien zur romanischen
Wortschöpfung von Carolina
Michaëlis ha uma collecção interessante
de fórmas hypocoristicas romanicas (p. 70 ss).
São essas as
obras que temos á mão sobre o assumpto, mas ha
outras que d'elle se
occupam, como a de August Fick,
Griechische
Eigennamen. Vamos extrahir
d'essas obras alguns exemplos que provam a existencia de leis
geraes nas formações hypocoristicas.
Na Biblia
Aram (Gen. 22, 21) e
Ram (Job. 32, 2) designam o
mesmo personagem; o mesmo se dá com
Jaziel (Chr. I, 15, 20) e
Aziel (Chr. I, 15, 18). Mowat, que
cita esses exemplos, approxima
Lazaro
(Evangelho de S. João e de S. Lucas) de
Eleazaro (Livro dos Machabeos)
e adduz o copta
Chael (cp.
Caella por
Michaela no creolo de
Santo Antão), o phenicio
Karthalon por
Melkarthalon,
Stembal por
Manastambal
(segundo Gesenius).
No grego o processo da apherese é raro; exemplo:
A apherese com derivação observa-se em:
Στασοῦλα |
de |
'Ανα-στασίη |
, |
suf.
οῦλα |
Σταθακης |
de |
Εὐ-στάθυος |
, |
suf.
ακη |
Na mencionada lingua ao contrario o processo da apocope é
frequente,
sendo as terminações supprimidas substituidas
constantemente
por a final ᾶς; exemplos:
'Αλεξᾶς |
de |
'Αλέξανδρος |
'Αλεξᾶς |
de |
'Αλέξανδρος |
'Αρτεμᾶς |
» |
Αρτεμίδωρος |
Μηνᾶς |
» |
Μηνόδωρος |
Επαφρᾶς |
» |
Επαφρόδειτος |
Νικανδᾶς |
»
|
Νικανδρίδας |
Ζηνᾶς |
» |
Ζηνόδωρος |
Ολυμπᾶς |
» |
Ολυμπιόδωρος |
Κλεόπας |
» |
Κλεόπατρος |
Παρμενᾶς |
»
|
Παρμενίδης
ou
Παρμενίσκος |
Κλεοφᾶς |
» |
Κλεόφαντος |
Λουκᾶς |
» |
Λουκανός |
Σιλᾶς |
»
|
Σιλουανός |
O inglez, com a sua tendencia para accentuar a syllaba inicial, emprega
de preferencia a apocope nas formações
hypocoristicas; essa
apocope é complicada com outros factos phoneticos, de que
mencionaremos
alguns.
[22]
1. Apocope simples:
Chris |
de |
Chrístian |
de |
Christiánus. |
Clem |
» |
Clemént |
» |
Cleméntius. |
Dan |
» |
Dániel |
» |
Daniél. |
Tom |
» |
Thómas |
» |
Thomás
(Θωμάς). |
Greg |
» |
Grégory |
» |
Gregórius. |
2. Apocope e adjuncção de um
s:
a) Sem assimilação de consoantes:
Cutts |
de |
Cuth-bert. |
Edes |
» |
Ed-ward. |
b) Com assimilação de consoantes:
Watts |
de |
Walter |
, |
Gibbs |
de |
Gilbert. |
Comp. creolo
Motas de
Timotheo.
3. Apocope com mudança de
r em
d:
Dick |
de |
Richard |
, |
Dobbs |
de |
Robert. |
Comp. creolo
Dique de
Henrique.
Nos seguintes nomes germanicos medievaes desappareceu ou a primeira
ou a segunda parte:
Faro |
por |
Burgundofaro. |
Bruna |
por |
Brunihildís. |
Giso |
» |
Wartgis. |
Euva |
» |
Evarix. |
Offa |
» |
Ceolwulf. |
Hrode |
»
|
Hruodolf. |
Prandus |
» |
Rotprandus. |
Sunna |
» |
Suanilda. |
Uffo |
» |
Liudulfus. |
Tado |
» |
Tadelbertus. |
A suppressão de uma parte do nome foi seguida ou
acompanhada,
como se vê, de outras modificações,
comparaveis em parte ás que observámos
nas fórmas hypocoristicas do creolo de Cabo Verde.
O processo de addição de suffixos diminutivos
ás fórmas mutiladas
tem grande extensão nas linguas germanicas. Exemplos:
Godi-ko |
de |
*Gode |
por |
Gode-fredus. |
Ghise-ke |
» |
*Gise |
» |
Gise-lbertus. |
Ghere-ke |
» |
*Ghere |
» |
Gere-hardus. |
Albi-so |
» |
*Albe |
» |
Albe-ricus. |
Gisle-zo |
» |
*Gisel |
» |
Gisel-bertus. |
Berti-nus |
» |
*Bert |
» |
Bert-randus. |
Feli-nus |
» |
*Fel |
» |
Fel-mirus. |
[23]
Escolhemos agora alguns exemplos da lista das fórmas
hypocoristicas
francezas dadas por Mowat:
Bastien |
de |
Sebastien. |
Guste |
de |
Auguste. |
Billon |
» |
Barbillon. |
Livet |
» |
Olivet. |
Briel |
» |
Gabriel. |
Mancet |
»
|
Clémencet. |
Brois |
» |
Ambrois, Ambroise. |
Mas |
» |
Thomas. |
Colas |
» |
Nicolas. |
Maury |
» |
Amaury. |
Cot |
» |
Jacot. |
Nardon |
» |
Bernardon. |
Delle |
» |
Adèle. |
Pin |
» |
Chopin. |
Fan |
» |
Stephan. |
Pold |
» |
Léopold. |
Fonce, Fons |
» |
Alphonse. |
Randal |
» |
Durandal. |
Gelle |
» |
Angèle. |
Sandre |
» |
Alexandre. |
Gory |
» |
Grégory. |
Thézard |
» |
Balthazar. |
Hippeau |
» |
Philippeau. |
Vestris |
» |
Silvestre. |
Estes exemplos bastam para mostrar que as fórmas
hypocoristicas
creolas são o resultado da acção de
leis geraes.
2. Creolo de S. Thomé
Conhecemos apenas o seguinte specimen que devemos á memoria
de um amigo; são versos de um portuguez que habita a ilha:
Sã Ma
Plantá, |
Senhora Maria da Apresentação, |
Sã Ma
jabo, |
Senhora Maria
diabo, |
Floli blavo, |
Flor
brava, |
Bujungá. |
Bujungá (nome indigena) |
Neni
d'òlo, |
Annel d'oiro |
Cun mimoia |
C'om
argolas (memoria); |
Sâ za
estoia, |
Isto
é historia, |
Sã
zetá. |
Senhora rejeitar, |
Lenço seda |
Lenço de seda |
C'uma saia, |
C'uma
saia |
Mé lagaia, |
? |
Sã
zetá |
Senhora rejeitar. |
Sã Ma
Plantá. |
Senhora Maria da Apresentação. |
3. Creolo da Ilha de Sant'Iago
(archipelago de Cabo Verde)
Ao nosso amigo, o sr. Luciano Cordeiro, secretario da sociedade
de geographia, devemos a communicação da seguinte
carta, dictada
por uma negra de Sant'Iago, que se exprime no creolo d'aquella ilha:
Nho |
Dótore. |
Senhor |
doutor. |
Mi |
ten |
sódadi |
cheu |
di nho
Dótore, |
a má |
di nha Dóna
L. |
Eu |
tenho |
saudades |
muitas |
do sr. doutor |
e mais |
da sr.a
Dona |
[24]
Mi manda |
mantenha, |
cheu, |
cheu, |
cheu. |
Eu mando |
recommendações, |
muitas, |
muitas, |
muitas. |
Mi a má |
Seyton |
nu |
está |
desamparados |
cheios di |
sódadi |
Eu e mais |
o Seyton |
nós |
estamos |
desamparados |
cheios de |
saudades |
di nha Dotore e di nha L....
do sr. doutor e da sr.
a
Oh! nhor Deus!
Oh! senhor Deus!
Nha Sinhára |
manda |
mantenha |
cheu |
tambê |
A. cu J. |
A minha senhora |
manda |
recommendações |
muitas |
tambem |
A. e J. |
Está |
magro |
tóraqui |
piscóço |
já sae fora. |
Estão |
magros |
até que (até o ponto) |
pescoço |
já sae fóra. |
(Isto é:
está demasiadamente magro).
Agora |
qui
já mi sabê
cusa |
qui é |
falta |
di nho Dotore. Deos |
Agora |
que já eu sei cousa |
que é |
a falta |
do sr. doutor. Deus |
al judan |
qui in torna, |
olhá
nho. |
ha de permittir-me |
que eu torne |
a ver sr. |
Mi |
está |
na casa di |
nha |
Sinhára,
mas en |
stá |
cu |
muito |
Eu |
estou |
na casa de |
minha |
senhora, mas eu |
estou |
com |
muitas, |
muito |
sódadi |
di nhos |
tudo |
dós. |
muitas |
saudades |
dos srs. |
ambos |
dois. |
Mi |
é |
quel creada |
di nhós |
qui
tâ |
chomado |
Maria. |
Eu |
sou |
a creada |
dos srs. |
que se |
chama |
Maria. |
Este dialecto offerece naturalmente intimas similhanças com
o de
Santo Antão, mas revela uma maior
approximação ao portuguez puro,
que em parte póde ser puramente individual, poisque a negra
que
dictou a carta tem vivido muito com pessoas instruidas originarias da
metropole.
O dialecto possue um presente formado com
tá: en tá
bá, eu vou,
como em Santo Antão. A negação
é tambem
câ, não;
nh'armun==meu
irmão,
como em Santo Antão;
al==
hade,
ajudan==
ajudar-me,
e outras
particularidades coincidem ainda nos dois dialectos, e provavelmente
em todos os do archipelago de Cabo Verde.
Observam-nos que
nhor e
nhara por
senhor,
senhora são mais
respeitosos
que
nho e
nha e se empregam dirigindo-se a
pessoas de idade.
Nhanha é a senhora da
casa, mãe de familia;
nhanhinha, menina;
nhonhosinho,
menino.
[25]
4. Creolo da Guiné portugueza
Tudo quanto podemos apurar sobre o creolo portuguez da Africa
(continente e ilhas) se reduz ao que precede e á seguinte
noticia.
De la langue, créole de la
Guinée portugaise. (Notes sur la Guinée
portugaise ou
Sénégambie
méridionale, par M.
Bertrand-Bocandé). Bulletin de la
Société de
Géographie de Paris, 3e
série,
t. XII. 73-77 (1849 juillet et août):
«On conçoit que des hommes acoutumés
à se servir pour manifester
leur pensée, d'un idiome aussi simple, ne purent facilement
élever
leur intelligence au génie d'une langue
européenne. Quand ils furent
en contact avec les Portugais et forcés de s'entendre avec
eux, en parlant
une même langue, il a fallu que l'expression
variée des idées acquises
pendant tant de siècles de civilisation se
dépouillât de sa perfection,
pour s'adapter aux idées naissantes et aux formes barbares
du
langage des nations à demi sauvages. Le mot
adopté dut conserver
toujours le même son; et perdre ces désinences
variées qui servent à
distinguer les nombres, les genres, les pronoms, les temps ou les
modes;
il fut soumis seulement aux transformations absolument indispensables
au discours, pour qu'il ne devînt pas uniquement des sons
insignifiants.
«Il se fit un retranchement graduel de toutes ces
modifications qui
servent à exprimer les diverses nuances de la
pensée, et quand il ne
fut plus possible de rien retrancher pour conserver le discours encore
intelligible, l'idiome fut fixée dans sa grammaire
particulière, devenue
aussi simple que peuvent le permettre les règles de la
grammaire générale
de toute langue. Il exista alors ce que l'on appelle la langue
créole portugaise.
«Pour se former, elle a dû d'abord se soumettre
à la prononciation
habituelle des peuples d'Afrique. Ceux-ci ne peuvent, comme je l'ai
déjà dit, prononcer les deux sons
représentés par
je et
che qui sont
devenus
ie et
kie.
«Les noms n'eurent plus de terminaison pour distinguer les
nombres;
on doit désigner la quantité de l'objet, ou dire
s'il y en a peu,
ou beaucoup. Le
genre, en parlant
des animaux seulement, se fait connaître
en ajoutant au nom les mots
homme ou
femme; on dit donc par
exemple: un
bœuf
homme, un
bœuf
femme.
«Il fallut adopter des pronoms. Il y a des pronoms personnels
pour
les différentes personnes et le nombre de ces personnes.
«Le radical des verbes se termine toujours par une voyelle:
on en
a retrauché l'
r; et ce
radical peut être employé comme substantif,
ou comme verbe.
«Les pronoms ajoutés au verbe désignent
seuls les personnes; il n'y
a pas de désinences différentes pour les
déterminer.
«Quand aux temps
présents,
passés et
futurs, il fallait
nécessairement
un moyen de les distinguer.
«Le
présent se
fait connaître de deux manières, ou bien en
ajoutant
simplement l'un des pronoms au radical, ou bien, au moyen du verbe
[26]
être suivi du mot
na, qui signifie
dans et au radical: ainsi pour dire
j'écris, on emploie cette
tournure
moi écris, ou
mois est dans écri, qui
équivaut à
je suis à
écrire; le passé se
désigne avec la particule
ia,
(
déjà), mis
avant ou après le radical;
ta, placé devant marque
un
temps
futur;
va, après, forme
l'imparfait; enfin
ta
précédant et
va suivant
le radical indiquent le mode conditionnel.
«J'ai connu au poste français de Séyou
un de ces Papels-manjaga
que l'on appelle portugais, qui était devenu sergent de
poste; il n'avait
pu apprendre le français; mais il avait adapté
à notre langue le mécanisme
de la langue créole portugaise, et se serait parfaitement
fait
entendre de quelqu'un qui en aurait eu la clef; ses commandants avaient
beaucoup de peine à le comprendre. Ainsi il disait
moi faire ou
mois
est na faire, pour dire je fais;
moi
ia faire, j'ai fait;
moi faire
va, je
faisais;
moi ta faire, je ferai;
moi ta faire va, je ferais ou
j'aurais
fait.
«Le créole portugais n'est donc qu'une
altération de la langue portugaise;
il est composé de beaucoup de mots de cette langue dont
quelques-uns sont hors d'usage aujourd'hui, de mots espagnols, et
d'autres
empruntés aux langues des peuples qui entourent ses
différentes
factoreries.
«Ce créole varie dans chaque lieu: il a des mots,
des expressions,
une accentuation et même quelquefois une ordre grammatical
plus ou
moins différents, suivant la langue qui a dominé
pour faire subir ses
modifications à la langue portugaise, qui est toujours
partout le fondement
du créole.
«Dans la Guinée il ressemble à celui
des îles du cap Vert; mais
dans celle-ci on peut dire qu'on remarque autant de dialectes qu'il y
a d'îles, et dans celle de San-Thiago seule, les
créoles de la Villa da
Praya, du centre de l'île et de Terrafal, et de San-Miguel
offrent des
changements notables: plus on s'approche de la Villa da Praya, plus
le créole ressemble au portugais. Dans la Guinée,
le créole de Bissao
sera mêlé davantage d'expressions
papels,
celui de Ziguichor, de
bagnoun
ou de
floup, celui de Farim et de
Géba de
mandingue.
«Cet idiome se modifie encore suivant les personnes qui le
parlent:
la position sociale, l'éducation, les habitudes, influent
d'une manière
aussi remarquable pour l'expression créole que pour les
langues les
plus parfaites. Il est facile à la personne la moins
exercée en entendant
le créole, de deriver le rang ou l'éducation de
celui qui le parle.
On entendra même des personnes, quoique sans instruction,
s'exprimer
dans cet idiome avec une facilité et une grâce que
l'on ne pourra
s'empêcher d'admirer; ils savent parfaitement en tirer parti,
quoiqu'il
paraisse si ingrat, pour composer des récits
intéressants, et improviser
des chansons dans lesquels la vérité des images
et les circonlutions
suppléent aux expressions qui manquent dans le langage,
et dépeignent souvent élégamment les
idées qu'ils veut suggérer.
«Des personnes instruites qui tiendront une conversation en
créole,
se garderont difficilement de mêler dans leurs discours des
expressions,
des tournures empruntées à la langue portugaise,
et principalement
s'ils veulent exprimer quelque idée abstracte qui n'a point
de mots
en créole.
[27]
«D'un autre côté, il est presque
impossible à un Portugais habitué
long temps à ne parler que le créole, de se
soustraire à une funeste
habitude; des mots, des expressions, des phrases créoles se
rencontreront
dans sa conversation, dans ces écrits. Et s'il n'est pas
soutenu par
une connaissance profonde de sa langue, il la confondra
bientôt avec
le créole qu'il ne pouvait d'abord entendre, il finira
même quelquefois
par parler un langage qui ne sera ni portugais, ni créole,
car il n'en
aura que le mécanisme.»
5. O portuguez no Brazil
O Brazil com as suas 873:000 milhas quadradas, povoadas, é
verdade
por emquanto apenas por uns 10 milhões de habitantes,
offerece
um campo vasto á alteração do
portuguez, á qual se oppõe porém a
extensão
crescente da litteratura, e especialmente do jornalismo. Como
o dominio litterario da velha metropole europêa
não cessou com o dominio
politico, a linguagem litteraria do grande imperio da America
meridional não se afasta senão n'algumas
peculiaridades de importancia
secundaria do portuguez da Europa. A linguagem fallada distingue-se,
já na bôca dos mais instruidos, por essa
entoação geral, por essa
tendencia determinada para tornar abertas todas as vogaes atonas, por
esse amor do iotacismo, que nos fazem reconhecer ao fim da primeira
phrase pronunciada por um brazileiro ou pessoa que se adaptou
á pronuncia
brazileira a sua proveniencia. Na linguagem popular, especialmente
das provincias, na linguagem dos
matutos, notam-se
modificações
phoneticas mais consideraveis, a mais geral das quaes é a
suppressão
do
r final, que permitte rimas como
a que nos apresenta a seguinte
quadra popular:
Mariquinhas morreu hoje,
Hoje mesmo s'éntirou:
Sobre a sua sipultura
Nasceu um pé de firô (flor).
O vocabulario brazileiro apresenta naturalmente muitos termos compostos
ou derivados de termos portuguezes, mas desconhecidos na nossa
lingua da Europa, e um numero assás consideravel de termos
provenientes
dos dialectos indigenas, o
tupi e o
guarani, e ainda de outras
linguas americanas; as linguas africanas ministram tambem alguns
termos.
Uma parte das palavras peculiares do portuguez do Brazil foram
já reunidas em um
Vocabulario
brazileiro, por Braz da Costa Rubim
(Rio de Janeiro, 1853. 8.º).
Damos em seguida uma serie de versos populares do Brazil. As
cantigas n.
os 1 e 4 a 12 foram-nos communicadas
por um amigo; 2 e
3 acham-se na
Noticia da provincia de
Mattogrosso, por Joaquim Moutinho,
p. 19; n.
os 13 a 20 acham-se na comedia
O
matuto na
côrte por
Antonio Augusto de Araujo Correão. Rio de Janeiro, 1863.
[28]
1. Cantiga de pretos
Qui é queli santo
Qui vai no andô?
É San Binidito
É nosso sinhô.
Chi, cha.
2. Cantiga dos cururueiros de Matto-grosso
Em cima d'aquelle morro
Siá dona
Tem um pé de
jatobá.
Não ha nada mais pió
Ai, siá dona,
Do que um home se casá.
3. Desafio dos cururueiros
|
|
homem |
Eu passei o Parnahyba,
Navegando numa barça,
Os peccados vem da saia,
Mas não pode vir da carça. |
mulher |
Dizem que a muyé é
farça
Tão farça como papé,
Mas quem vendeu Jesus Christo.
home, não foi muyé. |
|
4.
|
|
7.
|
|
Quando mozo vai ni rua,
Camiza cheia di renda.
Quitanda sei a qui reva:
Por fóça que acha venda. |
|
Zi eu vi, ũa
baráta
No capóte di vóvó,
Quando eu fui prá pegálla
Báteu ázas e vóó. |
|
5.
|
|
8.
|
|
Zi criorinha dim Ba'ía.
Za não come bacai'ao;
Come só óvátáfá
Cucu, farinha di páo. |
|
Minha
Avó quando é di noite
Custumava-se a banhá,
Quando entra na gaméra
Começa rogo a chorá...! |
|
6.
|
|
9.
|
|
Zi criorinha dim Ba'ía
Quando vai lává ó má,
Deixáram as água turva,
Sendo ellas um cristá. |
|
Zi um gustinho
lhe quero dá
Dá minha bunda quábráda
Québra a bunda, mexe bunda
Québra a bunda de Sinhá. |
|
|
|
|
Québra a
bunda, mexe
bunda
Québra a bunda di iá-iá.
|
10.
|
O negra
trás
café, chá e
pão torrado,
Para dar ó sôr pintor: vae pintar o meu sobrado.
De verde amarello e incarnado;
Onde eu faço o meu gingado.
|
[29] |
11.
|
|
15.
|
|
Minha mulatinha,
Meu muracujá
A maré é boa,
Vamous embarcá
Á beira do rio,
Á borda do má:
Eu sou artilheiro
Que sei atirá.
Peixinho do rio,
Camarão do má:
Minha mulatinha
Diz-me o teu nome.
—Eu mi chamo botão
Do calção do home. |
|
Sô Mané
diz que não qué
Que o rato caia no mé,
As alegria dos Cabanos
É matá os pápa mé.
Olé!
Olé!
|
|
|
16.
|
|
|
Esta vai por despedida
Por dentro d'esta liminha.
Ora viva Sinhá Dona
Sinhá Insolencia Zephina. |
|
12.
|
|
Marca o passo,
moça, barabos!
Patury não se come sem limão,
As mulata me chamão cidadão.
|
|
—Chiáu,
ó
rapariga!
—Que pede, ó sinhó!
—Chiáu quer vir cumigo?
—Sen surda, sinhó,
—Chiaú, eu do dinheiro,
—Percebo, sinhó.
—Então, ven ja cumigo.
—Já, já, vou, sinhó. |
|
17.
|
|
|
Minha caboca bónita
Sapateia no tijolo,
Que a barra do teu vestido
É prata e parece ouro. |
|
13.
|
|
18.
|
|
—Minha gente
não inore
Este meu cantar baixão!
Estou com o peito cerrado.
D'um marvado catarrão.
—Senhô mestre cantadô,
Ai que me mandou cantá,
Quero que me dê por conta
Ai os peixe que tem no má.
Ai os peixe que tem no má
Carrego no meu chapéo,
Ai quero que me dê por conta.
Ai as estrellas que tem no céo.
—Você me mandou cantá
Ai pensando que eu não sabia,
Eu não sou cumo a cigarra
Que no cantá leva o dia. |
|
Ai a viola está com fóme
E a prima está c'uma dô,
Minha gente venhão vê
Que bahiano gemedô. |
|
|
19.
|
|
|
Diga lá, Senhó Doutô,
Que aprendeu a lussophia,
Qual é a ave que avôa
E que dá leite quando cria? |
|
|
20.
|
|
14.
|
|
Por favô, Senhô doutô,
Me adecifre esta conta
Vinte e cinco guardanapos
Com dois gintem em cada ponta?
|
|
Ai! sô mestre cardereiro
Metta a mão na mêladura,
Que a canna do Lavradô
Só que dá é rapadura. |
|
Sim senhô, eu advinho
Sem fartá nem um dé réis,
Doze pátacas e meia
Vem a ser quatro mim réis. |
[30]
Diversas particularidades caracteristicas dos dialectos creolos
repetem-se
no Brazil; tal é a tendencia para a suppressão
das fórmas do plural,
manifestada aqui em que, quando se seguem artigo e substantivo,
adjectivo e substantivo, etc., que deviam concordar, só um
toma o signal
do plural. Assim na cantiga n.º 20:
dois
gintem==dois vintens. Ouve-se
com frequencia
os homen por
os homens;
as
muyé por
as
mulheres;
duas
boa pessoa por
duas boas
pessoas;
casas
grande por
casas
grandes, etc.
Mencionaremos ainda o habito de dar fórmas diminutivas aos
pronomes:
ellasinha==ella (referindo-se a uma
menina);
umasinha==uma (referindo-se
a uma creança, a um animal, a uma cousa pequena).
Tens
um
cão? Tenho umzinho (isto é um
cão pequeno).
6. Dialecto portuguez de Ceylão
ou indo-portuguez
A primeira noticia que tivemos d'este dialecto achámol-a na
obra
de A. A. Teixeira de Vasconcellos,
Les contemporains
portugais, espagnols
et brésiliens, t. I.
Le
Portugal et la Maison de Bragance. Paris,
1859, 8.º, pag. 115-116, em que se acha um curtissimo extracto
da
parabola do semeador em indo-portuguez. A obra de lord Stanley
The
three voyages of Vasco da Gama
ministrava-nos
depois um excerpto
mais extenso (Genesis, cap. III). Depois, como já dissemos,
reunimos
assás abundantes materiaes para o estudo do dialecto. Hoje
limitâmo-nos
á parte historica e bibliographica, e no nosso ultimo
capitulo indicaremos
os principaes pontos de contacto entre o indo-portuguez e os
dialectos similhantes.
Em 1503 Lourenço d'Almeida submetteu um dos reis mais
poderosos
da ilha de Ceylão, Boenago Pandar. Por esse tempo foi
fundada
a fortaleza de Colombo e deu-se o commando da ilha a um
capitão portuguez
[3].
O terceiro viso-rei da India Lopo Soares fundou ali um estabelecimento
commercial em 1517, que porém decaíu.
Só pela morte de
D. João Dharmapala, que legou os seus dominios ao rei de
Portugal,
então Filippe I (1581), é que os portuguezes
adquiriram titulo á soberania
da ilha, com excepção de Jaffna, de que
reconheciam ainda o
rei nominal, e de Kandy, em cujo throno elles queriam assentar a rainha
Catharina. Apesar dos portuguezes desejarem impor suas leis e
costumes, ficaram de pé as antigas leis e privilegios da
ilha.
N'esse periodo e no seguinte as guarnições dos
fortes portuguezes
regulavam por 20:000 homens, dos quaes apenas menos de 1:000 eram
europeus. Colombo desenvolveu-se então muito: edificaram-se
conventos,
igrejas, hospitaes, e quando caíu em 1656 nas
mãos dos hollandezes
residiam lá mais de 900 familias nobres, alem de 1:500
familias de empregados
da justiça, commerciantes e negociantes. Em 1617 os
portuguezes
assenhorearam-se á mão armada de Jaffna. A
alliança dos hollandezes
com o rei de Kandy foi o ponto de partida para o seu dominio
[31]
na ilha. Em 1658 tornaram-se senhores de todo o littoral e terras
baixas e expelliram os portuguezes, tratando de destruir todos os
vestigios
da nossa influencia. As igrejas catholicas foram substituidas por
igrejas protestantes; a lingua portugueza, que durante o nosso
tão curto
dominio se implantára na ilha sob uma fórma
dialectal, ao lado das
linguas indigenas, o singalez e o tamul, foi perseguida. Rapava-se a
cabeça de todos os escravos que fallavam portuguez;
multavam-se por
negligencia os seus senhores: os hollandezes esperavam assim, como
diziam n'uma proclamação «destruir a
lingua dos portuguezes para que
o nome dos nossos inimigos pereça e o nosso proprio
floreça em seu
logar». (Emerson II, 70.)
«O dominio da Hollanda em Ceylão foi quasi igual
em duração ao
de Portugal, cerca de um seculo e quarenta annos, mas a politica dos
dois paizes deixou uma muito differente impressão do
caracter e instituições
do povo em cujo seio elles viveram.» (Emerson II, pag. 70.)
Ha uma palavra portugueza que os hollandezes não
perseguiram,
antes aproveitaram como fonte de receita. O titulo de
dom era muito
estimado pelos indigenas de Ceylão: os portuguezes
permittiam o seu
uso pela quantia de alguns centos de dollars. Escrevia-se o nome do
comprador n'uma placa de prata com o desejado
dom á frente; o comprador
ajoelhava ante o governador ou pessoa por elle regularmente
auctorisada; collocava-lhe a placa na cabeça e a auctoridade
dizia:
Levanta-te, dom Fulano. Os hollandezes continuaram a vender o
dom
rendoso, reduzindo o preço, que chegou por fim a dez
dollars, tornando-se
assim accessivel ás bolsas modestas. Hoje ainda a ilha
está cheia
de dons. O hollandez foi esquecido totalmente, até pelos
descendentes
dos que o fallavam; a repressão odienta não poude
ao contrario destruir
o portuguez.
Senhora da ilha desde 1796, a Inglaterra adoptou uma politica diversa
da dos seus predecessores: os inglezes estudaram o indo-portuguez,
como elles chamam ao dialecto portuguez de Ceylão; deram-lhe
uma pequena litteratura, de que damos mais abaixo noticia, e
serviram-se
d'elle como meio de propaganda politica e religiosa.
Muito mais facil de estudar que as linguas indigenas, o tamul que,
é fallado na costa norte, e o singalez, fallado ao centro e
na costa sul,
comprehendido por muitas familias principaes das cidades, que ainda
se ensoberbecem com o seu
dom, os
seus nomes portuguezes, precedendo
os appellidos indigenas, o indo-portuguez era um instrumento precioso
que os inglezes com o seu genio administrativo não podiam
deixar
de aproveitar.
As informações que reunimos sobre a
extensão e importancia actual
do indo-portuguez não são sufficientes para
formar sobre este assumpto
um juizo inteiramente seguro. Um missionario que esteve na ilha
escrevia,
em data de 13 de novembro de 1875, que o indo-portuguez é
quasi exclusivamente a lingua dos descendentes dos portuguezes e
hollandezes
que se estabeleceram na ilha; que a lingua não é
considerada
pelos missionarios como importante meio de
instrucção, tanto quanto
os que a usam fallam outra lingua; que os missionarios Wesleyanos
têem um serviço publico em portuguez em Colombo e
em duas ou tres
cidades; que o dialecto está em extrema decadencia, e que
com o curso
[32]
de outra geração se extinguirá
totalmente. O missionario que deu estas
noticias não estava, porém, bem informado, porque
diz que o indo-portuguez
não tem grammatica nem diccionario, o que nós
sabemos
não ser exacto. Um outro missionario, que residiu tambem em
Ceylão,
descreve com data de 20 de março de 1877, que durante o
exercicio
das suas funcções de missionario em
Ceylão não encontrou uma só
pessoa com quem o portuguez podesse ser empregado como meio de
conversação; que nos districtos do norte e do
oriente da ilha o portuguez
está quasi inteiramente extincto; que a missão
tinha deixado de o empregar
para o serviço publico havia alguns annos, ao norte da ilha;
que ao sul estava em rapida decadencia.
Alguns testemunhos, em verdade anteriores aos d'esses missionarios,
cujas informações devemos ao nosso bom amigo rev.
R. H. Moreton,
attribuem ao dialecto maior importancia e extensão; a
bibliographia
que damos mais abaixo depõe tambem n'este sentido.
Na
Cruz de Christo lê-se:
«O auctor te da sua guardismento per o
publico, per o modo ne qual sua
Versos
sagrada tinha recebido; dos
cento e cincoenta livrinhos de aquel tinha impressado e vendido per o
povo quem te sabe portuguez; esti lingoa mais que assi corrupto, tem
papiado extensivomente nesti Ilha, e tem ainde doci, mellifluozo, como
seu parente Frances e Italiano».
«O indo-portuguez é mais ou menos entendido por
todas as classes
na ilha de Ceylão e por toda a costa da India; a sua extrema
simplicidade
de construcção e facilidade de
acquisição tendo-o posto extensamente
em uso como um meio de trafico. Mas o povo de que é
vernaculo
e que, em Ceylão só, sobe a mais de 50:000
individuos, é constituido
por descendentes dos hollandezes e portuguezes, os primeiros
dominadores (europeus) da India.»
The Bible
of Every Land, pag. 275-276.
Damos em seguimento a nota bibliographica das
publicações em
dialecto portuguez de Ceylão ou relativas a elle, de que
até hoje tivemos
conhecimento; as que não possuimos e nem sequer vimos
vão indicadas
com o signal †.
Bautismo: sua subjectos e modo de sua
administração. Parte premeiro:
Tocando o bautismo de nocentes. Colombo: impressado
ne officia
de Missão Wesleyano. 1869, 44 pp, in-12.
Bom novas. N.º 15. March. 1869. p.
57-60. Colombo: printed at
the Wesleyan Mission Press. É um numero de um pequeno
periodico
religioso.
Cantigas por adoração publico em
lingoa portugueza de Ceylon. De
Robert Newstead, missionario wesleyano. Terceiro vez impressado.
Colombo
impressado ne officina Wesleyana. 1823. 8.º 22-4 pp. (de
index).
†
Compendium (A) of the Ceylon-portuguese
language by W. B.
Fox. Colombo. 1859.
Cruz (A) de Christo. Colombo:
Impressado ne officio de A. H. Peterson.
1859. 23 pp. A
Intrudição
acha-se subscripta por J. A. C. No
nosso exemplar acha-se o nome manuscripto por inteiro: John Arnold
Cristophelaz.
†
Dictionary (A) in the Singhalese,
Portuguese and
English languages.
[33]
Second edition, enlarged.
By W. B. Fox, Wesleyan Missionary.
(Publicado em 1820).
Fórma (A) da oração
publico e administração dos Sacramentos, conforme
ao uso da Igreja Inglaterra. Traduzido, por o missão, em
lingua
portuguez de Ceylon. Pelo Robert Newstead,
missionario Wesleyano.
Em Colombo: Impressado na officina Wesleyano. 1820. 44 pp.
†
Grammatical (A) Arrangement on the
method of
learning the corrupted
portuguese as spoken in India, by Berrenger. Sec.
edit. Colombo,
1811. Indicação do sig. Teza no artigo alludido
infra.
Horte de paraiso. Em o nome de o Jesus
crucificado. (XIV orações.)
Impressado ne Officio de Baptiste Missionarios, Kandy. 32 pp.
Hum caminho per inferno. Folha
avulsa, 1 p.
Hum catecismo per o ensino de criances ne o
principiô de relize, e
hum curto catecismo de o nomis ne o escritura.
Colombo: impressado ne
officio de Wesleyanos. 1837. 12 pp.
Indoportoghese. E. Teza. 8.º 10 pp.
Estratto dal Periodico:—Studi
Filologici, Storici e Bibliografici Il Propugnatore. Vol. V.
É o primeiro
estudo scientifico sobre este dialecto.
†
Instructions for children.
By the
late Rev. John Wesley, A. M.
of the University of Oxford. In portuguese and english.
(Publicado antes de 1820.)
Meditacãos e
oracãos (sic)
sober
differenti subjectos e por differenti
casiãos. J. Campbell, Printer, Hulfsdorp
Press. 50 pp. 4.º peq.
Novo (O) Testamento de Nosso Senhor e Salvador Jesus
Christo,
traduzido ne indo-portugueza. Colombo, officina de
Missão Wesleyano,
1852. 8.º
Oraçãos, Dez Mandamentos, O
sermão riba do montanha. 16 pp.
Psalterio (O), ou Psalmos de David, como apontado a
ler nas igrejas.
Traduzido em lingoa portugueza de Ceylon, e publicado por a Sociedade
Biblia de Colombo. A Colombo: Impressado na officina
Wesleyano.
1821. 8.º 102 pp.
The singhalese Tract Society, n.º
6, 1856.
O Serpente de Cobre.
8 pp. No fim acha-se a indicação:
Preço hum challi de-cobri, huma ou
senao oito fanam hum cento.
Voz de verdade. (Pequeno periodico
religioso mensal; temos alguns
numeros desde 1 de outubro de 1870, em que começou a
publicar-se,
até janeiro de 1873. Sem logar de impressão.) 4
pp. cada
numero.
Vocabulary (A) in the Ceylon Portuguese, and English
Languages,
with a series of Familiar Phrases. By John Callaway,
Wesleyan Missionary.
Colombo: Printed at the Wesleyan Mission Press. 1820. Price
six fanams. 44 pp. in 12.º
A maior parte das publicações mencionadas que
possuimos devemol-as
á dedicação do nosso bom amigo o rev.
R. H. Moreton, que se
empenhou para com a missão Wesleyana e missionarios seus
amigos
para nol-as obter.
Na obra:
The Bible of Every Land, a history of the
Sacred Scriptures
in every language and dialect into which translations have been
made, etc. London, Samuel Bagster and Sons. 4.º, p.
275-276, achâmos
[34]
as seguintes noticias com relação
ás traducções do Antigo e Novo
Testamento em indo-portuguez.
«Com o declinar dos governos portuguez e hollandez na India,
os
membros d'estas nações foram deixados sem meios
de instrucção religiosa
excepto os que offereciam os missionarios catholicos romanos; e
em consequencia, o catholicismo romano tornou-se a fórma
prevalecente
da sua religião. Em 1817, Mr. Newstead, missionario
wesleyano, que
residia em Negombo, em Ceylão, começou uma
traducção do Novo Testamento
para beneficio espiritual d'este povo. Partes d'esta
traducção
foram lidas por Mr. Newstead do pulpito, e foram tambem emprestadas
livremente a pessoas doentes, uma das quaes, diz-se, morreu com
o evangelho de S. João debaixo do travesseiro. O povo
mostrou tanto
interesse pela obra, que uma edição impressa foi
em breve resolvida, e,
em 1819, a versão do evangelho de S. Matheus foi publicada
em Ceylão,
á custa da Sociedade biblica auxiliar de Colombo; e os
psalmos
seguiram-se, em 1821, á custa da mesma sociedade.
«Pouco depois Mr. Newstead completou a sua
traducção do Novo
Testamento, e a obra foi submettida a uma miuda revisão por
uma commissão
nomeada para esse fim, consistindo de tres missionarios e de
seis dos mais intelligentes indo-portuguezes. A revisão foi
terminada
em 1824; e Mr. Newstead emprehendeu uma viagem a Inglaterra para
sollicitar o auxilio da Sociedade biblica ingleza e estrangeira para a
publicação
da obra. A traducção foi recommendada com
instancia á adopção
da commissão pelo rev. T. J. Twisleton, archidiacono de
Ceylão;
e, como o seu valor foi attestado por outros juizes competentes, duas
edições foram impressas em Londres, a expensas da
sociedade, em
1826, sob a superintendencia pessoal de Mr. Newstead. A segunda
edição do Novo Testamento, consistindo de 5:000
exemplares, appareceu
em Colombo em 1831; e, no anno seguinte, uma versão dos
livros do Genesis, Exodo, e parte do Levitico foi publicada no mesmo
logar, a expensas da mesma sociedade. O Pentateucho e o Psalterio
foram impressos em Colombo, em 1833, n'uma edição
de 5:000 exemplares;
annuncia-se como estando em progresso a traducção
de todo
o Antigo Testamento.
«Uma outra edição do Novo Testamento
indo-portuguez foi mais
recentemente emprehendida, e projectou-se no começo
imprimil-a em
Londres, sob a inspecção de Mr. Newstead, o
traductor, e á custa da
Sociedade biblica ingleza e estrangeira. Mas Mr. Newstead, depois de
muitos annos de ausencia de Ceylão, não sentiu
sufficiente confiança
no seu conhecimento da lingua para fazer imprimir o Novo Testamento;
e em consequencia d'isso resolveu-se imprimir só o evangelho
de S. Matheus
em Londres, para fim provisorio, emquanto a impressão da
obra
inteira seria confiada a missionarios residentes em Ceylão,
com a vista
de a imprimir na imprensa da missão n'aquella ilha. O
evangelho de
S. Matheus foi acabado em 1852, sob a superintendencia de Mr.
Newtead.
Deram-se ao mesmo tempo instrucções para a
impressão em Colombo
de 2:000 exemplares do Testamento inteiro, á custa da
Sociedade
biblica ingleza e estrangeira. Esta edição foi
completada em 1853, sob
o cuidado de uma commissão de revisão escolhida
para esse fim.»
Eis um specimen do dialecto:
[35]
O sermão riba do Montanha
Ne Evangelho de São Matheus
E Jesus olhando o multidãos (de gentes) ja foi riba de hum
montanha,
e elle quando ja santa sua disçipulos ja chegar perto per
elle.
2 E Jesus ja abri sua boca, e ja ensina per elotros fallando.
3 Bendito
tem os pobres ne
espirito, porque per elotros tem o reyno
de ceo.
4 Bendito
tem elotros quem
tem tristes, porque elotros lo ser consolados.
5 Bendito
tem elotros quem
tem paçiente ne coraçaõ (humildes),
porque elotros lo herida o terra.
6 Bendito
tem elotros quem
te senti fome e securo por justiça, porque
elotros lo ser enchido, (per elotros lo tem baste).
7 Bendito
tem o gentes
misericordioso, porque elotros lo acha (reçebe)
misericordia.
8 Bendito
tem os limpos ne
coraçaõ, porque elotros lo olha per
Deus.
9 Bendito
tem o gentes
quem te faze paz, porque elotros lo ser
chomado filhos filhas de Deos.
10 Bendito
tem elotros
quem te suffri (padeçe) per o causo de justiça:
porque per elotros tem o reyno de ceo.
11 Bendito tem vosoutros quando
gentes te engeita per vosoutros,
e perseguir
per vosoutros, e te
falla toquando de vosoutros, tudos sortes
de mal, falsamente, sem rezaõ por o causo de mi.
12 Allegré com muito grande allegria, porque
vossas paga ne ceo
tem grande, porque assi (mesmo modo)
elotros ja perseguir per os prophetas,
quem tinhe antes (mais diante) vosoutros.
13 ¶ Vosoutros tem o sal de terra, mas si o sal ja
perdi aquel so
sabor, acquel com que lo ser salgado? aquel despois nunca
valé nada,
senaõ per fica pinchado fora, e per fica massado baixo de
pes de gente
14 Vosoutros tem o lume de o mundo, hum cidade que tem riba
de um montanho non pode ser escundido.
15 Nem gentes nunca sandé hum candecera e
(despois) aquel bota
baixo de hum medida, mas riba hum candeler, e aquel te da lumi per
tudos (pessaõs) quem tem ne caza.
16 Vossas lumi desse luzi diante de gentes, que vossas bom
fazeres
elotros pode olha, e glarifica per vossas Pai quem tem ne ceo.
17 ¶ Naõ lembra que eu ja vi per destrui
o lei ou o prophetas, eu
nunca vi per destrui, mas per guarda (per faze) aquel lei.
18 Em verdade eu te falla per vosoutros, (que) ate que ceo e
terra
lo ser passado, nehum palavra, nehum lettra de o lei nada ser passado,
ate que tudo lo ser cabado.
[36]
19 Videaquel, quem seja lo quebra uma de istes mais piquinino
manedmentos e assi lo ensina por gentes,
(per faze) el lo ser chomado
o mais piquinino ne o reyno de ceo; mas, quem seja lo faze e lo ensina
istes mandamentos, aquel mesmo pessaõ lo ser chomado grande
ne
o reyno de ceo.
20 Porque eu te falla por vosoutros, doque
o
justiça de os escribos
e (de os) phariseos, si vossa justiça non ten mais grande,
vosoutro si
nem hum modo nada entra ne o reyno de ceo.
21 ¶ Vosoutros ja ovi que tinhe fallado de elotros de tempo
antigo,
(velho tempo) vos nada mata, e quem seja te mata, lo ser ne perigo de
o juizo.
22 Mas Eu te falla per vosoutros, que quem seja com sua
irmaõ
tem raibe sem rezão, lo ser ne perigo de o juizo, e quem
seja per sua
irmaõ lo falla, Raca, (vil pessaõ,) lo ser ne
perigo de o supremo counselho,
e quem seja que lo falla vos dodo, lo ser ne perigo de o fogo de
inferno.
23 Videaquel, si vos te trize vossa sagoate per o altar, e
ali te
cahi ne sentido que vossa irmaõ tem alun cousa contra vos.
24 Ali guarda vossa sagoate diante o altar, e anda vos,
primeiro
com vossa irmaõ fica bom amizade, e depois de aquel, vi, e
offerçe (da)
vossa sagoate.
25 Accorda com vossa enimigo prestamente que hora vos tem ne
o
caminho com elle, ou senaõ ne alum tempo, o enimigo pode
entrega
per vos per julgador, e o julgador te entrega per vos per sapier, e vos
te fica lançado ne prisão.
26 Em verdade Eu te falla per vos, que vos nem hum modo nada
vi fora (de aquel lugar) ate que vos ja paga o trazeiro padas de
dinheiro.
27 Vosoutros ja ovi que tinhe fallado, de elotros de tempo
antigo
vos nada faze adulterio.
28 Mas, per vosoutros Eu te falla Que quem seja com impuro deseijo
te olha sobre hum mulher, ja faze adulterio com ella ne sua
coração.
29 E si vossa olha dreito te offende par vos (tem um
cassião per
vos per offende) ranca aquel, e pincha fora de vos, porque tem mais
bom per vos que uma de vossas olhos te fica destruido, e não
que vossa
enteiro corpo lo ser lançado ne inferno.
30 E si vossa maõ dreito (mesmo modo) te offende
per vos, corta
aquel, e lança fora de vos, porque doque vossa inteiro corpo
per fica
lançado ne inferno, tem mais bom que uma de vossa
mãos te fica destruido.
31 Tinhe fallado que quemseja lo reda (bote fora) sua mulher,
elle
miste da per ella hum carta de seperaçaõ.
32 Mas eu te falla per vosoutros que quem seja lo reda sua
mulher
senaõ (forde) per rezaõ de
fornicaçaõ, ella te causo per faze adultero,
e quem seja lo caza com aquel mulher, (tambem) te faze adulterio.
33. Torna, vosoutros ja ovi que tinhe fallado de elotros de tempo
antigo, vos ne mista da falsa juramento, mas miste paga per o Senhor
vossa permita:
[37]
34 Mas Eu te falla per vosoutros, que enteiromente ne miste
jura
nem pelo ceo porque aquel tem o throno de Deus.
35 Nem pelo o terra porque aquel tem o estrado de sua pes:
nem
pelo Jerusalem porque aquel tem o cidade de o grande Rey.
36 Nem pelo vossa cabeça porque vos nonpode faze
branco ou
preto hum cabello.
37 Mas vossas cõmmunicaçaõ
desse fica sem, sem naõ, naõ, porque
doque iste que seja tem mais, te vi de mal.
38 ¶ Vosoutros ja ovi que tinhe fallado,
hum olho por hum olho,
e hum dente por hum dente.
39 Mas Eu te falla per vosoutros que vosoutros ne miste dessa
mal:
mas quem seja quando buftea per vos ne façe dreito; vira per
elle o
outra tambem.
40 E si alum homi lo çita per vos ne hum corte de
justiça, e tira
vossa cabai, elle desse toma vossa mantle tambem.
41 E quem seja lo força par vos per anda hum
leagou, anda com
elle dous leagous.
42 Da per elle quem te pedie com vos, e ne miste vira de elle
quem
lo toma per deuda de vos.
43 Vosoutros ja ovi que tinhe fallado, vos miste ama per
vossa vizinho,
e abhoreçe per vossa enimigo.
44 Mas Eu te falla per vosoutros. Ama por vossas enimigos,
benze
per elotros quem te maldiçoa per vosoutros, faze bom per
elotros quem
te abhoreçe por vosoutros, e roga (com Deos) por elotros,
quem te faze
mal, e te perseguir per vosoutros.
45 Que vosoutros pode fica o filhos filhas de vossas Pai quem
tem
ne ceo, porque elle te faze o Sol por luze sobre o maldito gentes, e
sobre
o bom gentes, e te manda chuve sobre os justos, e (tambem) os
injustos.
46 Porque si vosoutros te ama per elotros, quem per vosoutros
te
ama, vossas meriçementos que tem? O
maldito gentes o mesmo te
faze.
47 E si vosoutros per vossas irmaõs namais te
mostra bondade,
vosoutros que te faze mais doque outros? O maldito gentes o mesmo
te faze.
48 Videaquel, seja vosoutros perfeito, ate assi como vossas
Pai quem
tem ne ceo, tem perfeito.
Capitulo
VI
Toma cuidade que vosoutros nunca faze caridade, (da ismolas,)
diante de gentes per fica olhado de elotros; ou senaõ
vosoutros nunca
recebe nem um paga de vossas Pai quem tem ne ceo.
2 Videaquel, vos quando te da ismolas, ne miste son
hum trombetta
diante de vos, (per da sabe vos que te faze) assi como os hypocritas
te faze, ne os synagogas, e ne os ruas que elotros pode acha
honra de gentes; Em verdade, eu te falla per vosoutros, (Que) elotros
te acha elotros su paga.
3 Mas vos quando te da ismolas, vossa maõ escarde
naõ desse sabe,
vossa maõ dreito que te faze.
[38]
4 Que vossas ismolas pode ser ne segrade, e vossa Pai, quem ne
segrade te olha, sua mesmo ne publico lo paga per vos.
5 ¶ (E tambem) vos quando te ora (te roga com Deus)
ne miste
fica mesmo per os hypocritas porque elotros te dizer per ora ne os
synagogas,
e cantos de ruas, que elotros pode ser olhado de gente. Em verdade
eu te falla per vosoutros que elotros te reçebe elotros su
paga.
6 Mas vos, quando vos te ora, entra ne vossa cambre, e quando
vos ja ficha porta, ora com vossa Pai quem tem ne segrade e elle quem
te olha ne segrade ne publico lo paga par vos.
7 Mas vos outros quando te ora, naõ usa vaõ
palavras, assi como
os gentios te faze, porque elotros te lembra que elotros lo tem ovido
per rezaõ de elotros su muito palavras.
8 Videaquel vosoutros ne miste fica mesmo per elotros, porque vossas
Pai (celestial) enteiromente te sabe vosoutros que cousas te mista
ansque vosoutros te pedie de elle.
9 Videaquel, ne iste modo vosoutros miste roga. Pai nossa quem
tem ne ceo, sentificado seja tua nome.
10 Venho o tua reyno, seja feito a tua vontade asis ne terra como
ne ceo.
11 O paõ nossa de cada dia nos da hoje,
12 E perdoa nos nossas dividas, assi como nos te perdoa per nossos
dividores.
13 E nos naõ desse cahi ne tentaçaõ,
mas livra nos de mal, porque
teu tem o reyno e o poder, e o gloria, pera tudo sempre, Amen.
14 Porque, si vosoutros te perdoa per gente elotros su
offenças,
vossas Pai celestial tambem lo perdoa per vosoutros.
15 Mas si vosoutros per gente nunca perdoa elotros su
offenças,
vossas Pai celestial tambem nada perdoa (per vosoutros) vossas
offenças.
16 ¶ Torna, vosoutros quando te jingua,
noõ fica mesmo per o
hypocritas, com hum rosto de tristeza, porque elotros te faze feu
elotros
su rostas, que pode parçe per gente que elotros te jingua.
Em
verdade eu te falla per vosoutros (que) elotros te reçebe
elotros su
paga.
17 Mas vos, quando vos te jingua, onta (com azete) vossa
cabeça
e lava vossa rosta.
18 Que per gente naõ pode parçe que vos te
jingua, mas per vossas
Pai, quem ne segrade te olha, e vossas Pai quem ne segrade te
olha, ne publico lo paga par vos.
19 ¶ Vosoutros nemiste junta thesouros (riquezas) ne
o terra, onde
pouches e forea te dana, e onde ladraõs te entra e te furta.
20 Mas junta per vossa mesmos, thesouros ne ceo, onde nem pouche
nem forea nunca dana, e onde ladraõs nunca entra e furta.
21 Porque vossas thêsouro onde tem, ne aquel lugar tambem
vossas
coraçaõs lo fica.
23 O lumi de o corpo tem o olho, videaquel si vossa olho tem puro
(sinçero,) vossa inteiro corpo lo tem enchido de lumi.
23 Mas si vossa olho tem mal, vossa inteiro corpo lo tem enchido
de escuridade, videaquel si o lumi que tem dentro de vos tem escuridade
que grande tem aquel escuridade!
24 ¶ Nem hum homi nonpode servi per dous Senhors,
porque elle
[39]
lo abhoreçe per huma, e por outra hum lo ama, ou
senaõ, elle lo tem
firme per huma, e por outra hum lo disimporta, vosoutros nonpode
servi per Deos, e tambem per Mammon (ou requezas).
25 Videaquel Eu te falla por vosoutros naõ toma
nem hum cuidade
toquando de vossas vida, vosoutros que lo comer, ou vosoutros que lo
bebe, nem toquando de vossas corpo, vosoutros com que lo tem vestido,
doque comer, nontem o vida de valia mais grande, e (tambem,) o corpo
do que vestidos?
26 Olha os pastros de ar! porque aquelles nunca bruffa, nem
nunca
faze novidade, nem nunca junta ne celleiros, ainda, vossas Pai
celestial
te sustenta per aquelles, (e) doque aquelles nontem vosoutros muito
mais bom?
27 Com muito lembranças quem de vosoutros pode
faze sua mesmo
hum covido mais alto?
28 E porque vosoutros te cuida toquando vestidos? considera
os
fules de o campo, (varze,) aquelles ne que modo te
cresçenta, aquelles
nunca servi, nem nunca travai.
29 E ainda, Eu te falla per vosoutros, que ate
Salomão ne tudo
sua gloria (grandeza) non tinhe vestido assi (bunito) como
huma de
istes (fules).
30 Videaquel si Deos assi te vesti os fules de o campo, que
hoje
te fica, e amiam tem lançado ne forno (ou fogo,) Nontem sua
vontade
muito mais pera vesti per vosoutros? O vosoutros de bem pouco fe!
31 Videaquel, non toma cuidade fallando, nos que lo
comer, ou nos
que lo bebe? ou nos com que lo tem vestido?
32 (Porque tudo de istes cousas os Gentios te busca,) porque
vossas
Pai celestial (bemfeito) te sabe que vosoutros tem necessidade de
istes cousas.
33 Mas, primeiro vosoutros miste busca o reyno de Deos, e sua
justiça e (aquelhora) tudo de istes cousas per vosoutras lo
ser dado.
34 Videaquel naõ toma nem hum cuidade toquando de
amiam, porque
o amiam lo toma cuidade toquando os cousas que per aquel te compete.
Per cada hum dia o mal tem baste, que te compete per aquel dia.
Capitulo
VII
Nao julga, que vosoutros nunca ser julgado.
2 Porque com que julgaçaõ vosoutros te
julga (per gente) vosoutros
(tambem,) lo ser julgado (de Deos,) e com que medida vosoutros te
medi, aquel mesmo per vosoutros lo ser medido torna.
3 E porque vos te olha o mote (piquinino erro) que tem ne
olho
de vossa irmão, e nunca considera a grande
faltançe que tem ne vossa
mesmo olho?
4 Ou quely vos lo falla per vossa irmaõ, Eu desse
tira o mote fora
de vossa olho; e Olha! hum grande faltançe tem ne vossa
mesmo olho?
5 Vos hypocrita! primeiro, fora de vossa mesmo olho, pincha
aquel
grande faltançe e aquelhora, mais claromente vos lo olha per
tira o mote
fora de vossa irmão su olho:
6 ¶ Aquel que tem santo, naõ da per os
cachors nem pincha vossas
[40]
aljoffries diante os porcas, ou senão (istes bom
cousas) aquelles
(porcas e cachors) lo massa baixo de pe; e torna lo vira, e lo rompa
per vosoutros.
7 Pedie (com Deos) e aquel lo ser dado per vosoutros, busca,
e vosoutros
lo asserta, bate, (per o porta de misericordia,) e per vosoutros
aquel lo ser aberto.
8 Porque cada hum pessaõ quem te pedie (ne dreito
modo,) te recebe,
e elle quem te busca, te asserta, e per elle quem te bate o porta
lo ser aberto.
9 Ou, entre de vosoutros, qui homi tem, quem per sua filho lo
da
hum pedra, elle quando te pedie pão?
10 Ou, si elle te pedie hum peixe, elle lo da hum serpente.
11 Antos, si vosoutros, tendo mal, te sabe perda per vossas
filhos
bom cousas, que tanto mais vossas Pai quem tem ne ceo lo da bom
cousas per elotros quem te pedie de elle.
12 Videaquel tudos cousas que seja que vosoutros te querre
que
gente per vosoutros miste faze, o mesmo (cousas,) vosoutros miste faze
per elotros, porque iste tem (o mandemento,) de o lei, e de o
prophetas.
13 ¶ Entra vosoutros ne o porta estreito, porque
largo tem o porta,
e largo tem o caminho que te leva per destruição,
e bastantos tem quem
ne aquel te alcança.
14 Videque estreito tem o porta, e estreito o caminho que te
leva
per vida, e poucos namais, aquel te asserta.
15 Toma cuidade de falso prophetas, quem per vosoutros te vi,
ne
vestidos de ovelhas (de enganho,) mas dentro, elotrem tem bem maldito.
16 Vosoutros lo conheçe per elotros, de elotros su
frute, gente te
panha ouves de espinhos? ou bom fruite de mal albris?
17 Ate assi, cada hum bom albri te produçe bom
fruite, mas hum
mal albri mal fruite nenhum mal albri nonpode produçe fruite
bom.
18 Hum bom albri non pode produçe mal fruite, nem,
hum albri
corrupto non pode produçe bom fruite.
19 Cada hum albri, que nunca produçe bom fruite
tem cortado e
pinchado ne o fogo.
20 Videaquel de elotros su fruite, vosoutros lo conhece per
elotros.
21 Naõ cada um pessaõ quem par me te
falla Senhor! Senhor!
nada entra ne o reyno de ceo, mas elle (namais,) quem te faze o vontade
de meu Pai quem tem ne ceo.
22 Bastanto (pessaõs) lo falla par mi, ne aquel
dia (de julgaçaõ,)
Senhor, Senhor, nos nunca prophecia ne tua nome? e ne tua nome ja
lança fora diabos? e ne tua nome ja faze bastantos obras
espantoso?
23 E aquelhora, per elotros Eu lo declara, Eu nem hum tempo
nunca conheçe, per vosoutros, sahi de mi, vosoutros quem te
faze iniquidade!
24 ¶ Videaquel, quem seja te ovi istes meu ensinos,
e aquelles te
faze, Eu lo papia de elle assi como de hum homi sizo, quem je concerta
sua caza riba de hum rocha (muito grande e força pedra).
25 E o chuve ja cahi, e os aguas, ja vi e os ventos ja abala,
e ja
bate sobre aquel caza, e aquel nunca cahi, per o causo que aquel tinhe
fundado riba de um rocha.
[41]
26 E cada hum pessaõ quem te ovi istes meu ensinos
e aquelles
nunca faze, toquanto de elle eu lo papia assi como hum homi
dodiçe,
quem sua caza ja concerta riba do area.
27 E o chuve ja cahi, e os aguas ja vi, e os ventos ja abala,
e ja
bate sobre aquel caza, e aquel ja cahi e grande tinhe o ruido de aquel.
28 E aquel ja vi per suste, Jesus quando ja caba istes
ensinos,
que os gentes tinhe espantado com sua doutrino.
29 Porque Jesus ja ensina per elotros assi como huma quem
tinhe
com authoridade (poder) e não assi como os escribos.
7. O dialecto portuguez de Malaca
John Cameron, que viajou na India ha vinte e tantos annos, descrevendo
na sua obra
Our tropical possessions in Malayan
India (London,
1865, pag. 374
[5])
os descendentes dos portuguezes estabelecidos em
Malaca, os quaes são uma raça mixta de
portuguezes e indigenas, nota
que durante um periodo de cerca de dois seculos elles têem
conservado
a sua lingua original e continuam a fallar uma especie de portuguez
corrupto (
broken portuguese); que
elles são grandes musicos, que são
muito prolificos, e que ao caír da tarde os homens casados
se assentam
nas varandas de suas casas dando para a rua, tocando geralmente no
violino alguma melancholica melodia para divertimento de suas mulheres
e familias que estão reunidas em roda d'elles.
8. Dialecto macaista
D'este só conhecemos o que nos ministram as duas cartas que
reproduzimos; a primeira foi publicada em 1865 no
Ta-Ssi-Yang-Kuo,
jornal de Macau, e reproduzida na
Gazeta de
Portugal; a segunda te-mol-a
n'uma folha avulsa, tiragem á parte de um jornal
provavelmente
o mesmo
Ta-Ssi-Yang-Kuo. As cartas
foram forjadas por quem conhecia
a lingua litteraria; um documento verdadeiramente popular falta-nos
infelizmente.
Não ha n'esse dialecto distincção de
generos; o
P. S. da primeira
carta indica que a influencia do jornalismo ía introduzindo
as fórmas,
da lingua mãe.
O plural é expresso pela repetição da
palavra:
china china, os chinas;
criança
criança, crianças;
sium sium, senhores;
amigo amigo, amigos.
As fórmas verbaes estão reduzidas a uma, que
é o infinito geralmente,
ou uma fórma do presente, a qual póde ser
empregada como
infinito; assim
calote de vae
pescar, tolice de ir pescar;
hora de
vem,
hora de vir;
pôde tem,
póde ter. A mesma fórma serve para todas as
pessoas.
O
r do infinito foi apocopado
excepto no verbo
ser:
tirá, tirar;
mandá,
mandar;
fazê, fazer;
coré, correr;
subí, subir.
[42]
O presente é expresso: 1) pelo infinito:
vosso tio gostá, vosso
tio
gosta; 2) por uma fórma do presente:
china
sam tolo, o china é tolo;
3) por
tá
(está) com o infinito:
tá
fazê, faço, fazes, faz, etc.,
tá andá,
ando etc.,
tá
fallá, fallo, etc.; 4) por
tá (está) com
a fórma do presente
que toma o logar do infinito:
tá
vai, vou vae, etc.
O futuro é expresso por
logo com o infinito:
logo ficá,
ficará; mas
n'alguns casos esse processo serve para exprimir o presente.
O passado é expresso: 1) pela formula fundamental:
augmentá,
augmentou; 2) por
já com
a fórma fundamental:
já
principiá, principiou;
mas este processo parece tambem exprimir o presente.
Conservam-se os participios passivos:
impurado,
costumado, etc.
Notem-se, entre outras, as seguintes fórmas:
mestê, ser preciso, de
ver;
promódi, por amor
de, porque;
pastro, passaro;
assilai, tal.
Carta de Siára Pancha a Nhim
Miquela
Macáo 3 de
janero de
1865.
«Minha querida
Miquéla.
Tanto tempo eu já querê respondê vosso
carta, mas sempre sentî
doente, porisso tanto tardá este resposta. Vôs
minha Miquéla nadi ficá
reva cô eu; vôs sabe qui eu mutu querê
pra vôs, e se nunca escrevê
mas ásinha san prómódi já
tá múto véla. Otro dia acun-ha mofina
di
ama abri janella, eu irguí cedo, sai fóra,
apanhã vento, ficá constipada.
Priméro toma sincap, misinha de vento, raspá
mordicim, mas nunca
pôde ficá bom, cada dia sintí corpo
más fraco, perna azedo. Dôtôr
falá
sam doença d'idade, mas eu nunca sintí assim,
chomá mêstre Ahoi, qui
tudu gente falá sam capaz, elle já
curá. Agora sentí um poco forte,
mas mêstre nômquêro que eu fazê
mutu força, e mandá tomá ninho di
pastro.
Nosso Macáo, minha Miquéla tem grande novidade.
Governo nôvo
sam capaz e já virá tudo. Mas um pôco
tempo tudo lôgo ficá virado.
Rua agora já nomtêm pedra pedra, sam otro lai
môdo, fazê duro cô
téra. Fazê gosto olá di bonito. Pra
vanda de mar, na praia grandi, já
botá qui tanto arvi; tudo gente cioso e intrimittido
falá numpresta, qui
sabe qui foi, mas eu nunca sintí assim. Campo de Sam
Francisco já
fichá, fazê jardim, escada grande já
nomtêm, fazê ali muro; ali riba,
aquelle calvario tamêm tá vai iá pra
fazê quartel di soldado, qui já
principiá, logo ficá grandi. Porta di Campo e di
Santo Antone já nomtêm
tamêm, agora sam rua largu, tudo aquelle arvi fronte di
Gularte
sua casa já cortá, china china falá
corê sangui, mas eu sentí china sam
tôlo. Aquelle porcaria di fonti perto di cano real
tamêm já tapá, abri
poço alá vanda. Tudu poço agora tem
sua cobertor bem fêto, e bomba
di novo invençám.
Si minha Miquéla agora pôde
ólá tudo aquelle lugar, certo nadi crê
qui sam Macáo.
Santo Antone qui bem fêto! Aquelle bariga di adro
já vai dentro,
ficá bonito, e rua mas um pôco grandi. Padri nunca
contente, mas qui
cuza logo fazê! A nôte já
nômtem aquelle escuridám costumado, hoze
[43]
candía tem tres bico, e china china si querê
furtá azète vai cartá mati.
Genti di Senado sempre durmido, nomtêm aquelle genio di
Governo,
que tem ôlo vivo, e nadi iscapá nada.
Cêdo, cêdo, já tem na rua,
tirá
telhêro di botica, rancá pagôde di porta
di china china, cortá rua fazê
drêto, qui fazê gosto ólá.
Otro dia Voluntario inglez d'Hongkong já vem
Macáo! Qui lai di
bonito! eu já vai ólá tamêm.
Macáo parêce França, tudo gente
fallá.
Tem tifin, rivista di tropa, salva di vinte un-ha tiro, balsa
á note qui
bonito, gastá cô tudo aquelle flamancia tres mil
fóra pataca. Algum
gente qui nunca gostá assilai cuza, já vai
ólá cova de Sam Francisco
Xavier eu tamêm muto quere pra santo, mas nunca vai.
Agora tá gavartá Sam Paulo; achá un-ha
buracu na Monte, ôtro
na frontipicio di igreja e gente antigo fallá sam caminho di
basso di
téra qui vai di igreja pra fortaleza na tempo de paulista,
porisso agora
gavartá tudo aquelle mato, pra descobri caminho. Tudu gente
fallá ali
tem tanto pataca qui jisuita interá, eu achá
graça: pôde crê? Padri
padri qui cusa pôde tem? coitado! Eu sintí sam
historia. Mesmo caminho,
qui sabe? Elôtro qui cuza fazê cô caminho
basso di téra? Elôtro
nunca sam heregi como pedrêro livre, qui cusa fazê
di lugar pra
escondê?
Minha Miquéla nomêstê esquecê
di
mandá nova di tudu qui ólá ali;
si marido tem vagar mandá tamêm escrevê.
Gente tá fallá qui moda
di balám já cavá pra nhonhonha, eu
sintí qui si sam assim sam fortuna.
Eu tamêm nompôde gostá di assilai cusa;
quando vento grandi
sam mutu pirigoso, e quando incustá na janéla, ou
ficá capido, impurado
pra traz, frôvê sangui ólá.
Dá bença pra criança
criança e nomêstê esquecê de
tudu aquelle
receta qui eu já mandá quando apanhá
saván. Nomêstê lembrá sam
brinco, eu fallá cô experiencia: tudu gente ri,
qui foi eu pilá costa a
note intêro, mas eu inda tá vivo, elôtro
tudu qui fazê cusa de moda tá
morê mas ásinha.
Eu já mandá dos amchôm di achar di
gamên, un-ha balsa di sucri
pedra, dos jara di jagra para vós e criança
criança, mas nunca achá
resposta, porisso eu ficá cô
pençám.
Já intrá anno novo; mutu bom anno, filicidade,
vida, saude para
vôs, vosso marido e tudo criança
criança. Nosso senhôr deçá
criá. Eu
tá muto lembrá pra vós,
querê mandá um pôco de alúa
mas nômpôde,
paciencia. Masqui nompôde acetá bom
vontade d'este vella chacha qui
mutu querê pra vôs.
Dá lembrança pra Pepe, falá
cô elle
múto contente eu já ficá, ouvi
falá, elle já ficá bom de
espinhéla.
Vosso tio padri tamêm mandá lembrança,
elle coitado nunca sam nada já. Nhum Quimquim já
vai viazi,
imbarcá de piloto na navio que levá chuchai,
ganhá tanto pataca.
Vosso chacha
Pancha.
P. S.—Vós lôgo sintí grandi
differença na minha modo di escrevê.
Eu já aperfeçoá bastante neste um
pôco tempo. Tudu este escóla novo
de machu e femia, e aquelle gazetta
Ta-ssi-yang-kuo já
fazê indretá
bastante nosso lingu.
[44]
Carta de tia Paschoela á sua sobrinha
Florencia
Macáo, 5 de otubro de
1869.
Minha Querida Chencha.
Como vôs lôgo querê sabe tudo novidade de
Macáo, porisso que eu
já pedi com tudo sium sium, parecero de jogo, pra
trazê tudo novidade
de fóra pra eu pôde escrevê pra
vôs.
Macáo agora já tá muto mudado;
já nontêm inveja de Éropa. Pra
tudo rua são careta, são cavalo; de tanto que
já tem, que já nontêm
lugar pra guardá; maior parte ficá pinchado na
meu de rua de S. Lorenço.
Agora tá fazè ung-a casa qui lai de grande na
horta de governador,
tamem pra guardá careta e cavalo. Olá um
pôco, minha Chencha,
fazê palacio na cidade pra cavalo, tudo pobre pobre vae
pará pra
casinha de campo!
Agora tá com força de prepará pra
recebe principe de Inglaterra.
Já pedi com sium Carlito pra dá moda pra
fazê ung-a cadera pra cartá
principe. Querê cadera que tem quatro pinga pra oito cule;
mas como
vosso tio gostá muto de figurá, já
lembrá de pedí pra convidá oito
comendador
pra cartá aquelle bemaventurado principe, pra vosso tio
tamem
pôde entrá na meu.
Nosso governador lôgo vae ficá na casa vasio de
sium Lorenço pra
dá palacio pra principe.
Nosso juiz tá perto vae já pra Goa. Coitado de
vêlo, já soffrê ung-a
molestia bem de grande que escapá morê. Agora
tá andá côtê; assim
mesmo este um pôco de farizêo nunca
perdoá de desesperá aquelle pobre
vêlo, que se nunca são cuidado de Padre Maximo,
com sua misinha
cazera, já vae já pra otro mundo!
Já cavá lua de batê páu, mas
lua de batê costa de china china inda
nompôde cavá, porisso que este um pôco
desabrogunhado rabo de porco
cada vez tá mas atrevido.
Otro dia eu já assistí festa de Senhora Rozario.
Sentí na greza
ung-a chêro bem desagradavel. Vem casa a note, tá
contá com tio João,
elle então que dá conta, que já
levantá um pôco alto parte trazero de
capela-môr; já fazê ali ung-a lugar pra
botá imundicia. Quando vem
chua, tudo agu de aquelle porcaria porcaria, contaminá pra
pê de parede,
vem pra dentro de capela-môr. Vôs inda
lôgo ovi, minha Chencha,
que algum dia inda lôgo mudá tudo cavalo de
policia pra dentro
de greza, pra tem mas cham pra fazê palacio grande grande pra
official.
Agora já nunca contentá cada ung-a com dos cela.
Cada official
querê sete cela, qui lai môdo pôde
chegá?
Padre Rondina já livrá de ung-a
desgraça qui lai de grande! Que
sabe qualo mapeçoso aquelle que já vae
tirá de sua lugar ung-a botle
de enxarope, bota ung-a botle de verniz. Coitado de padre, sem sabe
de nada, virá muto socegado na sua botle pra copo de agu;
quando
bebê primero pucado, então que sentí
que
são verniz! Nunçám obra
de maliçombrado! querê vernizá tripa de
gente como vernizá cadera,
canapé?!
Vosso tio tá muto triste. Este anno já
perdê quanto mil pataca com
[45]
laia laia de condenação de historia. Se o menos
pôde tem agora grande
negocio de cule, tamem são bom; pôde chubi um
pochinho de aqui,
um pochinho de ali, discontá o que já
perdê. Jogo este anno já nompôde
tirá muto. Dispeza cada vez mas grande. Familia
augmentá. Divida
nompôde cobrá; maior parte são gente
grande grande que tá devê.
Assim mesmo, minha Querida Chencha, inda nompôde
quexá de falta
que comê; perna de presunto que china china mandá
de presente, armado
de ung-a ponta pra otro ponta de cusinha; mas vosso tio
nompôde
comê ôtro cusa mas que pece fino,
chilimeçô de casa algum vez
lamci di Cantão.
N'otro tempo pescaria são na agu salgado; agora
são na agu doce.
Que sabe qualo bragero aquelle que já inventá que
na Praia Grande
tem pescaria de pece pedra, aquelle rapaz de botica de Neves
já cae
na calote de vae pescá anote fronte de sua botica.
Pinchá linha cae na
sêco; em quanto tá safá linha, senti
comedura; quando puça, apanhá
ung-a casta de susto qui laia de grande! era que são ung-a
cuzaçuso
de rato, como ung-a letão, ganchado na anzol. Aquelle
tentação de animal
principiá côrê pra tudo Praia Grande com
linha na boca, e pobre
de rapaz a côrê traz de tal rato pra
salvá sua linha; de sorte que já
fazê ri tudo aquelle gente na Praia Grande com tal pescaria
de pece
pedra, que ramatá, largá sarangong.
Manjor Julio já tem quanto mez já de morto.
Aquelle tolo de Boletim
parte que dá peza sua viuva, vae dá pra tudo sua
amigo amigo.
Que sabe se na Éropa são costumado assim?
Tudo vez que eu sae na janella intopá com ung-a official de
vapor
que casta de-chistoso, mas historero, sevandizio que más
nompôde ser.
Tem ung-a nome que laia de galante; eu já nompôde
lembra se são
Homecaco o Monocaco, mas são ung-a cusa assim de caco.
Máu genio,
lingustero, intremetido, até querê
intremetê com emprego de sium Miguel
Simões, e tá fazê conta já
de intrá naquelle lugar. Pra tudo gente
são meçá chavoqueada, tirá
dente, tira lingu; mas medrozo como cachoro
china.
Como já são hora de vem tudo parecero de jogo, eu
já nompôde
escrevê mas novidade. Amestê olá
fazê chá, tirá sucre, mandá
fazê
torada, comprá manteguilha na botica de barbero.
Adeus, Minha Querida Chencha, Deus conservá saude
pra vos e
pro vosso Abelardo, Eu, vosso tio, tia tia, tio João, tudo
mandá muto
lembrança.
Vai ung-a botle de achar laia laia e ung-a flandi de bolo
batê-pau
torado.
Vosso tia e amiga
Pascoela.
9. Appendix:
O portuguez alterado como o fallam os negros e os estrangeiros
que possuem mal a lingua tem sido muitas vezes imitado, principalmente
no theatro e na litteratura de cordel. Apesar do interesse secundario
d'essas imitações damos, alguns specimens.
[46]
(Indo Gonçalo seu caminho,
apartando-se do
Clerigo, topa hum Negro grande
ladrão, e entra cantando buscando hum mulato: e diz
Gonçalo, depois de cantar o
Negro:)
gonç. |
Dize, negro, es da
côrte?
|
gonç. |
Mais
tredor era o
rascote
Que m'a mim furtou a lebre. |
neg. |
Qu'esso? |
|
gonç. |
S'es da
côrte?
|
neg. |
Qu'he
quesso que te
furtai? |
neg. |
Ja a mi
forro, nam sa cativo.
Boso conhece Maracote?
Corregidor Tibão he,
Elle comprai mi primeiro;
Quando já paga a rinheiro,
Daita a mi fero na pé.
He masa tredora aquelle,
Aramá que te ero Maracote. |
gonç |
Hũa lebre de
meu pae,
De meu cunhado huns capões,
E marmelos e limões;
Abonda tudo lá vai. |
|
neg. |
Jesu,
Jesu, Deoso consabrado!
Aramá tanta ladrão!
Jesu! Jesu! hum caralasão:
Furunando sá sapantado.
Jesu! cralasam. |
Pato nosso santo paceto ranho
tu e figo valente tu e cinco sego, salva
tera pão nosso quanto dão dá noves
caro he debrite noses ja libro nosso gallo. Amen Jeju, Jeju, Jeju.
|
Sa pantaro Furunando.
Dize, rogo-te, fallai:
Conhece tu que furtai?
Porque tu nam bruguntando? |
|
Grande canseira:
Firalgo sôlto, canseira;
Chovere muto, canseira;
Não póde chovere, canseira:
|
gonç. |
Perguntarei por
meu pae. |
|
Muito filho, canseira;
|
neg. |
Cal-te:
Deoso cima sai,
Que furtai ere oiai.
Deoso nunca vai dormi,
Sempre abre oio assi,
Tamanha tu sapantai.
Guarda mar esso mal,
E senhora Prito santo.
Nunca rirá homem branco
Furunando furta real.
Não sabe mi essa careira:
Para que? para comê?
Muto comê muto bebê
Turo turo sa canseira.
|
|
Nunca pariro
canseira;
Papa na Roma canseira;
Essa ratinho, canseira;
Não vamo paraiso, grande canseira;
Vira reza mundo turo turo he
Canseira.
Mi nam falla zombaria.
Pos para que furtai?
Que riabo sempreza!
Abre oio turo ria.
Mi busca mulato bai.
Ficar abora, ratinho. |
|
Vira mundo turo
canseira:
Senhor grande, canseira;
Home prove, canseira;
Muiere fermoso, canseira;
Muiere feio, canseira;
Negro cativo, canseira;
Senhoro de negro, canseira;
Vai missa, canseira;
Prégação longo, canseira;
Crerigo nam tem muiere, canseira;
Crerigo tem muiere, canseira; |
gonç. |
Eu
aguardo meu
padrinho,
Que va comigo a meu pae.
Eu vou ao rio perem,
Porque hei sêde e beberei,
E sicais que nadarei
Emquanto o clerigo vem.
Leixarei o chapeirão
Mettido nesta mouteira,
E o cinto e esmoleira,
Porque lá logo o verão,
Não me aqueça outra tal feira. |
(Espreita o negro como
Gonçalo esconde o
chapeirão e o al, e tanto que se vai
entra dizendo:)
neg. |
A mi abre oio e ve
Ratinho tira besiro:
Ere dexa aqui condiro:
Não sei onde elle mettê.
Senhora Santo Francico,
Santa Antonia, San Furunando!
Pois mi ha d'andar buscando,
E levare elle na bico
O servo Santa Maria. |
[47]
Sabe a regina Matho
misercoroda nutra d'hum cego savel até
que vamos. A
oxulo filho d'egoa alto soso peamos ja mentes ja frentes vinagre
qu'elle quebrárão
em balde ja ergo a quante nossa ha ilhos tue busca cordas oculos nosso
convento
e geju com muito fruta ventre tu ja tremes ja pias. Seuro santa Maria
dinhero me
lá darão he ve esa carta da me mucho que furte
cantara Furunando.
(Acabada assim esta
salve regina,
acha o Negro o que Gonçalo
leixou
escondido,
e diz:)
Ei-lo
aqui sa! Deoso
graça.
Graça Deoso esse he capote;
Nunca dexa aqui palote:
Ratinho, quem te forcasse!
Aramá que te ero villão!
Que palote saba sam,
Barete também bo era.
Mi cansai e á deradera
A mior fica sua mão.
Vejamos bolsa que tem:
Hum pente para que bo?
Tres ceitil sa qui so:
Ratinho nunca bitem.
O riabo ladarão!
Corpo re reos consabrado!
Essa villão murgurado
Sa masa prove que cão.
Quando bolsa mi achase
Fernão d'Alvaro, esse si;
Nunca pente sa alli.
Ah reos! quem te furtasse
Bolsa, Nuna Ribeiro!
Home bai busca rinheiro:
A toro ere rise:
Ja rinheiro feito he.
Aramá que tu ero gaiteiro!
Fernão d'Alvaro
m'acontenta;
Elle nunca risse nam.
Logo chama ca crivam,
—Crivaninhae esormenta;
Toma rinheiro, vas embora.
Boso, home de bem, que buscae?
—Mi da cureiro agarba sae.
—Boso que buscai corte agora?
—Buscae a Rei jam João,
Paga minha casaramento.
—Dá ca, moso, trae esormento;
Crivaninhae boso, crivão:
Home, tomae hum dos quatro sete: |
|
Vas embora turo turo.
Sua rinheiro sa segura,
Mioro que elle promete.
Marco Estevez moladeiro.
Elle rise: Santa Maria!
Rinheiro boso queria?
Bai bai dormir paieiro.—
Boso que pedir, muieiro?
—Tanta filho mi tem qui...
—Quem manda boso pari,
Boso grande parideiro?
—Boso seria muito bô:
Vaca ne Francico paia;
Tenha seis filho e mi so
Nam temo comere ni migaia.
Elle rise:
Que culpo tem a Rei jam João
Boso parir como porco,
Bai buscai sua pae torto,
Que dai a sua fio pão.
Velha, que boso querê?
—Molla, que a mi pobre sai.
Elle rise:
Porque boso nan guardai
Rinheiro que boso bebê?—
Jesu! Jesu! moladeiro
Sa riabo aquella home:
Quando a mi more da fome
Nunca buscai sua rinheiro,
Porém
graça a Reos, a mi
Nunca minga que furtá;
Pouco ca, pouco relá,
Pouco requi, pouco reli,
Grão e grão gallo fartá,
Quem furta, home sesuro:
E louvar a Reos com turo
E senhoro Prito Santo.
A mi bai furta emtanto
Camisa que sá na muro. |
Gil
Vicente, O Clerigo da
Beira.
O preto, e o bugio ambos no mato discorrendo sobre a
arte de ter dinheiro
sem ir ao Brazil. Lisboa. Na officina patriarchal de
Francisco
Luiz Ameno 1789. 4.º 21 pp.—Excerpto:
«Já non pore deixá de
incricá os cabeça, e confessá, que
vozo doutrina
sá huns doutrina tão craro, e verdadeiro, que pla
mim sá huns
admiraçom non sé platicada per toro o mundo. O
trabaio a que vozo
obliga os pleto, e os blanco; sá huns trabaio a que ninguem
se pore
negá sem melecé huns cóssa bom; porque
os genia, e os incrinaçom
do natureza a toro gente move pala ere, e fóla de trabaio
ninguem
[48]
pore vivé em satisfaçom. Mim agola sem
trabaiá nom pore conté, ainda
que mim ter abominaçon a captiveiro cruere de blanco, de que
sá forro;
com turo non aglada a mim estar aqui sem nada fazé: evita
vozo tanta
plegiça, os excessa de plodigo, e dos varento, que nozo
poderemo toro
assi havé os oira, e triunfá dos indigencia; e de
turo quanto pore infelicitá.
Se aqui apalecera agola uns blanco, que pole escrevé os
mavioso
doutrina, que vozo platicá, e toro o gente ouvire cos oreia
aberto, faria
ere ao familia toro do mundo hum favoro, que meoro non pore
imaginá.»
p. 21.
II. DIALECTOS HESPANHOES
1. Creolo de Curaçáo
Esta ilha, cujo nome é lembrado por um licor bem conhecido,
que
d'ella tomou o seu, é uma das tres ilhas denominadas de
«sotavento»;
está situada em frente da costa de Venezuela entre a lat.
12° 3' e 12°
24' e long. 68° 47' e 69° 16' Gr.
Com as outras ilhas do grupo pertenceu á Hespanha depois de
seu
desenvolvimento até 1648 em que a Hollanda ficou de posse
d'ella, e
conservando-a até hoje, apenas com uma
interrupção produzida pelo
dominio de Inglaterra de 1807 até 1815. A primitiva
colonisação hespanhola
foi muito limitada. Hoje a população da ilha sobe
a mais de
15:000 habitantes, de que apenas cêrca de um quinto
são brancos. A
população negra parece ter passado para
lá em grande parte das colonias
hespanholas; o dialecto creolo que ella falla tem por base o hespanhol
e contém alguns elementos lexiologicos ministrados pelo
hollandez.
O sign. E. Teza consagrou a esse dialecto um artigo no
Politecnico,
vol. XXI, p. 342-352, tendo por base de
investigação o livro:
Catecismo
pa uso di catolicanan di Curaçao. Cathecismus ten gebruike
der
katholyken van Curaçao door Martinus Joannes Niewindt,
bissehop van
Cytrum, karmerheer van Z. H. en apostolisch vicarius van
Curaçao. Gedrukt
te Curaçao ter drukkery van zyne doorluchtige
hoogwardigheid.
Segundo o illustre professor italiano esse catechismo não
foi impresso
muito antes de 1845.
The Bible of Every Land, p. 270,
dá-nos a seguinte noticia: «Uma
traducção de parte do Novo Testamento n'esta
lingua foi feita pelo
rev. Mr. Conradi; e uma pequena edição do
evangelho de S. Matheus
foi impressa em 1846, a expensas da Sociedade biblica
neerlandeza».
O sign. Teza não soube da existencia d'essa
traducção, de que a obra
ingleza citada nos dá um specimen em orthographia
hollandeza, que
vamos reproduzir enterlinhando-o com as palavras hespanholas
correspondentes,
tanto quanto conseguimos determinal-as.
[49]
S. Matheus, cap. V v. t. 12
1. |
Anto |
ora koe
Hezoes
a |
mira toer |
e heende |
nan |
eel a
soebi |
|
Entonces |
hora que Jeus ha |
mirar todo |
el hombre |
— |
el
a subir |
o en
seroe; deespues |
eel a
sienta |
i soe
desipel |
nan |
a
bini |
a un
sierra; despues |
el a
sentado |
y su discipulo |
— |
ha venido |
2. |
I eel |
a
koemisa |
di papia |
i di
sienja |
nan |
di ees
manera. |
|
Y el |
ha comenzar |
de papiar |
y de
enseñar |
— |
de esta manera. |
3. |
Bieenabeentoera |
ta |
e pober |
nan |
na
spiritoe,
pasoba |
reina |
|
Bienaventurado |
está |
el
pobre |
— |
spíritu,
por-este-obra |
reino |
di Dioos ta |
di |
nan. |
de Dios
está |
de |
— |
4.
|
Bieenabeentoera |
ta |
ees |
nan, |
koe ta jora |
pasoba |
lo |
|
Bienaventurado |
está |
este |
—, |
que
está llorar, |
por-este-obra |
— |
nan |
bira
konsolaa. |
— |
consolado. |
5. |
Bieenabeentoera |
pasifiko |
nan, |
pasoba |
lo |
nan |
erf |
tera. |
|
Bienaventurado |
pacifico |
—, |
por-este-obra |
— |
— |
|
tierra. |
6. |
Bieenabeentoera |
ees |
nan, |
koe
tien |
hamber i
sedoe |
di
hoestisij, |
|
Bienaventurado |
este |
—, |
que tiene |
hambre y sed |
de justicia, |
passoba |
lo |
nan |
no tiene |
hamber i
sedoe |
mas. |
por-este-obra |
— |
— |
no tiene |
hambre y sed |
mas. |
7. |
Bieenabeentoera |
ees |
nan, |
koe tien |
mizerikoordia, |
pasoba |
|
Bienaventurado |
este |
—, |
que tiene |
misericordia, |
por-este-obra |
lo |
heende |
tien |
mizerikoordia |
koe |
nan, |
— |
hombre |
tiene |
misericordia |
con |
— |
8. |
Bieenabeentoera |
ees |
nan, |
koe |
ta |
liempi di |
koerasoon |
pasoba |
|
Bienaventurado |
este |
— |
que |
está |
limpio di |
coraçon, |
por-este-obra |
lo |
nan |
mira Dios. |
— |
— |
mira Dios, |
[50]
9. |
Bieenabeentoera |
ees |
nan, |
koe ta |
perkoera
paas, |
pasoba |
|
Bienaventurado |
este |
— |
que está |
procurar paz, |
por-este-obra |
lo |
nan |
ta |
jama |
joe |
di Dioos. |
— |
— |
está |
llamado |
hijo |
de Dios. |
10. |
Bieenabeentoera |
ees |
nan, |
koe ta |
persigido |
pa motiboe
di |
|
Bienaventurado |
este |
—, |
que está |
persiguido |
por
motivo de |
hoestisji, |
pasoba |
reina di
Dioos |
ta |
di |
nan. |
justicia, |
por-este-obra |
reino de Dios |
está |
de |
— |
11. |
Bosonam |
lo |
ta |
bieenabeentoerado |
koe ta |
koos |
nan |
zoendra |
|
Vosotro-nan |
— |
está |
bienaventurado |
que está |
— |
— |
— |
i |
persigi |
bosonan, |
i koe
ta |
koos |
pa mi
kausa |
nan |
ganja |
y |
persiguido |
vosotro-nan, |
y
que está |
— |
por mi causa |
— |
gañar |
toer
soorto
di maloe ariba |
bosonan |
todo suerte de malo
arriba |
vosotro-nan. |
12. |
Legra |
bosonan |
i salta di
legria, |
pasoba |
bosonan |
|
Alegrar |
vosotro-nan |
y saltar de
alegria |
por-este-obra |
vosotro-nan |
rekompeensa |
ta |
grandi |
deen di
Ciëloe; |
pasoba |
nan |
a |
persigi |
recompensa |
está |
grande |
dentro de Cielo; |
por-este-obra |
— |
ha |
perseguido |
di ees |
manera
e profeet |
nan, |
koe tabata
promee
koe |
bosonan. |
de este |
manera el profeta |
—, |
que estaba primero
que |
vosotro-nan. |
Para auxiliar a comprehensão d'esse excerpto damos a
versão
hespanhola dos doze versiculos de S. Matheus.
1. Mas viendo Jesus este gentío, se subio
á un monte, donde habiéndose
sentado, se le acercaron sus discípulos;
2. Y abriendo su boca, los adoctrinaba diciendo:
3. Bienaventurados los pobres de espíritu, porque
de ellos es el
reino de los cielos.
4. Bienaventurados los que lloran, porque ellos
serán consolados.
5. Bienaventurados los mansos, porque elles
poseerán la tierra.
6. Bienaventurados los que tienen hambre y sed de justicia,
porque
ellos serán saciados.
7. Bienaventurados los misericordiosos, porque ellos
alcanzarán misericordia.
8. Bienaventurados los limpios de corazon, porque ellos
verán á
Dios.
9. Bienaventurados los pacificadores, porque ellos
serán llamados
hijos de Dios.
10. Bienaventurados los que padecen persecucion por la
justicia,
porque de ellos es el reino de los cielos.
[51]
11. Bienaventurados sereis cuando los hombres per mi causa os
maldijeren, y os persiguieren; y dijeren con mentira toda suerte de
mal contra vosotros.
12. Alegráos y regocijáos, porque es
muy grande vuestra recompensa
en los cielos: del mismo modo persiguieron á los profetas
que
ha habido antes de vosotros.
Como se vê, n'este dialecto não ha nenhuma
distincção formal de
genero nem de numero: a pluralidade exprime-se pela
adjuncção de
nan, que é o pronome da
terceira pessoa plural:
ees nan,
estes ou aquelles;
pober, pobre;
pober
nan, pobres. Quando um substantivo é
precedido
de adjectivos só se segue o signal do plural depois do
substantivo:
toer el heende nan, todos os
(aquelles) homens. O presente é geralmente
expresso pela fórma
ta
(==está) e o infinito, tendo todos os infinitos
perdido o
r final.
O futuro é expresso por
lo (==luego?).
2. Hespanhol fallado nos campos de Buenos-Ayres
e Montevideu
M. Maspero publicou em
Mémoires de la
Société de Linguistigue de
Paris,
t. II, p. 51-65 (Paris, 1875), um artigo sobre as
alterações experimentadas
pelo hespanhol no Rio da Prata. Essas alterações
são sufficientes
para lhe dar uma feição dialectal
assás bem caracterisada; mas são
muito differentes das que determinam os dialectos creolos, como o de
Curaçáo, etc.; são principalmente
lexiologicas e phoneticas. A vida
nova dos europeus n'essas regiões deu principalmente logar
á creação
de palavras novas do velho fundo do idioma nacional e á
introducção
de termos das linguas indigenas, por exemplo, de
pié fez-se
pialar,
pear um cavallo, de
manco mancarron,
um cavallo máo, que não serve
para nada. Alguns dos termos das linguas indigenas adoptados
encontram-se
tambem no portuguez do Brazil e parte vieram até
ás linguas
europêas, como
jacaré,
yacaré (termo guarani).
As alterações phoneticas
encontram-se sobretudo na linguagem do camponio oriental ou
Porteño.
III. DIALECTOS FRANCESES
1. Creolo da ilha Mauricio
A este dialecto pertencem algumas poesias da
collecção intitulada:
Les essais d'un bobre africain,
seconde édition, augmentée de près du
double, et dédiée à madame Borel
jeune, par F. Chrestien. Ile Maurice,
G. Deroullede et C
ie, 1831, pet. in-4.
Achámos a
indicação d'esta
obra no catalogo da bibliotheca de Burgaud des Marets e n'um artigo
de M. P. Meyer:
Revue critique,
1872, artigo 50. A ilha Mauricio,
depois do dominio do portuguez e hollandez (1598-1715) esteve em
[52]
poder dos francezes de 1715 a 1810, em que se tornou
possessão ingleza.
O dr. A. Bos publicou na
Romania
muito recentemente (vol. IX,
p. 571-578) uma nota sobre o dialecto creolo d'essa ilha, a qual
pudémos
ler ainda á ultima hora. Resumimos o seu
conteúdo.
«Esse creolo, diz o auctor, formado para o uso commum,
laço de
communicação entre as differentes
raças que habitam a ilha, é muito
desprezado; não se escreve e não é
empregado pelos brancos senão
para se fazerem comprehender dos seus creados de côr. O
plantador de
Mauricio não falla creolo senão a seus servos ou
trabalhadores, negros
ou indios, e ainda a seus cães de caça,
repellindo para longe de si a
idéa que esse
patois
informe possa jamais converter-se n'uma lingua.
E, todavia, o creolo de Mauricio, como diremos mais abaixo, cresce e
prospera de dia em dia; encaminha-se para a fortuna de uma
lingua.»
Com relação á phonetica notaremos o
seguinte:
1. O accento tonico não se desloca.
2. Ha alongamento frequente de
a:
ā-ccent,
pā-rent. Esse alongamento
é de lei quando ha quéda de consoante:
pā-ti==partir (alongamento
por compensação).
3.
E medial atono muda-se
em
i:
vini (venir) ou cae;
e final atono
cae sempre.
4.
Ui muda-se em
i;
oi ás vezes em
o.
5.
Ch,
g (e, i),
j mudam-se respectivamente em
ç,
z.
6.
R final cae sempre,
até nas ligações como
tre,
bre; p. ex.
cambe==chambre.
R medial entre vogal e consoante cae
igualmente:
Zoze==Georges.
7.
X
é pronunciado como
s
(ç):
éçélan==excellent.
Com relação ás fórmas eis o
mais interessante:
1. Não ha distincção de
generos: permanecendo a fórma masculina
para o masculino e feminino,
mon
fame,
ton
lakaze, ma femme, ta
maison.
2. A distincção do numero tende
igualmente a desapparecer. Os
pronomes pessoaes que são palavras differentes para o
singular e plural
conservam-se:
moa, eu;
nou, nós;
toa, tu;
vou, vós.
3. A suppressão do artigo é
quasi completa. Como no dialecto da
Trinidad o artigo e ainda a preposição partitiva
coalescem com varias
palavras:
lacaze, casa (maison);
dilo,
dipin,
divin (
de
l'eau,
du pain,
du vin). Como no dialecto da
Trinidad se diz
zoreis==oreilles (o
s é o
resto do artigo
les),
assim n'este temos, p. ex,:
zozo,
oiseaux. O
z apparece
tambem no singular:
ène
zozo, un oiseau,
li
zozo, les oiseaux.
4. Pronomes:
moi,
toa,
li (lui);
nous,
vous,
li. Os pronomes sujeitos
do singular
je,
tu,
il do francez desappareceram pois; o
pronome
da terceira pessoa do plural é identico ao do singular.
5. Uma unica fórma verbal—o infinito,
é empregada no creolo da
ilha Mauricio. O passado é expresso pelo infinito do verbo
principal
com o infinito auxiliar
fini:
moi fini
travaïé, j'ai
travaillé;
mon fini
broçe chambre, j'ai fait
(
brosser) la chambre. Para a
expressão do futuro
empregam-se com o infinito diversas locuções
adverbiaes. Para alguns
verbos, segundo o dr. Bos, essa fórma unica que substitue
todas as outras
não saíu do infinito, mas sim do presente:
koné==connais,
connaît;
[53]
voulé==voulez. A
explicação verdadeira d'essas fórmas
está n'outro
principio que o artigo que analysâmos nos ministra. Os
infinitos em
oir e
re foram substituidos por infinitos
analogicos pelos typos em
e
(
er)
e
i
(
ir); assim
éteindre por
éteignir,
tezi por
taire. Estas fórmas
assentam
sobre as do plural
éteignons,
éteignez,
éteignent,
taisons,
taiser,
taisent,
ou antes sobre os substractos
éteign-,
tais- com a desinencia do infinito
i. O dr. Bos, tendo primeiro
explicado
voulé por
voulez, apresenta-o
depois como exemplo d'este processo.
6. O verbo
avoir
foi substituido por
gagner (como na
Luisiana).
7. Não se usam conjuncções;
as proposições são raras. A
construcção
approxima-se do typo chinez:
moa kosé vou
alé baza, je vous dis
(cause) d'aller au marché (bazar);
toa
guété çival pa pati,
tu regarderas
(guetter) á ce que le cheval ne parte pas;
mamzèle kosé kóme
ça
mamzèle pa vini mamzèle
faï, mademoiselle m'envoie vous dire
précisément
qu'elle ne peut pas venir, parce qu'elle est malade;
vou kontan
moa alé promené,
êtes-vous satisfait, aimez-vous que j'aille me promener?
Com relação ao vocabulario diz-nos o nosso
auctor: «O creolo apenas
conservou do francez poucas palavras, as palavras que bastam para
exprimir as primeiras necessidades da vida, as
relações mais ordinarias.
Evidentemente seria difficil e mesmo impossivel tratar um assumpto
de philosophia em creolo; o mesmo succedeu provavelmente com o francez
nos seus primeiros começos. A essas poucas palavras
francezas que
formam quasi em totalidade o seu vocabulario, o creolo ajuntou algumas
recebidas dos paizes vizinhos:
baza,
mercado,
salam, bons dias;
tiffin (pronuncia-se
toffin), o paladar, d'onde
tiffiner, provar, palavras
que pela maior parte se acham no francez em uso em Mauricio.»
«Esse creolo de Mauricio, apesar de ser tão
grosseiro, está longe
de querer desapparecer deante das linguas muito mais perfeitas, o
francez
e o inglez. A maior parte da população de
Mauricio é hoje india;
póde prever-se que ella augmentará cada dia mais,
graças ás immigrações
continuas da India. Deante d'essa onda que sobe, a antiga
população
creola, brancos, negros e mulatos, diminue proporcionalmente. Ora
entre indios, chinezes, malgaches, creolos, mulatos e brancos o
laço
commum é o creolo. Um indio, um chinez, um arabe, um branco
(europeu?)
tratarão uns com os outros os seus negocios em creolo, e
esse
neo-francez tomará maior extensão ao passo que a
população variegada
da ilha for augmentando. É possivel até que n'uma
epocha, muito afastada
é verdade, o francez desappareça, como a
população que o falla
tende a diminuir. O creolo, ganhando ao contrario terreno,
poderá tornar-se
a lingua usual, commum, e até a lingua geral, como elle
é já a
lingua do povo, a
rustica
vulgaris.» O auctor pensa que o inglez
permanecerá
exclusivamente como lingua de administração sem
influencia
sobre o creolo.
No francez da ilha Mauricio algumas palavras indicam a proveniencia
dos primeiros colonos, porque se acham lá como na Bretanha,
de onde
elles emigraram; além d'isso esses colonos eram marinheiros.
Achando
coincidencia de termos entre o creolo d'essa ilha e o de outras
possessões
europeas no vocabulario em contraposição com o do
francez litterario,
deve admittir-se que ella tem a causa em que esses colonos levam
no seu vocabulario termos do francez de Bretanha e do vocabulario
[54]
nautico que se encontram nas outras linguas romanicas. No
francez
de Mauricio diz-se, por exemplo,
amarrer não
attacher,
espérer, não
attendre,
larguer não
lâcher, como em portuguez.
2. Creolo da Luisiana
Na
Mélusine I, col.
495-497, acha-se reproduzido um conto em
francez-creolo da Luisiana com traducção
franceza. É talvez ocioso
recordar aos nossos leitores que os francezes descobriram em 1699 a
foz do Mississipi e fundaram em 1717 Nova Orleans, e que tendo a
Luisiana feito parte dos dominios de Hespanha desde 1762 até
1800,
passou n'esse ultimo anno de novo para o dominio da França,
que a cedeu
aos Estados Unidos em 1803 por 60 milhões de francos. Esses
factos
explicam a existencia da colonisação franceza e
do dialecto francez-creolo
n'aquelle estado da republica norte americana. Eis um excerpto
do conto:
Ein
joie, dan tan lé zot foi, Compair
Bouki couri dîné côté so
ouasin Compaire
Lapin. Compair Lapîn té pa gagné ein
goute do lo
pou boi. Ça fé Compair Bouki di
com à Compair Lapin; |
Un
jour, au temps d'autre fois, Bouc alla dîner chez
son voisin, compère Lapin. Compère Lapin
n'avait pas une goutte d'eau à boire. Alors
compère Bouc dit comme ça à
compère Lapin: |
—Mouen
non pli, mo pa
gagné do lo; si to olé vini padna, no
va fouyé ein
pi. |
—Moi non plus, je
n'ai pas d'eau; si tu veux
venir par là, nous allons creuser un puits. |
Compair
Lapin soucouyé so
la tête: |
Compère
Lapin secoua la tête: |
—Non!
Compair Bouki;
gran bon matin, mo boi la rosé on
zerbe; dan jou, kan mo souaf, ma boi
dan piste la
ouach. |
—Non
compère Bouc; le bon matin je bois la
rosée sur l'herbe et dans le jour, quand j'ai soif,
je bois dans la piste de la vache. Alors compèreBouc
fouilla son puits tout seul. |
Ça
fé Compair Bouki fouyé
so pi li tou sel. Apé li té
fouyé pi
là, kan li couri charché so do lo
bon matin, li ouâ trace Compair
Lapin au ra so pi. Li graté so la tête
et li jonglé. |
Après
qu'il eut fouillé le puits, quand
il courut chercher de l'eau de bon matin, il vit la trace
de compère Lapin au ras du puits. Il se
gratta et s'écria: |
—Bambail,
mo Compair, mo
va trapé toi. |
—Mon
compère, je vais t'attraper. |
[55]
Li
couri pran so zouti et lifé
ein gro catin avé boi laurié. Li
godroné li, godroné li si tan jika
lité
noi com négresse guinain. Soleil bas, Compair Bouki
couri planté so
catin
déboute au ra so pi. Dan
la nuite la line tapé cléré,
Compair Lapin vini avè so baqué pou
charché do lo. Kan li ouâ ti
négresse là, li
rété, li baissé, li
gardé ben. |
Il court prendre
ses outils et il fait une grosse catin[6]
avec du bois du laurier. Il la goudronne, la goudronne
jusqu'à
tant qu'elle fût noire comme négresse de
Guinée. Le soleil tombé,
compère Bouc courut planter sa catin debout au ras
du puits. Dans la nuit, la lune tapait clair;
compère Lapin vint avec son baquet pour chercher de
l'eau. Quand il voit la petite négresse, il
s'arrête,
se baisse et la regarde
bien. |
—Ki
bétail ci
là? |
—Quelle
bête est-ce là? |
Li
hélé on li; ti négresse
là
pa grouyé, li pas
réponne. |
Il la
hèle; petite négresse ne bouge pas, ne
répond pas. |
Observações
phoneticas. 1)
u,
ui mudado em
i:
jiká==
jusqu'à,
line==
lune,
pli==
plus,
pi==
puits;
2)
au em
ou:
oussi==
aussi;
3)
eu em
é:
pé==
peu,
fé==
feu,
sel==
seul;
4)
oi em
è,
é:
drète==
droite,
cré==
croire,
olé==
vouloir;
5)
r,
re,
le apocopados:
ouâ==
voir,
noi==
noir,
pou==
pour,
jou==
jour,
cré==
croire,
pran==
prendre,
zot,
lot==
autre,
enco==
encore;
capab==
capable;
6)
r sincopado entre vogal e
consoante ou consoante
e vogal:
fanne==
fendre,
réponne==
répondre,
foce==
force,
moceau==
morceau,
apé==
après;
7)
v vocalisado ou supprimido:
choual==
cheval,
ouach==
vache,
ouâ==
voir,
olé==
vouloir
(mas
volé==
voler);
8) assimilação:
fanne==
fendre,
moune==
monde,
réponne==
répondre;
9) apherese:
cré==
sacré,
ti==
petit;
baissé==
abaisser,
rété==
arrêter,
voyé==
envoyer,
contré==
rencontrer,
gardé==
regarder.
Genero e numero. Não ha
nenhuma distincção formal de genero e
numero:
ti ou
petit==
petit
e
petite;
moceau==
morceau
e
morceaux.
Artigo. Ora é empregado
ou supprimido, assás arbitrariamente:
La
main goche collé aussi, la main gauche se
colle aussi;
pié
collé, le pied
se colle. O artigo apparece entre o possessivo e o substantivo:
so la
main, sa main;
mo lot la
main, mon autre main (l'autre main),
so la
tête, sa tête. O artigo coalesceu
com alguns substantivos:
lo, eau;
do
lo, de l'eau (litteralmente:
du
l'eau),
so do lo,
son eau (litteralmente:
son du l'eau), mas
mo fron, mon front,
so pi, son puits.
N'alguns casos coalesceu com o substantivo o
s (z) de
les, e a fórma
com essa prothese é empregada como singular ou plural:
so zepol,
son épaule;
zerbe, herbe;
zot, autre (tambem
lot),
so
zouti, ses outils;
so
zoreil, son oreille, ses oreilles; o mesmo se
dá na Trinidad e Mauricio.
Pronomes. 1.ª pessoa singular,
mo,
mouen sujeito:
mo
boi, je bois;
mouen non pli, moi non plus;
mouen regimen:
lâché mouen,
lâche-moi.
2.ª pessoa singular,
to sujeito:
to gardé, tu regardes;
toi regimen:
to
cré choual voyé cou pié on
toi, tu croiras qu'un cheval t'a envoyé un
coup de pied;
mo va trapé
toi, je vais t'attraper;
qui cogne
toi, qui te
cogne. 3.ª pessoa singular,
li
sujeito e regimen:
li fé,
il fait;
li gratté,
il sa gratta;
li voyé li,
il l'envoya. 1.ª pessoa plural,
no va
fouyé, nous
allons creuser (fouiller). As outras fórmas faltam no conto
sobre que
se baseiam estas nossas observações.
Não ha pronome reflexo:
li
rété,
il s'arrête;
li
baissé, il s'abaisse;
li
gratté, il se gratta.
Verbo. Com
excepção de
té==
était
(
étais), todas as
fórmas verbaes
são substituidas pelo infinito, que serve para exprimir o
presente, o
futuro, o preterito de todos os modos. A fórma
té serve porém
para
exprimir com um infinito (ou o participio passivo?) periphrasticamente
o
[56]
preterito:
li té pá
gagné, il n'avait pás;
li té fouyé,
il eut fouillé;
to té
di, tu avais dit.
Preposição. As
principaes preposições são:
avé, avec,
dan, dans,
en;
on, en;
au;
pou, pour. A
preposição
de
é supprimida:
pierre
tonnair,
pierre de tonnerre;
boi laurier,
bois de laurier;
ta branchaille sec,
tas de branches sèches;
piste la
ouach, piste de la vache;
au ra so
pi,
au ras de son puits;
cou
pié, coup de pied.
Suppressão de verbos,
etc.:
Comencé colair, il
commence à être colère;
kan mo souaf, quand j'ai soif.
3. Creolo da Guyana
MM. de Saint Quentin publicaram ha alguns annos um livro contendo
contos populares (um só na prosa original), fabulas
traduzidas do
francez e canções creolas dos auctores n'este
dialecto. Temos noticia
d'este livro apenas por uma indicação na
Mélusine, I, 55 (Paris,
1877).
Na
Mélusine, I, n.
os
1
e 2, ha traducção, mas sem o original, de dois
contos da Guyana franceza. Esta possessão da
França foi colonisada
por francezes no começo do seculo XVII e permaneceu colonia
franceza
até hoje, com excepção do periodo de
1808-1817, em que esteve
em nosso poder.
4. Creolo da Ilha de S. Domingos
Encontram-se um
Voccabulaire, français et
crèole, dialogos e
canções
n'este dialecto no
Manuel des habitants de
Saint-Domingue, par
Ducœurjoly. Paris, Lenoir, 1802, t. II, p. 283-393.
5. Creolo da Trinidad
O dialecto francez-creolo d'esta ilha póde estudar-se na
obra
The
theory and practice of creole grammar, by J. J.
Thomas. Port of Spain
(Trinidad), the
Chronicle publishing
office. In 8.º, 134. p. Tenho noticia
d'essa obra apenas por um artigo de M. Paul Meyer na
Revue
critique, 1872, art. 50.
«A conservação entre os negros das
Antilhas, diz M. P. Meyer,
de
patois mais ou menos differentes
uns dos outros, mas tendo incontestavelmente
uma origem franceza, é um facto digno de
attenção. É-o
sobretudo na Trinidad que nunca foi colonia franceza. É
evidente que
todos esses negros vêem originariamente de colonias
francezas, e aquelles
mesmo da parte meridional dos Estados Unidos que fallam o inglez
que nos fizeram conhecer os romances de Mrs. Beech-Stowe ou de M.
Kirke, deviam ter fallado outr'ora um
patois francez. Parece
até que o
patois da Ilha de França
offerece, na deformação do francez, analogias
com o da Trinidad que não são explicadas
sufficientemente pela communidade
do ponto de partida. A expansão de um
patois negro formado
do francez depende naturalmente das deslocações a
que foram submettidos
[57]
aquelles que o fallavam, e isso é um assumpto que
não é geralmente
conhecido, pelo menos d'este lado do Atlantico.
«O fundo do
patois
é francez, com alguns emprestimos do hespanhol
(a Trinidad foi colonia hespanhola até 1797) e do inglez.
«Ha algumas particularidades curiosas no systema dos sons. A
apocope
e mais ainda a apherese (o fim da palavra sendo geralmente protegido
pelo accento) representam n'elle um grande papel. Assim:
tè por
étais,
était (ou antes talvez
pelo participio
été);
sé por
serais,
serait.
Outras suppressões effectuam-se sobre o centro das palavras;
assim:
vlez por
voulez, em que vemos a
extensão de um facto que o anglo-normando
nos offerece em
frai
(
ferai),
fras,
frad, etc. As liquidas
l e
r
caem deante d'uma outra consoante, e a vogal precedente torna-se longa:
mâgré
(
malgré),
pâler
(
parler),
môdre
(
mordre). Algumas vezes tambem
l e
r caem depois do accento diante de
um
e mudo, que seria melhor
não escrever; assim:
tabe
(
table),
vîte
(
vitre). Todos que tiveram
occasião de ouvir negros ou mulatos das colonias tiveram
occasião de
notar os mesmos factos na sua pronuncia, ainda quando elles fallam
francez.
«Não é á phonetica que
pertencem os factos mais caracteristicos do
creolo, mas á flexão e á
composição das palavras. O que n'essa parte
se observa é bem feito para elevar ao mais alto o assombro
dos que
acham já enormes as formações novas
que nos offerecem os idiomas
romanicos comparados com o latim. Nós dizemos
celui-là emquanto o
latim vulgar dizia
eccillum; mas os
negros põem
là
a todo o instante
depois dos substantivos como um demonstrativo a que não
ligam já
grande valor (M. Th., p. 15). O sentido das particulas e dos artigos
está de tal modo obliterado que já não
se empregam senão absolutamente
confundidos com as palavras a que se juntaram e fazendo corpo
com ella:
difé,
dithé,
divin,
dleau (p. 18) querem dizer:
feu,
thé,
vin,
eau;
zoreies quer dizer as orelhas;
pêncor (p. 122) quer dizer
pas encore,
contracção que nos offerece tambem o
provençal
pancaro. N'um
idioma tão empobrecido é só o logar
das palavras que indica as relações.
Assim n'este proverbio:
Pas fôte langue qui
fair bêf pas sa pâler
(p. 121) (Ça n'est pas faute
de langue qui faire bœuf pas savoir
parler).
«Os verbos parecem, pelo menos muitas vezes, reduzidos a uma
só
fórma, a do infinito (a não ser que alguma outra
fórma tenha sido
preservada por causa de uma differença bem sensivel e de um
uso frequente).
Estudar-se-hão com interesse os diversos tempos compostos
com os quaes os negros remediaram as lacunas da
conjugação, e achar-se-ha
n'isso materia para diversas comparações com os
factos parallelos
das linguas romanicas. Todavia é mister não
esquecer que a comparação
não tem aqui senão a mais fraca base. Os negros
quando aprenderam
o francez, estavam habituados a uma linguagem absolutamente
differente, e nunca souberam senão as palavras e as
fórmas mais usuaes
do seu novo idioma, emquanto o latim vulgar de que saíram as
linguas
romanicas por desenvolvimentos individuaes e locaes, foi sempre um
idioma assás completo, cujas
transformações foram assás lentas para
que as lacunas tivessem tempo de se encher ao passo que se
formaram.»
[58]
6. Creolo da Martinica
Cremos que versa principalmente sobre este dialecto a obra seguinte,
que conhecemos apenas pelo catalogo da bibliotheca de Burgaud des
Marets:
Catéchisme en langue créole,
précédé d'un essai de grammaire sur
l'idiome usité dans les colonies
françaises, par M. Goux, missionnaire
à
la Martinique. Paris, Vrayet de Suroy, 1842, in 8.º Mais
recente
é o
livro de Turiault:
Étude sur le langage
créole de la Martinique. Brest.
236 pp. in 8.º en deux volumes. 1876. (Paris, Viaut.)
Contém uma
serie de enigmas, numerosos proverbios, alguns contos, algumas
canções
e diversas traducções do francez. Vid.
Mélusine, I, 55. Paris,
1877.
IV. LINGUA FRANCA
Littré,
Dict. de la langue
française, s. v.
franc 4, define lingua
franca: «jargon mélé d'italien,
d'espagnol, etc. à l'usage des Francs de
l'Orient» isto é, dos europeus do Levante.
J. Creswell Clough no ensaio
On the existence of mixed
languages,
p. 11, define, fundado na auctoridade de Malte Brun, a lingua franca do
Mediterraneo como uma mistura de catalão, limosino,
siciliano e arabe,
originada nos estabelecimentos de escravos dos mouros e turcos. O
auctor
não conheceu porém nenhum specimen d'essa lingua.
(
The Athenaeum,
1877. January to June, p. 545.)
Segundo o mesmo periodico inglez, vol. cit. p. 608, ha um
Dictionnaire
de la langue franque, ou petit mauresque, à l'usage des
français
en Afrique, publicado ha alguns annos em Marselha. O
vocabulario
comprehende palavras italianas, algumas fórmas
approximando-se do
hespanhol e ainda um certo numero de termos locaes usados na Argelia.
O principe L. L. Bonaparte considera, com rasão, a lingua
franca
como estando para com o italiano litterario na mesma
relação que o
indo-portuguez para com o portuguez, os dialectos creolo-francezes
para com o francez, o negro-hollandez para com o hollandez,
(
Athenaeum,
vol. cit., p. 640 e 703.)
Lingua
franca |
Italiano |
Bon giorno, Signor;
comme
ti star?—Mi star bonu, e
ti?—Mi star contento mirar per
ti.—Grazia.—Mi pudir servir per ti
per qualche cosa?—Muciu
grazia.—Ti dar una cadiera al
Signor.—Non bisogna. Mi star bene
acousì.—Comme star il fratello di
ti?—Star muciu bonu. |
Buon giorno,
Signore; come stai?—Io sto
bene, e tu?—Io son contente di
vederti.—Grazie.—Poss'io servirti in
qualche cosa?—Molte grazie.—Dà una seggiola al
Signore.—Non ho
bisogno. Io sto bene così.—Como sta il tuo
fratello?—Sta molto
bene. |
(The Athenaeum,
1877, 1.º sem., p.
640).
[59]
L. L. Bonaparte dá as seguintes regras que caracterisam a
lingua
franca: 1.ª Os nomes não têem plural:
amigo==amigo e amigos. 2.ª Os
verbos não têem conjugação,
mas só um futuro periphrastico e um participio
terminando em
ato ou
ito:
mi,
ti,
ellu,
noi,
voi,
eli,
andar significam
não só eu vou, tu vaes, elle vae, nós
vamos, vós ides, elles
vão, mas tambem eu ia, etc., eu fui, etc.;
bisogno andar significa eu
irei, etc. 3.ª
Star significa
ser e
ter, quando são usados
como verbos
auxiliares. 4.ª
Avir ou
tenir significam
ter, mas só com a
idéa de
possuir.
5.ª O regimen directo dos pronomes pessoaes é
precedido da
preposição
per: mi mirar per ella, eu vejo-o.
Molière no acto IV do
Bourgeois
gentilhomme deu uma imitação da
lingua franca.
«Scène X.—
Le Muphti, Dervis,
Turcs, chantans et dansans; Monsieur
Jourdain, vêtu à la turque, la
tête rasée, sans turban et sans
sabre.
Le Muphti, à M. Jourdain.
Se ti sabir,
Ti respondir,
Se non sabir,
Tazir, tazir.
Mi star muphti,
Ti qui star si?
Non intendir,
Tazir, tazir.
«Scène XI.—
Le Muphti, Dervis,
Turcs chantans et dansans.
Le Muphti. Dice, Turque, qui star
quista? Anabatista? anabatista?
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Zuinglista?
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Coffita?
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Hussita? Morista?
Tronista?
Les Turcs. Ioc, ioc, ioc.
Le Muphti. Ioc, ioc, ioc. Star
pagana.
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Luteranos.
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Puritana?
Les Turcs. Ioc.
Le Muphti. Bramina? Moffina? Zurina?
Les Turcs. Ioc, ioc, ioc.
Le Muphti. Ioc, ioc, ioc.
Mahametana? Mahametana?
Les Turcs. Hi Valla. Hi Valla.
Le Muphti. Como chamara? Como
chamara
Les Turcs. Giourdina, Giourdina.
[60]
Le Muphti (sautant). Giourdina,
Giourdina.
Les Turcs. Giourdina, Giourdina.
Le Muphti.
Mahameta, per Giourdina,
Mi pregar, sera e matina.
Voler far un paladina
De Giourdina, de Giourdina;
Dar turbanta e dar scarrina,
Con galera, e brigantina,
Per deffender Palestina,
Mahameta, per Giourdina,
Mi pregar sera e matina.
Star bon Turca Giourdina?
Les Turcs. Hi Valla. Hi Valla.
Le Muphti (chantant et dansant). Ha
la ba, ba la chou, ba la ba,
ba la da.
Les Turcs. Ha la ba, la la chou, ba
la ba, ba la da.
«Scène XIII.—
Le Muphti, Dervis,
Monsieur Jourdain, Turcs, chantans
et dansans.
Monsieur Jordain (après
qu'on lui a ôté l'Alcoran de dessus le dos). Ouf!
Le Muphti (à M.
Jourdain).
Ti non star furba?
Les Turcs.
No, no, no.
Le Muphti.
Non star forfanta?
Les Turcs.
No, no, no.
Le Muphti (aux turcs).
Donar turbanta.
Les Turcs.
Ti non star furba?
No, no, no.
Non star forfanta?
No, no, no.
Donar turbanta.
Les Turcs dansans mettent le turban
sur la tête de
M. Jourdain
au son des instruments.
Le Muphti (donnant le sabre
à
M. Jourdain).
Ti star
nobile, non star
fabbola,
Pigliar
schiabolla.
Les Turcs (mettant le sabre
à la main).
Ti star
nobile, non star
fabbola,
Pigliar
schiabolla.
[61]
Les Turcs dansans donnent en cadence
plusieurs coups de sabre à
M. Jourdain.
Le Muphti.
Dara, dara
Bastonnara.
Les Turcs.
Dara, dara
Bastonnara.
Les Turcs donnent à
M. Jourdain des coups de
bâton en cadence.
Le Muphti.
Non tener honta,
Questa star l'ultima affronta.
Les Turcs.
Non tener
honta,
Questa star l'ultima affronta.»
O uso frequente na lingua franca da palavra
sabir, principalmente
na expressão
mi no sabir
com que os levantinos e argelinos respondiam
ás perguntas que lhes faziam os estrangeiros e que elles
não comprehendiam,
fez dar a essa lingua o nome de
sabir,
lingua
sabir. Vid.
Littré,
Dictionnaire de la langue
française. Supplément, s. v.
Sabir.
A. Darmesteter,
De la création actuelle de
mots nouveaux dans la
langue française, p. 261, n. define
ainda: «Le
sabir ou langue
franque,
mélange d'italien, de français, de
provençal et d'arabe parlé par les
marins de la Méditerranée».
Algumas phrases ou expressões da lingua franca chegaram, sem
duvida por intermedio dos marinheiros, até ao
calão ou girias dos diversos
povos da Europa. No
cant
(calão de Inglaterra) ha por exemplo:
nantee dinarly (não
tenho) nenhum dinheiro, da lingua franca;
niente
dinaro, do italiano
niente, nada (==fr.
néant) e
denario (==port.
dinheiro,
hesp.
dinero, fr.
denier, do lat.
denarius). Em portuguez ha
nentes do
ital.
niente, que não
veiu ao que parece por intermedio da lingua franca.
Nicles, nada, da giria dos garotos
portuguezes parece estar por
niks e
corresponder ao
nix da lingua
franca. «The well-known
Nix
mangiare
stairs at Malta derive their name from the endless beggars who lie
there
and shout «Nix mangiare», i. é.
«nothing to eat»,—an expression which
exhibits remarkably the mongrel composition of the Lingua Franca,
mangiare being italian, and
Nix (germ.
Nichts), an evident importation
from Trieste, or other Austrian seaport.»
The Slang Dictionary,
apud Johan Storm,
Englische
Philologie I,
162-3.
Storm junta em nota a pag. 163: Li n'um romance maritimo inglez
a seguinte lamuria de um pedinte maltez:
«
Me molto miserabile,
signore!
Nix padre,
nix madre,
nix mangiare
per
sixteen days, per Gesù
Christo.»
Nix é
considerado geralmente na Italia pelo povo como a
negação
allemã ou estrangeira. Mas o emprego de uma
expressão como
nix ou de termos extranhos
não determina de modo algum o caracter
da lingua franca. O emprego de expressões como
sixteen days é
um accidente de momento que se encontra em todas as linguas: quando
[62]
a gente que as falla se acha em contacto com estranhos recorre
á sua
maior ou menor provisão de termos estrangeiros. A
composição da lingua
franca não é realmente mais
mongrel que por exemplo a do inglez,
que apresenta vocabulos provenientes de innumeras linguas.
V. CONSIDERAÇÕES GERAES
Não foram só as linguas romanicas que serviram de
base á formação
de dialectos como os que acâbamos de noticiar: podemos dar
indicação
de dialectos similhantes de origem germanica, a cujo estudo
procederemos
logo que tenhamos materiaes sufficientes.
O
negro-english, dialecto assim
chamado impropriamente, é fallado na
colonia hollandeza de Surinam, na Guiana, por uma
população de cêrca
de 100:000 individuos, dos quaes 90:000 negros e 10:000 de origem
européa. As fórmas grammaticaes estão
reduzidas n'este dialecto, como
em todos os similhantes a um minimo.
The Bible of Every Land, p. 213,
dá noticia de traducções dos
Psalmos e do Novo Testamento no
negro-english. Julgâmos
terem por
objecto este dialecto os livros seguintes que ainda não
lográmos ver:
Kurzgefasste neger-englische
Grammatik. Bautzen, 1854.
Van der Vegt,
Proeve eener handleiding om het
neger-engelsch.
O creolez (ingl.
creolese)
é um dialecto tendo por base o hollandez,
fallado pela população negra das ilhas de Santa
Cruz, S. Thomaz e
S. João (Indias Occidentaes); não tem
distincção de genero nem numero,
nem declaração de nomes, nem
conjugação simples de verbos.
Em 1781 o governo da Dinamarca fez imprimir em Copenhagen
uma traducção do Novo Testamento n'esse dialecto;
em 1818 fez-se
nova edição. Segundo
The Bible
of Every Land, pag. 212, parece que
o creolez caíu em desuso.
O inglez serviu de base na China á
formação dialectal chamada
Pidgin
English (
pidgin
é approximadamente a pronuncia chineza do inglez
biznes,
business). Não vimos
ainda a obra de Leland,
Pidgin English singsing,
or Songs and Stories in the China-English dialect.
London, 1866.
Na
Introduction to the Study of Sign Language among
the north american
Indians by Garrick Mallery (Smithsonian
Institution-Bureau of
Ethnology. Washington, 1880.) p. 12, achâmos a seguinte
noticia:
«Os kalapuyas do Oregão meridional usaram
até ha pouco uma linguagem
de signaes, mas gradualmente adoptaram para a
communicação
com o estrangeiro a lingua composta, commummente chamada giria
tsinuk ou giria
chinook, que provavelmente se
originou para fins commerciaes
nas margens do Columbia antes da chegada dos europeus,
fundada sobre o tsinuk, tsiholi, nutka, etc., mas agora enriquecido por
termos francezes e inglezes, e esqueceram quasi inteiramente os seus
antigos signaes. A prevalencia d'esta lingua mestiça,
formada nas mesmas
condições que produziram o
pigeon-english ou a
lingua franca do
oriente, explica a falta notada de lingua de signaes entre as tribus da
costa noroeste».
A giria tsinuk não é talvez, apesar do que nos
diz G. Mallery,
[63]
mais do que um dialecto inglez da natureza dos que são
objecto do presente
estudo.
Ninguem ainda, que saibâmos, viu com clareza o verdadeiro
caracter
e reconheceu as leis geraes que presidem á
formação de dialectos
de que nos occupâmos.
O eminente philologo P. Meyer tocou a nosso ver em um dos pontos
essenciaes da questão, mas por falta sem duvida de termos de
comparação
não a collocou á verdadeira luz:
«Estudar-se-hão com interesse,
diz elle, com relação ao dialecto da Trinidad, os
diversos tempos
compostos pelos quaes os negros remediaram as lacunas da
conjugação,
achar-se-ha materia para diversas comparações com
os factos
parallelos que apresenta á formação
das linguas romanicas. Nada deve
porém esquecer que a comparação tem
aqui a mais fraca base. Os negros,
quando aprenderam o francez, estavam habituados a uma lingua
absolutamente differente e nunca souberam mais que as
palavras e as
fórmas mais usuaes de seu novo idioma,
emquanto o latim vulgar de
que saíram por desenvolvimentos individuaes e locaes as
linguas romanicas,
foi sempre um idioma sufficientemente completo, cujas
transformações
foram assás lentas para que as lacunas tenham tido tempo de
se encher facilmente ao passo que se formaram».
Rev. critique, 1872
artigo 50. Na passagem seguinte, M. P. Meyer mostra ter repugnancia
em admittir que a formação de dois dialectos
creolos obedeça a leis
perfeitamente identicas: «Parece que o
patois da ilha de França
offerece,
na deformação do francez, analogias com o da
Trinidad que não
são explicadas sufficientemente pela communidade do ponto de
partida».
O dr. Bos (
Romania IX, 571) admitte
já a independencia d'essas
formações analogas, sem ver ainda aqui a
acção de leis geraes: «Os
diversos creolos (francezes) que se fallam nas Antilhas, na America,
nas ilhas Mascarenhas, no Oceano Indico, têem todos um ar de
familia,
uma similhança ainda mais accentuada que a que existe entre
as
linguas neo-latinas, e devida provavelmente á sua maior
mocidade e á
sua maior proximidade da lingua mãe. Alem d'isso essa lingua
mãe, o
francez, é unica para os idiomas creolos; e o latim vulgar,
quando deu
origem ás linguas neo-latinas, tinha talvez já
perdido a unidade, e
experimentado as influencias regionaes que deviam transformal-o, aqui
em francez, acolá em provençal, alem em italiano,
etc. Fóra pois da
questão de tempo, a grande similhança que existe
entre as linguagens
creolas provém provavelmente da unidade da lingua que lhe
deu origem:
o francez representa aqui o papel do latim vulgar com
relação
ás linguas romanicas».
As idéas geraes com relação
á formação d'estes dialectos expressas
por E. Tesa no seu citado estudo sobre o creolo de
Curaçáo não me
parecem tambem exprimir a verdade dos factos. «Due studj sono
a farsi
nella istoria delle lingue: la libertà e la
servitù. Una favella si disgiunge
da una grande famiglia, serbando parte del tesoro commune e nei valori
radicali che si incorporano in un grupo di suoni, e ne' canoni
derivativi,
e nelle flessioni. Questa ricchezza ereditata non giace inerte.
È
un grande albero: e dei molti rami, quale si leva più alto,
quale si arresta
a mezza la via; ma in ciascuno è una vita sua propria: vi
discorre
lo stesso succo a nutrirli, ma è vario lo spessore degli
strati e le
[64]
virtú: tutto è un agitarsi, un crescere;
finchè le due ultime foglie, che
si toccano in mezzo al sereno dei cieli, non rammentano più
che la
radice commune è nascosta in un luogo solo e circondata di
poca
terra.
«Beata la nazione alla quale, in codesta opera de' secoli, la
lingua
si disvolge senza ingiustamente comandare e senza miseramente servire;
perchè anche negli organismi vocali così corrompe
il vedersi
schiavo como il farsi tiranno.
«Bensì le lingue, presto o tardi, si incontrano,
si impinguano, si
tarpano l'una l'altra; o sia l'imitazione delle idee come nella prosa
de'
Cechi e de' Magiari, guidata in tanta parte dal tedesco: o da questa
lingua in quella si trasfonda la somma delle parole, como le sanscrite
nel tamulico; le turche nel greco, nell'armeno, nello schipetaro, nel
româno,
nel bulgaro, nel serbo. Talora poi le forme stesse o cedeno alle
alle straniere o le accettano cooperatrici a rappresentare il pensiero;
come nel persiano e più nel turco e, con istrazio peggiore,
nel huzuresco.
«Un esempio di queste corruzioni profonde lo veggiano a
Curassao;
e non osservato, ch'io sappia, dai linguisti. Non ho trovato che un
libro;
e bisognerebbe sapere se altri ve ne sieno e serbino tutti le forme
spagnuole,
o incomincine a corrompere anche la lingua degli Olandesi, padroni
nuovi. Poi sarebbe utile a conoscere
quale
dialetto vi parlassero gli aborigeni; quando sia scomparso
o se ancora se
ne conservino le
tracce; finalmente quanto sieno in quel picciolo popolo i discendenti
di
Spagna i quanto di Olanda...
«Certo da questo breve studio sul curassese saremo condotti a
ristringere
la opinione di Augusto Fuchs che lo spagnuolo, dominatore
in tanta parte di America, non si mescolò a nessuna delle
lingue indigene
da formare um nuovo dialetto (Cfr.
Die romanischen
Sprachen.
Halle, 1849, p. 7). Non s'è mescolato; ma
il pensiero nazionale trascinò
dietro a sè le fórme spgnuole e gli avanzi;
così che
ne derivò una favella che non assomiglia certo a nessuno dei
dialetti
metapireneici.
«A me pare che uscirebbe un bel libro, ma da non farsi in
Europa,
chi si ponesse a ricercare come le lingue latine rimutassero; il
francese
nel Canada, in Haiti; il portoghese nel Brasile e lungo le coste
d'India;
a Cuba, a Portorico e via via lo spagnuolo.
sarebbe
a discoprirsi la gramatica indigena;
e
dedurne le leggi dissolutive di quella parola,
là inerte o quasi, che fu
stromento a forti pensiere e alle grazie
dell'arte in bocca a Dante, a Cervantes, a Voltaire.»
Como se vê o douto professor de Pisa inclina-se a admittir
como
explicação dos dialectos creolos uma
accommodação das fórmas romanicas
á grammatica das linguas dos povos entre os quaes esses
dialectos
se formam.
Alguns eruditos brazileiros, conhecedores dos dialectos indigenas,
admittem influencia grammatieal d'estes dialectos sobre o portuguez
do seu paiz.
«A lingua fallada pelos primitivos incolas d'El-Dorado, a
lingua do
selvagem, que teve voga nos primeiros tempos do desenvolvimento do
Brazil, que durante dois seculos entre os proprios colonos europeus era
[65]
«a lingua geral» e de uso quotidiano no tracto
commum, usada e fallada
até no pulpito, ainda hoje fallada no Paraguay, teve tal
importancia
já, que, temendo-se que fosse esquecida a lingua portugueza,
mereceu
ser proscripta expressamente a ponto de a mandarem abolir pela
provisão de 12 de outubro de 1727 (
Jornal
do Timon, t. 2.º; p. 315).
E depois, apezar de tudo, ella perdura ainda, já
não digo pelo facto
de subsistir hoje entre varias e numerosas tribus do Amazonas e de
Matto Grosso, porém, perdura na lingua portugueza, fallada
pelos descendentes
dos Brazis, dando-lhe um feitio caracteristico que distingue
essencialmente essa falla brazileira da portugueza, não
só na inflexão
da voz, não só na phonetica, mas ainda no
tornêo grammatical e no
phraseado que tem
seu que de novo,
não usado na terra lusitana, e a
final em grande numero de vocabulos de todo não portuguezes.
A «lingua
geral» é certo, morreu com o indio e ou si
não morreu ainda, vae
morrer e desapparecerá com o derradeiro selvagem, que a
locomotiva
da civilização tem de aniquilar na sua marcha, no
seu «avança para
deante». Porèm, como em seguida á
derrubada, onde era a mata virgem,
surge a capoeira, do mesmo modo no campo de exterminio, do
qual se-eliminou o indio, subsistem o mameluco, o caboclo, o caipira,
o matuto; e essa pobre gente que constitue a nossa gente da
roça, os
nossos
officiaes de officio, a nossa
soldadesca e a nossa maruja, concorre
sem a menor duvida com a maior percentagem para formar o algarismo
da nossa população. Desappareceu o indio
(
abá), o indigena, o
autochtone
(
t-yby-abá==
typynabá),
o selvagem (
tapyyia),—mas ficou o
caboclo,
o perfilhado por branco
(
caraïb-oca==
caribóca),
o mameluco, o
filho da mulher india
(
membyrucá), o pelle
tostada (
caipíra), ou o
homem
corrido, envergonhado, abatido, submettido
(
kuaipira). E esses
mamelucos, caboclos e caipiras, fallando a lingua do
«outro», do extrangeiro,
do homem de lá longe, do emboaba,
(
amo-abá), fallando
essa lingua corrompida pelo fallar do africano, do selvagem negro
(
tapyyñuna),
conservam no sotaque, no phraseado, reminiscencias da «lingua
geral» que vão se-fazer ouvir ainda no seio do
parlamento, onde
desgraçadamente predomina um francez assaz eivado de
francezismos
e tambem já de não poucos inglezismos. Foi
proscripta a lingua do indio
(o
abá
ñeenga), mas na lingua do branco (no
caraï-ñeenga)
fallada
pelos matutos, e reproduzida ás vezes com bastante merito em
escriptos
litterarios, subsistem dizeres
sui
generis, oriundos da lingua materna,
certamente
materna pois que elles
são os mamelucos, os filhos da
mulher indigena, são os caboclos oriundos do homem branco.
Como
muito bem diz o sñr. dr. Couto de Magalhães, na
linguagem popular do
Brazil ha não só grande
quantidade de vocabulos tupis ou
guaranis, mas
ainda
phrases, figuras, idiotismos e
construcções peculiares. Quanto
ao
vocabulario é incontestavel, e com um pouco de
attenção vê-se, que no
portuguez brazilico abundam dicções de linguas
americanas em numero
mais consideravel talvez que o das dicções
arabicas que se-conservam
no lexicon portuguez. Dizemos «linguas americanas»,
porque na
realidade não ha só vocabulos do
abáñeenga, e
sim tambem do
chilidugu,
do
kechua callu, do
karai-arianga, e outras, como sejam
brisa,
canôa,
furacão,
piroga,
mate,
guasca,
guampa,
gaûcho, etc. Nas sciencias
naturaes (mórmente na botanica) e na geographia é
mais que
[66]
consideravel o numero de vocabulos oriundos de linguas
americanas
[7].»
«Nem o tupi oriental, aquelle que era fallado na costa quando
os
jesuitas o escreveram, e que faz objecto dos diccionarios e grammaticas
que nos legaram; nem a lingua Kirirí, um tupi que era
fallado pela
tribu d'esse nome, não são hoje linguas vivas.
Assim como os selvagens
ou desappareceram ou subsistem mestiçados, assim a lingua ou
desappareceu ou mestiçou-se no rustico fallar do nosso povo,
conseguindo
introduzir na lingua portugueza do Brazil centenares de raizes
[8].
«O cruzamento d'estas raças (indigenas do Brazil,
negros e brancos)
ao passo que misturou os sangues, cruzou tambem (se nos é
licito
servirmo-nos d'essa expressão) a lingua, sobretudo a
linguagem popular.
É assim que, na linguagem do povo das provincias do
Pará, Goyaz,
e especialmente de Matto-Grosso, há não
só quantidade de vocabulos
tupís e guaranís accommodados á lingua
portugueza e n'ella transformados,
como ha phrases, figuras, idiotismos, e
construcções peculiares
ao tupí. Este facto mostra que o cruzamento physico de duas
raças
deixa vestigios moraes, não menos importantes do que os do
sangue.
O notavel professor norte-americano C. F. Hartt nota que são
rarissimos
os verbos portuguezes que têem raizes tupís, e
cita como um d'esses
raros exemplos, talvez unico, o verbo
moquear. Se o illustre professor
houvesse viajado outras provincias, veria que esse exemplo
não
é isolado, e que não temos um, mas muitos verbos
vindos do tupí, e
alguns d'elles tão expressivos e energicos que
não encontrâmos equivalentes
em portuguez; citarei entre outros os seguintes:
espocar (Pará)
por: arrebentar abrindo;
petequear
(Minas, S. Paulo) por: jogar;
entocar
(geralmente em todo o Brazil) por metter-se em buraco, ou
figuradamente,
por: encolher-se, fugir á responsabilidade;
gapuiar (Pará,
Maranhão) por: apanhar peixe;
cutucar (geral) por: tocar com a
ponta;
espiar (geral) por: observar;
popocar (Pará,
Maranhão) por: abrir arrebentando;
pererecar (geral) por:
caír e revirar;
entejucar
por: embarrear;
encangar por: metter os bois no
jugo;
apinchar por:
lançar, arremessar;
capinar por: limpar o matto;
embiocar por: entrar no buraco;
bobuiar por: fluctuar;
catingar por: exhalar mau cheiro;
tocaiar por:
esperar, etc., são outros tantos verbos com que o
tupí enriqueceu a
lingua popular dos habitantes do interior do Brazil, lingua
ás vezes
rude, não o contestâmos, mas ás vezes
tambem de uma energia e elegancia
de que só póde fazer idéa, aquelle que
tem estado em uma roda
de gaúchos folgazãos a ouvil-os contar a historia
de seus amores, suas
façanhas de valentia, ou as lendas, ás vezes
tão tocantes e poeticas de
suas superstições, metade christãs,
metade indigenas
[9]...
«Se dos verbos passassemos aos substantivos, nomes de
animaes,
logares, plantas, ver-se-hía que nada menos de mil
vocabulos, quasi
[67]
uma lingua inteira, passou e veiu fundir-se na nossa, assim como com
o cruzamento tem passado e ha-de continuar a passar o sangue indigena
a assimilar-se e confundir-se com o nosso
[10].»
Como se vê os dois escriptores brazileiros, que
têem um longo conhecimento
do tupi-guarani, nenhum facto apresentam que prove a influencia
grammatical que admittem: as suas indicações
resumem-se a
factos lexiologicos, alguns dos quaes são muito
contestaveis.
Não entraremos n'um exame critico directo das diversas
opiniões
que acabâmos de citar. Os materiaes por nós
accumulados permittem-nos
assentar os seguintes principios, em face dos quaes é facil
julgar
essas opiniões.
1.º
Os dialectos romanicos e creolos,
indo-portuguez
e todas as formações
similhantes representam o primeiro ou primeiros estadios na
acquisição
de uma lingua estrangeira por um povo que falla ou fallou
outra.
Este principio é por assim dizer evidente. Basta observar
como os
estrangeiros que não têem estudos grammaticaes
começam a fallar a
lingua de um paiz que não é o seu para a ver
perfeitamente confirmada.
Mi no fallá portuguese
é uma phrase typica que todos conhecemos
na bôca dos inglezes.
Os factos observados nos dialectos creolos de Santo Antão,
Guiné,
etc., revelam
graus diversos na
acquisição do portuguez. A
lingua franca
póde ser considerada como o typo mais rudimentar das
formações de que
nos temos occupado. Aqui devemos observar um facto interessante:
consiste elle em que o povo de qualquer paiz achando-se em contacto
com estrangeiros que não fallam a sua lingua reduz esta
tambem, por
assim dizer instinctivamente, ao mesmo typo privado de
fórmas grammaticaes
que caracterisam os dialectos creolos
[11].
Nos contos populares, os mouros, os turcos e os negros são
apresentados
pelo povo a fallar uma lingua em que o infinito substitue as
outras fórmas verbaes; assim em G. Pitré,
Fiabe, novelle e racconti
popolari siciliani, I, 17, n.º 1, ha o seguinte
dialogo entre um turco e
S. Nicolau: «Bonciornu Santu
Nicola!»—«Addiu
Maumettu.»—«
Pigghiari
tanticchia
d'ogghiu?»—«
Pigghiari
quanto vôi.» Póde comparar-se
a versão portugueza d'essa facecia em a nossa
collecção de
Contos
populares portuguezes, n.º 72. O douto e indefesso
collector das tradições
sicilianas ministra-nos a seguinte nota: «Nel
Malmantile del Lippi
annotato dal Minucci, vol. III, pag. 257, a proposito della frase del
Lippi
star usanza si legge:
«
Star usanza. È
detto alla maniera degli
stranieri, specialmente tedeschi, o turchi, che cominciando a parlar un
poco Italiano, si servono quasi sempre dell'infinito in luogo di
qualsivoglia
tempo. È curiosa la perifrase d'uno schiavo turco, che
avendo
rubato un turibolo d'argento, volendolo vendere, andava dicendo negli
orecchi a coloro, ch'egli supponeva lo potessino comprare:
Voler comprar
un andare un venire un sentir buono?»
É com razão que M. E. Egger nas suas
Observations et
réflexions
[68]sur le
développement de l'intelligence et
du langage chez les enfants (Paris,
1879. 8.º) compara a linguagem das creanças aos
dialectos
creolos:
«A vingt-huit mois l'enfant connaît le sens des
trois mots:
ouvrir,
rideau
et
pas (négation);
déjà il les rapproche avec une certaine
dextérité,
en les acompagnant du geste et du monosyllabe
ça.
Pas
ouvrir ça
signifie «la fenêtre est
fermée»;
pas rideau
ça signifie «la
fenêtre n'a
pas de rideau». On reconnaît là ces
grossières façons de parler qu'on
décore
parfois du nom de patois nègre, parce que les
nègres de nos colonies
n'empruntent guère à la langue de leurs
maîtres qu'un petit nombre
de vocables, les plus nécessaires, et qu'ils les accouplent,
selon le
strict besoin, sans aucun souci de la conjugaison et même de
la syntaxe.»
Ob. cit., p. 44.
Os dialectos de que nos temos occupado não são
pois o resultado
de uma transformação lenta, gradual, tendo por
ponto de partida principal
a alteração phonetica, como a que se opera nas
linguas que seguem
o curso normal da sua evolução, como a que
transformou o latim
em portuguez, hespanhol, provençal, italiano e valachio; nos
dialectos
creolos e similhantes a alteração phonetica
é o menos; com ella pouco
se explica da estructura morphologica e syntactica d'essas
fórmas de
linguagem. Bopp e Diez são de muito pouca utilidade
immediata, os
principios da grammatica comparada usual de pouco nos servem para
entendermos aquelles dialectos.
A transformação da linguagem em virtude da
alteração phonetica
é um phenomeno de base physiologica; a
formação dos dialectos creolos
é no que tem de essencial um phenomeno psychologico.
Formam-se
elles rapidamente, para acudir á necessidade das
relações; é o povo inferior
pela raça, pelo estado de civilisação,
mas ao mesmo tempo mais
forte de instinctos, mais rico de espontaneidade, é esse que
os forma
com os materiaes da lingua do povo superior, que em regra
não desce
a aprender ou mesmo a dar attenção ás
expressões do barbaro, do selvagem.
Ao ouvido do povo inferior chegam primeiro como ondas sonoras
tumultuosas as palavras do povo superior, depois aquelle percebe
como que um rythmo, depois n'aquelle oceano de palavras descobre alguns
pontos firmes, salientes; fixa-se n'elles: são as
fórmas mais geraes
e frequentes da linguagem; ellas bastam—a lingua nova, o instrumento
indispensavel para o trato está forjado; enriquecel-o,
approximando-o
do typo perfeito, é obra do tempo, se o houver, se as
condições
o permittirem; mas a riqueza não será muitas
vezes mais do que anomalia,
porque aquella fórma primeira de linguagem, nascida de um
trabalho
todo espontaneo, era perfeitamente coherente. Por fim dá-se
muitas
vezes um phenomeno curioso: entendido do povo superior, do povo
que em geral manda, o povo inferior não quer saber mais nada
da lingua
d'elle, contentando-se com o dialecto que formou: então o
povo
superior ver-se-ha obrigado a fallar a sua propria lingua alterada
[12].
É innegavel que a primeira reducção
morphologica (podemos assim
definir o processo de formação dos nossos
dialectos) que uma lingua
experimenta na bôca de um povo que tinha já outra
deixa vestigios
profundos, ainda quando o povo acaba por esquecer completamente a
[69]sua lingua propria
e por conhecer de um modo mais completo a
morphologia
da lingua que adopta de um outro povo. Os processos periphrasticos
da primeira phase da acquisição da lingua
estranha não desapparecerão
de todo, e mais tarde, quando a alteração
phonetica, que
elles favorecem, obscurecer certas fórmas grammaticaes,
esses processos
voltarão a ser normaes na lingua. Não
será a causa d'esta natureza
que serão devidos os futuros periphrasticos, por exemplo,
nas linguas
romanicas? Até hoje não se determinou com
precisão o grau e caracter
da influencia exercida por um povo sobre a lingua estranha que
a conquista ou outras causas lhe faz adoptar. O erro capital n'esta
questão consiste, a nosso ver, em se suppor que a lingua
estranha é
alterada pelo typo da lingua propria. O estudos dos dialectos creolos
permitte-nos resolver esta questão.
2.º
Os dialectos romanico-creolos, indo-portuguez e
todas as formações
similhantes devem a origem á acção de
leis psychologicas ou physiologicas
por toda a parte as mesmas e não á influencia das
linguas anteriores
dos povos em que se acham esses dialectos.
Os factos accumulados por nós mostram á evidencia
que os caracteres
essenciaes d'esses dialectos são por toda a parte os mesmos,
apesar das
differenças de raça, de clima, das distancias
geographicas e ainda dos tempos.
É em vão que se buscará, por exemplo,
no indo-portuguez uma
influencia qualquer do tamul ou do singalez. No dialecto macaista a
formação
do plural por duplicação do singular
póde attribuir-se a uma influencia
chineza, mas esse processo é tão rudimentar que
nenhuma conclusão
podemos fundar sobre elle. No dialecto da ilha de Sant'Iago
muito
muito é um superlativo.
Os phenomenos phoneticos que nos offerecem os dialectos creolos
nada têem de especial: a suppressão do
r final, a tendencia para o
iotacismo,
por exemplo, apparecem-nos quasi por toda a parte; as proprias
excepções são as mesmas: assim temos
ser e não
sê em Ceylão,
em Macau,
no archipelago de Cabo Verde. Nenhum som das linguas indigenas
foi transportado para os dialectos creolos; mas alguns sons das linguas
europeas foram modificados. Ora na propria Europa se notam
modificações similhantes. A seguinte
observação do dr. Bos sobre o
creolo da ilha Mauricio é, emquanto aos sons, quasi
inteiramente applicavel
a todos os dialectos similhantes: «É
provavel que os sons do
francez que o negro não pôde reproduzir faltavam
na sua lingua. A
influencia das linguas negras reduziu-se a isso; ellas
não.... implantaram
nenhum som novo; ellas supprimiram os que ellas ignoravam
[13],
para os substituir por outros mais ou menos analogos:
e mudo por
i,
ui por
i ,
j por
z,
ch por
ç, etc.»
No fallar brazileiro, por exemplo, não parece haver nenhum
dos
sons particulares do tupi-guarani.
A acção das leis psychologicas geraes vae quasi
sempre nos dialectos
de que nos occupâmos até ás
feições miudas; assim não
só a periphrase
com as fórmas mais geraes nos apparece para substituir as
fórmas não adquiridas, mas ainda a mesma
preferencia por certas fórmas
auxiliares se nota quasi por toda a parte; assim o presente formado
[70]
com
ta
(==
estar) em Macau, nas ilhas de
Cabo Verde, em Curaçáo;
em Ceylão como em Curaçáo
lo é o elemento formativo
do futuro. Na
Luisiania
té==
était
serve para formar o imperfeito.
A preferencia dada n'esses dialectos aos pronomes regimens, que
vêem occupar o logar dos pronomes sujeitos encontra-se entre
nós no
fallar das creanças e tem grande extensão nas
phrases populares das
nossas linguas europêas
[14].
A propria selecção lexiologica, isto
é, a preferencia dada a certos
termos, manifesta a acção das mesmas leis geraes,
das mesmas tendencias
nas formações que estudâmos, apesar das
differenças de raças
e de meios; assim para significar fallar ou dizer encontrâmos
em Ceylão,
Curaçáo, archipelago de Cabo Verde, etc., a
palavra
papiá, o que
é tanto mais interessante quanto esse termo não
parece existir hoje nem
em hespanhol nem em portuguez. O substantivo
misté
(
mister) em Ceylão,
em Macau, em Curaçáo, no archipelago de Cabo
Verde, tem o valor de
um verbo significando ser preciso, ter necessidade de, dever.
Pamóde
e
promodi(==por amor de) tomam em
Macau, como em Santo Antão, o
logar da conjuncção porque, de um modo
independente; em quanto o
passóba
(==
por es'obra) de
Curaçáo nos lembra o
quamobrem latino.
Assilai por
tal em Ceylão e Macau
deve ter-se produzido tambem independentemente
n'um e n'outro dialecto; a palavra é composta de
assi
(d'este modo) e
lai por
laia, que em portuguez significa
especie, sorte,
estofo. sentido desenvolvido do de
lã.
A extensão já tão consideravel d'este
artigo não nos permitte desenvolvermos
mais completamente estas idéas, julgâmos
porém ter ministrado
sufficientes provas de que os dialectos creolos e
formações similhantes
não revelam influencia alguma directa, salvo no vocabulario,
das linguas anteriores dos povos que os fallam, mas que se deve ver
n'elles apenas o resultado da acção de leis
geraes a que obedece por
toda a parte o espirito humano.
O nosso
Estudo sobre a grammatica e o vocabulario do
indo-portuguez
completará as nossas observações na
parte comparativa
[15].
Notas:
[1]
Logo qui por
quê l'or
qui. Hoje é muito usado na cidade da
Praia.
[2]
O desapparecimento da syllaba inicial de
minha explica-se pelo facto d'esta
palavra se tornar proclitica? G. Vicente tem
enha.
[3]
As
particularidades historicas que seguem são
extrahidas da obra Ceylon, an account of the Island, etc. by sir James
Emerson Tennent. London, 1860, 2 volumes, 8.º
[4]
Istes Escrituras de Novo Testamento, (que nossa Senhor
Jesus Christo ja
papia,)
particularmente te da sabe,
istes Mandamentos, que quer dizia.
[5]
Apud Carl Engel,
An Introduction to the Study of National
Music. London,
1866. 8.º, p. 351.
[6]
Catin en patois normand est une poupée.
[7]
Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de
Janeiro. 1878-1879. Vol. IV.
Manuscripto
guarani da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro,
etc.,
publicado com a
traducção portugueza, notas, e um
esboço grammatical do
abáñee pelo dr. Baptista
Caetano d'Almeida Nogueira, p. XI-XII.
[8]
O Selvagem, I. Curso da
lingua geral segundo Ollendorf. II. Origens, costumes,
região selvagem, por Couto de Magalhães. Rio de
Janeiro, 1876, 8.º, p. 40.
[9]
Ob. cit., p. 77.
[10]
O Selvagem, I. Curso da
lingua geral segundo Ollendorf, etc., p. 77.
[11]
«Dès 1633, le père Lejeune
se plaignait qu'on employât entre Français et
Indiens un jargon qui n'était, à proprement
parler, ni le français ni l'indien, et cependant,
ajoutait-il avec surprise, les Français, à
l'user, se flattent de parler indien,
et les Indiens pensent s'exprimer en bon
français.» Maspèro
Rev. ling. IX, 405.
[12]
Vid. acima as interessantes
observações de Bocandé.
[13]
Seria preferivel dizer: parte dos que ellas ignoravam.
[14]
Vid. J. Storm,
Englische
Philologie, I, 207 ss.
[15]
N'esse estudo tentaremos tanto quanto nos é
possivel fazer com os materiaes
que temos á nossa disposição, indicar
as particularidades phoneticas do indo-portuguez,
escondidas em grande parte sob a orthographia adoptada pelos
missionarios
inglezes, e que julgâmos não dever modificar no
specimen que démos, reproduzido
do folheto que contém
Orações,
Dez Mandamentos,
O
sermão riba do montanha
(sem data nem logar de impressão).
Lista de erros corrigidos
Aqui
encontram-se
listados todos os erros encontrados e corrigidos:
|
Original |
|
Correcção |
#pág.
4 |
Anãto |
... |
Antão |
#pág.
13 |
Estes cavallos
são teus. |
... |
Esta egua
é tua. |
#pág
30 |
three
voyage |
... |
three
voyages |
As
variações de dialecto
(por vezes escrito dialeto) foram mantidas de acordo com o
original.
As variações de nomes
próprios foram mantidas de acordo com o original (ex:
Newtead e Newstead)